quinta-feira, 18 de julho de 2019


PARTE 3 A

 Episódio III - A Luz de Áxis (20 capítulos) (2013)

     A raça humana atingiu o seu apogeu como civilização, mas até isso acontecer foram necessários extremos sacrifícios e um deles foi abandonar o mundo em que vivia: O Planeta Terra.
Também embarcou nessa viagem, todo o conhecimento cultural, científico e genético disponíveis. Em uma pequena galáxia distante milhões de anos luz, um novo lar se apresenta como uma segura esperança de futuro. Não demorou muito para que os humanos descobrissem que nessa remota região do universo, eles não estavam sozinhos. Com o tempo, uma vez estabelecida em vários mundos, a supremacia dos humarantes, como é conhecida a antiga raça humana, é reconhecida pelos habitantes dos sistemas planetários e galáxias vizinhas. Um pacto diplomático, com objetivo de facilitar acordos comerciais e conhecimentos tecnológicos, foi firmado como muitos governos e posteriormente, serviu de base para a criação de uma federação. Os principais objetivos era manter a ordem e defesa, apaziguar conflitos, conservar e auxiliar mundos e seres em desenvolvimento, respeitando o curso natural de suas evoluções. Mas uma antiga ameaça volta a atormentar os humarantes. Dessa vez mais forte, numerosa e com a participação de seres com estratégias e habilidades jamais imaginadas por eles. A intenção do inimigo era matar, escravizar e punir os humarantes, simplesmente para atrair a atenção dos deuses cocriadores e seus aliados. Era preciso lutar e superar as limitações, confiar na tecnologia e no próprio instinto de sobrevivência, numa batalha que seria a última de sua história.


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Boa leitura



Episódio III
A LUZ DE ÁXIS

Capítulo 1

PLANEDO URBO
(Planeta Cidade)

     Um homem corre exausto em campo aberto. Ele tenta alcançar e encontrar proteção dentro de um bosque. A luz do dia começa a esmaecer e mais uma vez uma perseguição se inicia. Ofegante e pensando em conseguir uma vantagem, ele enfrenta os obstáculos do caminho em saltos largos entre as árvores e arbustos. Os galhos espinhosos riscam a sua roupa, mas não o machuca, ela é feita de uma malha de aço, tecida com pequeninos aros que dificultam a penetração de objetos pontiagudos. Em cima dela, uma armadura feita sob medida, para que os movimentos do guerreiro não ficassem limitados. No topo da cabeça usa um elmo, capacete fabricado com finas placas de resistente metal e que serve para amortecer o peso dos golpes deferidos pelo oponente. Nas mãos, um tipo de luva também de metal conhecida como manopla, montada mediante encaixe de rebites que facilita o manuseio da sua espada.
     O cavaleiro decide parar e respirar. Põem as mãos entre os joelhos e abaixa o dorso, levanta a cabeça aos suores e não mais escuta o som dos cavalos e os gritos dos seus perseguidores. Mais ainda não terminou, precisava achar uma saída e completar a sua tarefa. Ele continua devagar e encontra o que procurava: uma pedra grande no meio de uma clareira, que está 50 metros abaixo de um barranco.
- La ŝtono! (A pedra!)
     Sem perder tempo, ele desce as pressas se equilibrando com dificuldade, e por uma distração tropeça e escorrega até o fim.
- Damnet! (Maldição!)
     Levanta-se com dificuldade e caminha em direção ao centro da clareira. Escuta vozes dos outros cavaleiros que já o encontraram, não há mais o que correr, precisa chegar até a pedra. Ao dar os primeiros passos, uma flecha fixa no solo próximo aos seus pés. Ele insiste em caminhar e outra flecha é arremessada como sinal de aviso. Ao olhar para cima, ver outro cavaleiro de roupas negras com uma arma do tipo besta. Ao virar-se, ele se depara com mais cinco cavaleiros de espada em punho prontos para atacar. Não poderá chegar à pedra sem antes enfrentar seus oponentes.
     Ele retira a espada e demonstra disposição para lutar, iniciando uma seqüência de golpes de ataque e defesa. A cada adversário que ele consegue ferir mortalmente é evaporado como um encanto. Uma luta injusta, desleal, mas mesmo assim ele consegue sair vitorioso, pelo menos, parcialmente. O cavaleiro negro já está em seu encalço, e uma nova luta se inicia. A habilidade do cavaleiro negro é superior, seus movimentos e reflexos são perfeitos, parecendo prever os movimentos do outro cavaleiro que cai pela segunda vez, tendo a ponta da espada apontada para a sua garganta.
- Laca? (Cansado?)
- Mi estas neniam laca! (Eu nunca estou cansado!)
- Ne povis ludi! (Não pode jogar!)
- Mi ter volas ludi! (Eu quero muito jogar)
     O cavaleiro negro não atende ao pedido do seu oponente e lhe desfere o golpe fatal.
- Adiaŭ (Adeus!)
     Ao abrir os olhos, ele retira um dispositivo brilhante da sua têmpora esquerda. Está deitado no chão em um lugar escuro. Um foco de luz sobre o seu corpo lhe chama atenção.
- Não foi dessa vez, Dareh! – diz um amigo gozador, indo embora com outros companheiros.
     As luzes acedem. Os sete homens encontram-se num salão de piso e paredes azuladas e levemente brilhantes. Algumas janelas largas nas paredes se abrem como uma íris de um olho e um vento suave da noite adentra no recinto.
- Levante-se! Você foi bem dessa vez! Está melhorando a sua habilidade com a espada!
- Não tenho muita certeza, seu cavaleiro negro mais uma vez me derrotou.
     Outro amigo se aproxima:
- Não sei por que instrutor, ele insisti nessas lutas virtuais!
- Eu venci os cinco, acha pouco? – Estira o braço para receber ajuda do amigo para se levantar - Obrigado Yusuke.
- Essa aula deu fome, que tal comermos algo? Tenho uma receita nova, você vai gostar.
- Tenho certeza que sim, mas vou deitar cedo. Amanhã tenho novatos no curso de pilotagem.
     O instrutor de história antiga e medieval da cultura Tero Unua, Argos Aury, humarante sapiens de 45 anos, explica para Dareh quais foram as falhas no combate e como pode melhorar seu desempenho. Elogia mais uma vez a sua força na luta e completa:
- Tenho certeza Dareh, que se fosse uma luta real pela vida, o cavaleiro negro não teria vencido. Esses treinamentos virtuais estão sendo sempre aperfeiçoados, mas há um componente que não pode ser reproduzido: a autopreservação.
- Mestre Argos aceita o meu convite? – disse Yusuke.
- Sim doutor! Não perderia por nada.
     O Planeta Cidade é o centro comercial, industrial e cultural da Federação Áxis. É um dos maiores planetas da galáxia, tanto em diâmetro quanto em massa. É cem vezes maior que o Planeta Terra, com atmosfera habitável e cercada por duas luas orbitais. Nunca foi habitado por seres conscientes, possui rotação de 18 horas dia e noite, com variações de translações sazonais a cada três anos de seu principal sol e, com picos de inverno extremos em muitas regiões. O planeta possui vasta área de terra firme, sendo 40% montanhosa e com pouca biodiversidade nativa. A maioria dos animais e plantas foi introduzida ou modificada geneticamente. São espécies trazidas da antiga Tero Unua (Terra Primeira). Os oceanos são agitados e profundos, com raras atividades vulcânicas e sísmicas. Os rios são extensos e abundantes e se precipitam em altas cachoeiras. Neste cenário, foi fixada com êxito, a primeira civilização humarante. Uma cultura com avançada tecnologia e padrões positivos de qualidade de vida. Extremamente sustentável, possui índices muito baixos de poluição.    
     Dareh Borisav é um humarante sapiens, 35 anos, piloto de nave comercial cargueiro nível três, transporte de minérios, é engenheiro espacial e instrutor de pilotagem dessa categoria e de caças. Nas horas vagas estuda história de Tero Unua (Terra Primeira), cultura humana ancestral e base da civilização humarante. Ele tem preferências por esportes interativos e virtuais, principalmente os jogos de armas antigas.
     Yusuke Jun, humarante sapiens, 36 anos, médico. Passou 13 anos como membro de pesquisa bio-espacial e toxicologia alienígena. Atendeu o convite do amigo de infância Dareh e está há dois anos exercendo funções em naves comerciais cargueiras. Nas horas vagas participa de cursos virtuais de manipulação de alimentos.
     No Continente Norte do Planeta Cidade, na região montanhosa de Sudaj Ventoj (Ventos Súbitos) e construída em um dos seus platôs, está sediada a Ambasado Unuiĝinta (Embaixada Unida). Um complexo de edifícios que congrega os representantes das civilizações da galáxia e suas diversas raças e culturas humarantes (A humana: Homo sapiens, e outra aumarante: Homo aumarantes), distribuídas em diversos planetas e jurisdições da Federacio Axis (Federação Áxis).
      Próximo ao Planeta Cidade, no mesmo sistema solar, encontra-se o Planedo Kolonjo (Planeta Colônia). A sua sede é Urbo Kristalo (Cidade de Cristal), a única existente no planeta. A sua sociedade é formada por poucas famílias de castas e ordens religiosas conhecidas como Majstro de Lumo (Mestres da Luz). A pequena população se divide em especialidades diversas que garantem a manutenção e o funcionamento primário da cidade. Seu projeto urbanístico é distribuído por diversas praças, onde o visitante se encanta com os jardins, pomares e fontes de água, inspirados pela beleza das cores e luminosidade dos seus templos e prédios públicos construídos de puro cristal.
     Apesar da atmosfera equilibrada, com o clima ameno e constante do menor planeta dessa galáxia, fora dos limites da cidade não existe vida. Um grande deserto de fina areia branca destaca o planeta no espaço. Além de ser considerado sagrado, é uma relíquia histórica das primeiras colonizações humarantes. O acesso à cidade é restrito, assim como algumas de suas instalações. Não existem plataformas ou espaço-porto para desembarques. Quando autorizado, tudo que chega ou sai da cidade é tele transportado. O domínio dessa e outras tecnologias avançadas, inclusive de ataque e defesa, tornam o Planeta Colônia o mais protegido da federação.
     No Planeta Cidade ou Urbo, o piloto Dareh já havia chegado à plataforma de instrução e treinamento. Era a última fase de testes para a admissão de uma nova turma de pilotos de caças e posteriormente ingresso para co-piloto em naves cargueiras. Duas fileiras de naves estavam em formação com os motores ativados e em suspensão no ar, aguardando o sinal de Dareh para prosseguir.
     Após a confirmação, as naves sobem aos céus e fazem manobras evasivas e movimentos rápidos próximo ao solo, atirando em alvos fixos e móveis. Todos os pilotos têm excelentes desempenhos, no entanto um se destaca completando níveis difíceis em menor tempo. Dareh acompanha na tela holográfica os dados desse piloto, não acreditando que ele tivesse sucesso neste último teste decisivo:
- Ele pilota como um veterano não é senhor?
- Tenho acompanhado os testes do piloto Aturo e sinceramente estou surpreso com ele! – elogia Dareh.
- É verdade senhor, ele voa como um verdadeiro líder de esquadra! Um grande piloto!
- Sem dúvida! – responde Dareh, quando reconhece que a voz dos comentários ao seu lado é do próprio piloto Aturo.
- Aturo! O que faz aqui? Está bastante atrasado, faz alguns dias que tento entrar em contato com você. Onde estava?
- Elogiando o meu trabalho senhor? Fiz uma rápida visita ao meu pai que estava em trânsito, próximo a Urbo. Lamento não informá-lo com antecedência.
- Tudo bem! Falaremos disso depois. Mas quem está pilotando aquela nave?
- Não sei senhor. Estava pronto para entrar quando fui avisado que o senhor gostaria de falar comigo antes. Estou tão surpreso e curioso para também saber quem pegou a minha nave. Mas seja lá quem for, é muito bom.
     Dareh aguarda a conclusão dos testes e segue direto para a plataforma. Queria saber quem estava pilotando:
- Aturo. Vamos agendar outro dia para o seu teste.
- Como queira senhor. Posso lhe acompanhar até a plataforma? Desconfio que esse piloto não seja da nossa turma.
- Eu tenho certeza que não. Nada foi comunicado, vamos!
     O caça com o piloto desconhecido foi o último a pousar. Ao descer da cabine e ainda com o capacete, foi aplaudido pelos outros pilotos e caminhou em direção ao instrutor Dareh. O piloto retira o capacete e sorrir:
- Mei?
- Olá Dareh.
- O que faz aqui?
- Assombrando esses meninos.
- Mei. Você atrapalhou um teste final de um piloto! O que faz aqui?
- Precisava testar se ainda lembro tudo que você me ensinou.
- Ninguém me avisou que você faria um teste hoje, quem autorizou?
- Foi...
     Antes que Mei pudesse dizer algo:
- Eu autorizei Dareh! Espero que não tenha lhe causado grandes transtornos.
- General?
- Como vai Dareh. Ela é fantástica não é?
     Mei corre, abraça e beija a face do General Anor Meadhas:
- Obrigado pai, prometo que não vou mais incomodar! - Sorrir
- Você não incomoda meu anjo. Onde está Solaris?
- Ni estas em urbo (Nós estamos na cidade)
     O piloto Aturo Levigo, humarante da raça aumarante, de 23 anos, é um jovem oficial que está sendo convocado para conduzir cargueiros comerciais, mas tem um sonho: fazer parte da frente de defesa militar da Federação Áxis. Além de nas horas vagas ser um excelente cultivador de orquídeas, é filho único da Embaixadora Suna Levigo, 45 anos, humarante aumarante e representante do Planedo Gardeno (Planeta Jardim) conhecido pelas belezas naturais e cultivo de diversas espécies de flores.  Nesse planeta existem também dezenas de jardins botânicos e gigantescos campos cultiváveis, fornecendo alimentos para vários mundos da federação. Não é do agrado de sua mãe, que Aturo participe de atividades militares, apesar da federação nunca ter registrado conflitos na Galáxia de Áxis, habitada exclusivamente por humarantes. Desde as primeiras colonizações, nunca foi encontrado vida inteligente nesse ponto do universo, apesar de existir centenas de planetas de condições habitáveis. Na maioria das vezes, quando solicitado, a federação participa de missões de paz e ajuda nos mundos não aliados de galáxias próximas e que possuem relações amigáveis, mas nunca interferindo diretamente com ações militares e sim, diplomáticas.
- É um prazer revê-lo general – disse Dareh.
- Na verdade, estou aqui para falar com você. Podemos nos encontrar num jantar mais tarde na embaixada?
- Achei a idéia excelente pai – comenta Mei.
- Na embaixada? Sim, claro general. Estarei lá.
     Dareh sufoca a curiosidade de perguntar ao general do que se tratava esta conversa, mas sabia que seria algo importante.
- Com licença! – aproxima-se Aturo – Gostaria de pessoalmente parabenizar a piloto, acho que de agora em diante aquela nave não vai querer voar mais comigo.
- Meu nome é Mei. Aceito sem modesta seu elogio – ela olha de lado sorrindo e provocando Dareh, e este olha para o céu encenando buscar paciência.
- Sou Aturo Levigo.
     O general fica surpreso:
- Olha só! Hoje é o meu dia sorte! Você é filho da embaixadora?
- Sim general, é uma honra conhecê-lo também.
- A honra é minha meu jovem. Da última vez que lhe vi era uma adorável criança. Sou amigo e admirador dos seus pais, principalmente do trabalho de sua mãe na embaixada.
- Conhece meus pais?
- Sim. Seu pai foi indicado para coordenar o envio de suprimentos de alimentos para as bases militares na galáxia. E revelou seu interesse em trabalhar conosco.
- Ficaria muito orgulhoso general!
- Então aceita?
     Aturo olha nervoso para todos e quase sem acreditar que o próprio General Anor Meadhas lhe faz esse convite.
- Sim senhor! Aceito sim!
- Muito bem, seja bem-vindo a Força Militar da Federação Áxis. Mas antes comunique a embaixadora à boa notícia e diga que foi um pedido que não poderia negar ao seu pai. Se apresente em cinco dias, acho que será tempo suficiente para você se organizar. Você participará das escoltas dos cargueiros.
- Mas do que suficiente general! Permissão para me retirar!
- Permissão concedida.
     Aturo sai às pressas sem se despedir dos demais. Dareh elogia.
- É um bom piloto general.
- Sei disso, ele sobreviveu ao seu exigente instrutor.
     Mei faz um comentário:
- Não alimente muito o ego dele pai. São poucos os que conseguem chegar até aqui.
- Apenas quero lhes dar o melhor de si. Apesar de não participarmos de conflitos, não podemos perder o instinto de sobrevivência, saber defender é tão importante como atacar – Dareh se lembra das instruções de Argos Aury.
- Muito bem! É assim que se fala. Preciso ir, nos veremos no jantar.
- Até mais general.
     Eles se afastam e Mei se vira dando um adeus balançando os dedos.
      Durante todo o dia, Dareh só pensava no jantar e estava surpreso com a presença do General Meadhas e sua filha. Fazia alguns anos que ele havia treinado Mei com instruções de pilotagem. Ela sempre revelou com grandes habilidades em tudo o que era ensinado.
     Mei Meadhas, 21 anos, humarante sapiens, filha do General Anor Meadhas, 59 anos, comandante supremo da força militar da Federação Áxis e sua esposa, Solaris Meadhas, humarante sapiens, 48 anos, membro do conselho religioso de Urbo Kristalo (Cidade de Cristal). Mei uma das raras crianças que cresceram no Planedo Kolonjo (Planeta Colônia). Viveu cercada de extremos cuidados e disciplina, recebendo de muitos mestres vastos conhecimentos da cultura humarante, mais do que uma jovem da sua idade poderia ter acesso. Apesar da rígida educação, Mei nunca reclamou ou teve dificuldades em seus aprendizados, sua inteligência, curiosidade de aprender e percepção causavam espanto. Sempre muito alegre e simpática, cativava todos com que convivia. Além de um sorriso iluminado e uma beleza física divina, Mei algumas vezes possui um temperamento impulsivo e bastante determinado em suas decisões. Nenhuma das atividades na Galáxia de Áxis desperta seu interesse, principalmente no que se refere ao religioso, comum em Urbo Kristalo (Cidade de Cristal), que tanto admira e emociona. Os sentimentos que agitam a alma de Mei orientam para explorações no espaço e das distantes fronteiras e regiões do universo. Como sabe da impossibilidade de realizar seus sonhos, Mei se conformaria em viver e trabalhar no Stacio Limo (Estação Fronteira), que são bases de observação e monitoramento do universo, espalhados nos limites da galáxia. Dessa forma, Mei poderia está mais próxima dos seus interesses.
     O General Meadhas já percebeu as aspirações de Mei, ele conhece bem o poder de convencimento da filha que tanto ama. Dizer não ou manobrar situações para evitar ou ganhar tempo para que ela mude de idéia, além de ser injusto em limitar suas potencialidades, causaria uma pequena dose de infelicidade que seu pai dificilmente suportaria em pensar. Por outro lado, Mei entende, em parte, as razões de proteção exagerada do seu pai, ao contrário de sua mãe que tem muita fé nas razões que regem os nossos destinos.
     Horas depois, a nave de Dareh sobrevoa Sudaj Ventoj (Ventos Súbitos), a visibilidade nessa época do ano é pouca, com muitas nuvens carregadas de chuvas. O seu monitor recebe sinais de boas vindas do hangar interno, que fica na base de uma montanha da Embaixada Unida, autorizando aterrissagem.
     Para a sua surpresa, Mei estava a sua espera.
- Saluton! (Olá!)
- Saluton! – responde Dareh
- Dum la tuta nokto estis aýdataj la tondroj. (Durante toda noite eram ouvidos os trovões).
- Neniam pluvis tiel forte, kiel hodiaý. (Nunca choveu tão forte como hoje.)
     Após uma curta caminhada, Dareh e Mei entram num elevador que os conduzirá vários andares a cima até um salão, de ambiente agradável e quente, onde uma mesa encontra-se servido o jantar. Uma grande janela no fim de um corredor revela os primeiros raios e trovões da noite. O General Meadhas e sua esposa Solaris se aproximam com calorosa recepção e sem formalidades.
- Seja bem-vindo Dareh.
- Obrigado General. Senhora Solaris.
- Dareh, que bom revê-lo.
- Também estou feliz em vê-la senhora.
- Kiel vi fartas?  (Como você está passando?)
- Bone! Dankon! (Bem! Obrigado!)
     Dareh é convidado para sentar à mesa e todos se servem, relembrando a época em que Mei, ainda adolescente, aprendia a pilotar com seu instrutor. Após o jantar, o general convidou todos para uma sala em anexo onde explicaria o motivo da visita de Dareh.
- Gostaria de lhe fazer uma proposta para que você acompahasse Mei por um tempo na Estação Fonteira Sul – adianta o general, sem rodeios.
- Stacio Limo? (Estação de fronteira?)
- Sim! É um pouco solitário, reconheço. No entanto, dois dos três membros da estação completaram seu período de permanência. Um cientista de comunicação preferiu ficar, alegando ter identificado sinais incomuns naquele ponto da galáxia.
- Que sinais general?
- Aparentemente nada que mereça atenção militar, provavelmente emissões de ondas estelares da nebulosa. Mas o jovem Dr. Lunn Aodh é muito dedicado ao seu trabalho e arranja qualquer motivo para também não tirar férias. Ele não deixaria nenhum detalhe, mesmo que simples, passar despercebido.
- Já ouvi falar no Dr. Lunn. Ele fez um curso básico de pilotagem em Urbo com outro instrutor, na época eu estava exclusivamente com Mei. Ele teve um bom rendimento, inclusive sugeriu melhorias para bloquear e interferir em comunicações de naves inimigas.
- Exatamente! A engenharia militar acatou suas sugestões e implantou em nossas naves. Fizemos vários convites para ele trabalhar conosco, mas não tivemos sucesso.
- Ele é um cientista pai. Tenho certeza que é feliz onde está – comenta Mei.
- Certamente! Imagino se eu seria feliz ficando confinado por meses numa estação sob um asteróide – fala o general com humor, arrancando sorrisos de todos.
     Solaris, a esposa do general também concorda:
- Não consigo imaginar meu querido. Você carrega uma nobre e honrada tradição nos homens da família.
     Mei aproveita a oportunidade:    
- Eu tenho certeza que ficarei muito feliz trabalhando lá. Infelizmente, não me interessei em seguir a tradição da família. Desculpa pai.
- Minha filha, as escolhas são suas, não nossa. Mantive a tradição por gostar do que faço.
- Se entendi bem, Mei quer trabalhar na Stacio Limo?pergunta Dareh.
     Mei se levanta animada e fica perto de Dareh.
- Sim, gostaria muito. E achei que você poderia sair um pouco da sua rotina de instrutor.
- Gosto da minha rotina Mei – sorrir Dareh, disfarçando não gostar muito da idéia.
     Solaris percebe:
- Na verdade Dareh, Mei nesses últimos anos teve muitas experiências em vários trabalhos e gostou de todos eles, porém não se apegando a nenhuma, inclusive até acompanhou o pai em manobras militares. Mas ela sempre teve curiosidade em trabalhar nos limites da galáxia. Não fico surpresa pelo seu interesse nesse trabalho na Stacio Limo.
- Ficaremos apenas nós três?
- Não Dareh. Deixaremos um pequeno efetivo militar e um corpo médico a disposição, uma nave ficará próxima seguindo o protocolo de segurança.
- Esqueci de perguntar, quanto tempo ficaremos?
- Bom. Você não respondeu se aceita a proposta.
- Qual seria mesmo a proposta, senhor?
- Após a sua permanência na Stacio Limo, você seria instrutor de alguns templários em Urbo Kristalo, uma pequena reivindicação de alguns jovens templários. Então? O que acha?
- Seria uma grande honra senhor! – anima-se Dareh – Sempre quis conhecer a cidade.
- A experiência que Mei teve em pilotar naves foi vista com bons olhos, assim como, a sua curiosidade em expandir seus conhecimentos. Os dedicados jovens de ordem religiosa e filosófica de várias castas demonstraram interesse de que, pelo menos em um período de recesso nas suas atividades, participem de aprendizados extras.
     Mei olha para Dareh com gratidão:
- Não se preocupe. Não pretendo ficar muito tempo. Preciso sentir um pouco do isolamento no espaço, aprender na prática como se processam as transmissões na federação, escutar as estrelas e os sons do universo.
- Pela sua animação, imagino que não sejam semanas?
- Quem sabe um pouco mais – Sorrir Mei, temendo que seu antigo instrutor desista.
- Então? – pergunta o general – Temos um acordo?
- Claro! Senhor. Aceito com prazer. Mei está certa, essa experiência será útil para mim também, afinal, sair um pouco da rotina faz bem.
- Você foi bem recomendado Dareh, um pequeno conselho em Urbo Kristalo aprovou seu nome e eu faço muito gosto, pois sei da amizade que Mei tem por você.
- É recíproco general.
- Partirão em cinco dias numa nave de Urbo Kristalo: o Cruzador Sankta Spirito (Espírito Santo), a mesma que os levarão para o Planedo Kolonjo.
- Façam uma boa viagem – deseja Solaris.
- Obrigado senhora.
     Ao sair, Dareh da meia volta e fala com o general:
- Perdão senhor. Mas faria uma pequena gentileza?
- Se estiver ao meu alcance!
- Poderia convidar meu amigo Dr.Yusuke Jun para fazer parte da equipe na estação?
     O general faz um semblante de indecisão, como se vasculhasse pelo seu cérebro uma lista de nomes de médicos disponíveis.
- Temos um pequeno inconveniente aqui Dareh.
- Foi só uma sugestão senhor. Não estou a pressioná-lo e...
- Não é isso. Claro que seria um prazer atender um pedido seu, mas é que o Dr.Yusuke Jun estará em uma de nossas naves de apoio na órbita da estação. Preciso achar outro médico para que seu amigo possa ficar exclusivamente com vocês.
- Achei que seria prudente ter um médico na estação – disse Dareh.
- Também acho, apenas não faz parte dos exercícios médicos ficarem tanto tempo num local em que não possa realizar seus trabalhos. Alguns até adoeceriam de tédio! – O general solta uma gargalhada do próprio comentário.
- Tem razão, senhor – Sorrir o instrutor.
 - Bom! Não haverá problema, comunicaremos ao Dr.Yusuke que em poucos dias a sua rotina será abalada.
- Obrigado senhor!
- Se precisar de algo, estarei em contato.
     Dareh e Mei seguem para uma ampla e iluminada sacada. A chuva quase que instantaneamente havia parado, assim como os raios e trovões. Pouco menos de um quilômetro de onde estão, eles admiram o volume de água de um imensa cachoeira que cai a centenas de metros, onde a espuma que se forma não possibilita enxergar o fundo. Após demorada e silenciosa contemplação, Mei encosta suavemente a cabeça no ombro do amigo:
- Dankon (Obrigada)
- Nedankinde (De nada)
       Apesar de toda a beleza da paisagem, os pensamentos de Dareh estavam voltados para a grande responsabilidade que se ocultava na confiança dos pais de Mei. Sabia que o convite para acompanhá-la era mais do que uma simples escolha. Certamente, todos que fazem parte da tripulação do Sankta Spirito, das naves auxiliares e da própria presença do Dr. Lunn Aodh, todos estavam voltados para garantir a segurança da talvez a mais mimada e conhecida garota da federação.  
     Por mais que se evite uma demasiada exposição de Mei em relação a sua evidente e merecida celebridade, ela inspira muito mais do que o desejo de vivenciar suas emoções na plenitude, numa sociedade que vive permanentemente em situação de paz e equilíbrio, diferente em tudo do que se poderia esperar em outras galáxias conhecidas do entorno. Mei é especial, apesar dela não se apropriar dessa idéia, existe algo mais por trás do véu de mistérios que envolvem a sua vida.
- Você já foi alguma vez numa estação de fronteira? – pergunta Mei.
- Uma vez. Escoltava um cargueiro de suprimentos, mas foi na Estação Norte próximo a Galáxia Griza (Cinzenta).
- Já fez contato com alguma cultura de lá?
- Diretamente não. Mas vi algumas movimentações de suas naves. Os contatos são feitos na grande maioria pelos embaixadores.
- E quando é um alienígena não conhecido pelos militares, certo?
- De preferência, mas dificilmente antes de um primeiro contato a federação já não o tenha pesquisado. Existe uma orientação para não contatar ou interferir em certos mundos, poderia impactar o livre desenvolvimento da sua cultura.
- Aprendi sobre isso nas aulas em Kolonjo – comenta Mei.
- O trabalho do Dr. Lunn segue estas orientações, ele pode captar sinais grosseiros de rádio ou mensagens para decodificação, mas nunca responder imediatamente.
- E ele capta com freqüência?
- Conheço esse olhar brilhante e curioso! Mei, Não está pensando...
- Não! Não! – sorrir – Não faria nada que desrespeite as regras, entendo que é muita responsabilidade contatar novos seres.
- Fico mais tranqüilo.
- E na Galáxia Griza, como foram contatados?
- Uma raça alienígena superior forçou a situação e tivemos que intervir. Existe um minério no planeta por eles desejados que é vital para a sua sobrevivência chamado de ilmenita. Não tentaram fazer um contato amistoso e se aproximaram com extrema hostilidade.
- O como foi essa intervenção?
- Defendemos o povo desse planeta com nossas armas militares, os agressores não aceitaram nossa presença e nos atacaram também.
- Como é? – Mei se agita indignada.
- Pois é! – mas não houve feridos do nosso povo e eles levaram a pior.
- E como vocês reagiram? Atacaram de volta?
- Não Mei - sorrir Dareh, pacientemente – Poupamos suas vidas, atiramos em seus motores com um forte impulso eletromagnético e os deixamos a deriva no espaço por um bom tempo até suas necessidades básicas se exaurirem. Eles tomaram um grande susto ao perceberem que estavam lidando com seres bem mais evoluídos tecnologicamente.
- E moralmente, acredito. Se não os haveriam destruído sem piedade – gesticula Mei.
- Acho que quando a fome chegou aos limites, eles pensaram se éramos bondosos, antes que moralmente corretos.
- E como terminou?
- A nave que eu lhe falei que vi manobrando na fronteira, é da raça que antes era inimiga e hoje é pilotada pelos que foram atacados. Tivemos que ter muita paciência para contornar o pânico daquele pacato povo que tira seu sustento da terra em que vive.
- Agricultores?
- Isso mesmo. Acontece que o minério em grande abundância naquele planeta, não tinha a menor serventia para os donos. No entanto, os inimigos tinham máquinas que ajudariam no trabalho de lavrar o solo e outras para transportar e assim se estabeleceram num acordo comercial que dura até hoje. Ambos fazem parte dos mundos aliados da federação. E eles também se comprometeram em respeitar o acordo de não violação de mundos primitivos ou em desenvolvimento.
- Se não! Ficaram magrinhos de fome! Certo? – sentencia Mei.
- Está certo! – Sorrir Dareh.
     Quando se sente à vontade, a inteligência de Mei é substituída por resquícios da adolescente que Dareh conheceu no passado. É como se cada fase da sua vida completasse a sua personalidade sem perder a originalidade. Não era uma Mei, mas um mosaico delas, todas acessas e vibrantes. Ela poderia facilmente sair de uma situação que exigiria uma maturidade em decisões e logo depois de resolvido, sair correndo pelos campos e brincando sozinha como criança.
     Um sinal eletrônico avisa que uma mensagem está sendo solicitada para completar. Dareh toca num tipo de relógio em forma de bracelete transparente e uma pequena luz se desprende do mesmo e forma uma imagem holográfica suspensa no ar.
- Dareh! Já sabe da novidade?
- Yusuke!
- Fui convidado para acompanhá-los na estação de fronteira, não é uma maravilha?
- Quem bom que você gostou!
- Ah sim! Gostei muito, mas sei que foi um pedido seu.
- Pedi ao general.
- Entendo. Creio que não foi pela minha especialidade médica e sim pelos meus incríveis dotes de culinária. Vamos! Confesse!
- Você acha que eu viveria muito tempo numa estação de fronteira com aquela ração?
- Eu sabia! Por isso, já reservei nosso estoque de especiarias. Com o que tenho meu amigo, faria de qualquer ração militar um banquete digno para embaixadores.
     Dareh sorrir:
- Não tenho a menor dúvida.
- Dareh! Argos e eu sentimos a sua ausência hoje na instrução. Eu o convenci naquele jantar para que o cavaleiro negro não fosse tão duro com você.
     Dareh põem a mão na cabeça.
- Esqueci completamente de avisá-lo! Que vergonha!
- Mi atendis vin tutan horon. (Eu te esperei durante uma hora)
- Damne!  (Maldição!)
     O Dr. Yusuke tenta acalmá-lo:
- Tudo bem amigo! Fiquei no seu lugar.
- Não acredito! Você?
- Cansei todos os adversários que me perseguiam!
- Que bom! Você lutou com as espadas?
- Que nada, corri feito um louco, ainda estou ofegante. Eles desistiram de me pegar! Não sei como você tem coragem de participar daquilo, é uma tortura!
     Dareh não resiste e cai em gargalhadas.
- Entende agora por que precisamos de você? Seu humor cura qualquer tédio.
- Pois é! Nunca teste meu humor quando os temperos acabarem. Essa senhorita é quem estou pensando?
- É sim! Desculpa Mei, esse é o meu amigo Yusuke.
- Agrablas renkonti vin (Prazer em conhecê-lo).
- Agrablas!
     Dareh pergunta ao amigo:
- Kiam vi venos? (Quando você virá?)
- Chegarei no dia da partida, tenho que orientar meu substituto para assumir minhas aulas e separar algumas sementes para cultivo, não me informaram quanto tempo ficaremos.
- Não muito, espero.
- Anime-se amigo! Faz tempo que não temos uma boa aventura, viajar de vez em quando faz bem a saúde.
- Recomendações médicas?
- Pode ser! Um tempo sem lutar com espadas lhe fará bem.
- Aceito o conselho doutor!
- Aceita? Assim? Tão rápido? Você começa a me preocupar Dareh!
- Acho que vai ser divertido. Então, no vemos em cinco dias.
- Chegarei antes do café da manhã, me espere!
- Vou esperar! Não se atrase! Ĝis!  (Até!)
- Ĝis! 
- Luta de espadas?
- Sim Mei. É uma simulação. Fazia parte da cultura Tero Unua.
- Entendo.
- Mei. Mi estas laca. (Estou cansado)
- Pluvas. (Está chovendo)
     Dareh boceja demonstrando querer dormir:
- Vou descansar.
- Que pena, nossa conversa estava muito agradável.
- Vamos ter bastante tempo para conversar. Prometo.
- Mas antes de dormir, me diga uma coisa, como é o Dr. Lunn?
- É um pouco mais velho que você. Muito inteligente e parece que se diverte com seu trabalho. Não conheço pessoalmente, mas tive boas informações a seu respeito. A sua família é de Urbo e não tem irmãos, como a maioria de nós.
- Eu lhe considero como um irmão, Dareh.
- Tenho esse sentimento também, irmãzinha – sorrir
     Mei salta abraçando o pescoço de Dareh quase derrubando o amigo e saem juntos para seus aposentos, combinando em organizar os detalhes da viagem nos primeiros dias. Eles programam uma folga para passear na região de Sudaj Ventoj.
     Nas regiões desérticas do Planedo Urbo, encontram-se gigantescos lençóis subterrâneos de um minério utilizado para a renovação de oxigênio, purificação do ar, equilíbrio dos níveis de pressão interna e suporte de vida para os diversos tipos de naves. Nas luas orbitais, existem indústrias que processam todo minério, inclusive os radiativos encontrados em seus solos, usados para amplificar grandes quantidades de energia na utilização de condensadores que armazenam eletricidade. São usadas para gerar fusão nuclear de hidrogênio para a propulsão mais rápida que a luz.  As naves são lançadas no subespaço ou hiperespaço, num salto temporal em grandes velocidades para pontos longínquos da galáxia. Dependendo da distância, uma viagem que duraria centenas e milhares de anos luz com motores de baixa propulsão, é realizada em algumas horas ou semanas aproximadamente. Para viajar em regiões interplanetárias comerciais ou em atmosferas, são usados naves com propulsores de velocidades menores.
     Durante os primeiros dias, todos os preparativos para a viagem foram providenciados. O Cruzador Sankta Spirito já se encontra na órbita do Planedo Urbo e pequenas naves cargueiras conduzem os últimos suprimentos.
     O General Anor Meadhas encontra-se a bordo do cruzador e acerta os detalhes com o Comandante Akash Abhaya, 44 anos, humarante sapiens. Após liberar a frota de apoio que deixará Mei, Dareh e Yusuke na estação, o cruzador seguirá para outras missões em sistemas planetários próximos. O tempo de permanência de Mei e seus amigos na estação estão relacionados à conclusão destes trabalhos, em aproximadamente oito semanas.
     No espaço, uma frota militar de apoio composta de quatro pequenos cruzadores, liderada pelo Comandante Sarte Sigmar, que fará a segurança na Stacio Limo.  É Iniciando acoplagem no casco do Cruzador Sankta Spirito, concluindo assim, todos os preparativos para seguir viagem.
     Dareh entra nos aposentos de Mei:
- Atrapalho?
- Pode entrar! Estava aqui concluindo minha pesquisa sobre o Dr. Lunn.
- O que achou?
- Acho que vai desperdiçar a sua juventude se dedicando tanto ao seu trabalho.    
- Ele tem algum tipo de lazer?
     Dareh sorrir:
- Que eu saiba não. Ele é bem reservado e concentrado em seu trabalho.
- Realmente, ele parece ser brilhante. Poderia ser um excelente instrutor.
- Dr. Lunn? Acho difícil. Sua inteligência rivaliza com a sua timidez. Quase não tem vida social. Seus pais foram um dos pioneiros no desenvolvimento das estações de fronteira e como ele, vivia nelas. Cresceu aprendendo na prática a lidar com muitas questões difíceis no campo da comunicação e decodificação de mensagens. Seu brinquedo predileto e acho até que atualmente seja seu passatempo, é direcionar as antenas e telescópios localizados na exogaláxia para vasculhar o universo.
- Interessante! Acho que nem tem namorada – Mei pensa em voz alta.
- O que disse?
- Nada não! Pensei alto.
     Uma voz ecoa no corredor:
- Mi estas malsata! – (Estou com fome).
- Conheço essa voz!
- Saluton Dareh!
- Bonan matenon! (Bom dia!), Chegou agora?
- Faz algum tempo, estava negociando no embarque as minhas malas extras.
- Comida, no mínimo!
- Sabe Dareh, Você ainda vai me causar uma úlcera com seus comentários indiscretos! Claro que é comida!
- Úlcera? O que isso? – pergunta Mei.
- Hã! - Esquece, deixa prá lá! – responde Yusuke com um simpático sorriso.
- Dr. Yusuke, acaba de me lembrar algo muito importante! Não tomamos café da manhã.
- Sabe mocinha, acho que vamos nos entender muito bem - Dr. Yusuke aperta a mão de Mei – Pode me chamar de Yusuke.
- Pode me chamar apenas de Mei – retribui sorrindo.
- Vi estas bela (Você é bonita!)
- Dankon – (Obrigada)
- Nedankinde – (De nada)
- Então! Vamos comer? – convida Dareh.
- Konsentite! – (De acordo!) – confirma Dr. Yusuke – Obrigado por esperar.
- Falando nisso, os pais de Mei já devem está nos aguardando, vamos embarcar em duas horas.
- Que bom! Gosto de uma mesa com muita gente.
     Após uma descontraída conversa no café da manhã, Mei se despede dos pais e segue para a plataforma de embarque, acompanhada pelo Dr. Yusuke e Dareh. Eles partem de Urbo em direção a sua órbita, embarcando novamente no Cruzador Sankta Spirito, que após fazer uma pequena manobra de acerto de curso, se precipita em frações de milésimos de segundos num flash de luz que se forma em sua frente, saltando para outra região da Galáxia de Áxis.

Capítulo 2

PLANEDO TRYARI
(Planeta Tryari)


     Distante milhões de anos luz da Galáxia de Áxis encontra-se outro aglomerado de estrelas e sistemas planetários, resultado da colisão de dezenas de galáxias chamado de Rhisvi.
     Assim com Áxis, Rhisvi é uma das mais antigas e remotas galáxias, ambas formadas centenas de milhões de anos depois do nascimento do universo, estando aproximadamente 13 bilhões de anos-luz da Terra.
     Palco de inúmeros conflitos entre diversas espécies alienígenas conscientes, muitas delas completamente extintas, a Galáxia Rhisvi foi uma das mais atingidas pela fúria devastadora de seres oriundos de distantes e desconhecidas regiões do universo, mentalmente escravizados e liderados por uma misteriosa e poderosa entidade conhecida como Viga.
     O caos em Rhisvi, inclusive a mobilização de corpos celestes como opção de ataque, é fruto das investidas cruéis das forças de Viga. Foram centenas de planetas destruídos e milhares de seres retirados dos seus mundos, raptados e escravizados.
     De tudo que se compreende em relação aos motivos de tão enigmática entidade, seria destruir um grupo de seres cuja sua natureza e origens também são desconhecidas. Estes seres são responsáveis pela semeação de vidas no universo desde que os mesmo surgiram. Idolatrados com vários nomes de deuses em milhares de culturas espalhadas em inúmeras galáxias, os co-criadores cumprem as suas divinas missões, semeando e criando condições para que a vida prospere no universo por onde passam, formando um mosaico de heranças e semelhanças.
     Acredita-se que na simples passagem dos co-criadores, a energia vital que desprendia de suas formas esféricas, de variados brilhos e cores, foi o suficiente para “adubar” a matéria escura abundante no espaço. Não se sabe ao certo de onde vieram e para onde foram, sabe-se que muitos passaram e alguns retornaram na intenção de proteger as suas criações.
     A presença de Viga e suas investidas nos “Berçarios dos Deuses” indicam para um único motivo: Atrair os co-criadores. Se suas intenções fosse simplesmente destruir o que existe de vida no universo, provavelmente ela o já teria feito, mesmo tendo consciência do grande desgaste de tempo e energia que isso poderia causar.
     Viga deseja algo valioso, extraordinário e enigmático até para as culturas conscientes mais avançadas. E o seu objeto de desejo está relacionado a algo do conhecimento dos co-criadores e que também motivou a presença deles.
     No início, Viga seguia as pistas cósmicas dos co-criadores e usava das mesmas versatilidades e poder de se deslocar no espaço-tempo. Observava o progresso de culturas e guiada por uma intuição particular, identificava os sinais deixados por eles, na sua maioria alguns tipos de sóis. Estas estrelas foram cascas embrionárias de outros co-criadores que seguiram trajetória desconhecida. Assim, Viga e seus aliados aterrorizavam nesses mundos na intenção de chamar a atenção.
     Quando um co-criador estava pronto e adaptado ao novo ambiente dimensional, libertava-se do casulo e uma esfera luminosa surgia. Para desviar das intenções de Viga, os deuses que retornaram tiveram que se desprender de suas esferas e para isso, precisariam de um corpo orgânico, chegando até por longos períodos de esquecer temporariamente das suas verdadeiras identidades.
     As esferas que foram liberadas no espaço, com o tempo aumentavam de tamanho, gerando estrelas especiais. Onde se encontravam essas estrelas, os aliados de Viga estariam investigando. Os deuses por outro lado se disfarçavam e se uniam, planejando ganhar tempo para que Viga não atingisse seus propósitos.
     Viga não pode usar o artifício de possuir um corpo orgânico neste universo, a sua natureza não permite e, se fosse possível, sua força seria exaurida e essa fragilidade permitiria aos co-criadores identificá-la e aprisioná-la. Ao contrário de Viga, os co-criadores sabem da sua localização, sentem a sua energia e tem o apoio de muitas de suas criações. Antecipa algumas vezes, providências de defesa em muitos mundos, não mais tolerando que vidas inocentes sejam destruídas.
     Seres evoluídos como os humarantes, tryarianos e deluvianos auxiliam indiretamente os co-criadores, mas para não chamar a atenção de Viga, também são poucos e desconhecidos os escolhidos membros em seus mundos, que seguem uma vida normal e tranquila. Eles são detentores das esferas matrizes que não se tornaram sóis, dos deuses Navan, Luna, Nana e Lilith, e que são fontes inesgotáveis de energia e poder, usados para combater as forças de Viga e seus servidores. As esferas matrizes transformam simples planetas em poderosas astronaves de combate.
     A articulação desses deuses é regida por um líder co-criador, conhecido por um nome terráqueo de Rá, sendo apoiado por outros deuses de igual poder.
     Uma herança dos deuses traçou o destino de raros filhos semideuses: Mei, filho de Navan e Luna; Gruner, filho de Navan e Lilith; Solaris, filha de Dracon e Nana; Khufu, filho de Snefru e uma terráquea chamada Hetepheres. Com exceção de Khufu, os demais semideuses desconhecem suas paternidades divinas.
     O gigante Planeta Tryari é repleto de estranhas e bizarras formas de vida que povoam os seus ambientes escuros, hostis e insalubres. A sua geografia é bastante irregular, rochosa e acidentada, agravada com regulares atividades vulcânicas. O clima é geralmente quente, amenizando próximo aos pólos, região evitada pelas feras, onde a luminosidade é sempre crepuscular. Nessa parte do planeta existe um belo oceano com águas cristalinas e muitos arquipélagos com cidades governadas por um regime monárquico.
     Gruner Ar é o único filho da Deusa Lilith e apesar da pouca idade, 21 anos, é o regente de Tryari. Nunca teve contato com seus pais e lhe foi dito que ambos haviam morrido, quando ainda era criança, combatendo as forças de Viga. Foi criado por um tutor chamado Giambo Zoolie, um ser humanóide, rosado, baixo e corcunda, aparentando ser um ancião, de uma raça chamada Bitinus.
     O Regente Gruner Ar tem a forma humana dos seus pais e que enaltece a idolatria dos tryarianos que o considera filho dos deuses. Assim como Giambo, os bitinus são criaturas ordeiras, humildes e prestativas.
     Outro grupo de alienígenas que representam a força de defesa no reino são os deluvianos, seres que tiveram seu mundo devastado num passado longínquo pelas forças de Viga e que encontram no Planeta Tryari a paz de uma vida sem ameaças. Os deluvianos são seres grandes que atingem cinco metros de altura na fase adulta. São guerreiros inteligentes, fortes, corpulentos e um pouco temperamentais. Alguns grupos isolados servem e protegem os deuses Rá, Luna, Navan, Nana e Lilith. Os deluvianos também são os principais operadores das naves estrelas: Navan e Lua Negra.
     O centro do poder no Planeta Tryari está no reinado de Ar tok, e seus limites são habitados por dezenas de outras raças alienígenas refugiados de outros mundos da Galáxia de Rhisvi. Eles colaboram com os deluvianos no desenvolvimento de tecnologias e construções de naves em troca da sua proteção e preservação de suas ameaçadas culturas.
     O patrulhamento em Rhisvi é realizado pelos deluvianos sob o comando de Truskas Zim, um dos antigos guardiões da esfera Navan no Planeta Éris da Galáxia Via Láctea. Truskas conhece a verdade sobre Gruner, foi designado como o seu protetor.
     Uma das principais tarefas do reinado de Ar tok, é unir e reconstruir a maior quantidade de mundos possíveis em Rhisvi, fornecendo armas e naves para defesa e trânsitos comerciais.
     Curiosamente, um tipo de animal voador conhecido como grun, vive nos arredores do rústico e imponente Castelo de Ar tok, que tem esse nome em referência a vocalização produzida por esses animais. São feras negras, voadoras e espertas, com mais de três metros de altura e que se comportam como guardiões. São vistas a distância, como gárgulas sobrevoando os cumes das torres e vigiando sob os beirais de edifícios. Os gruns são protegidos e nunca molestados, sua imagem aparece em símbolos reais, esculturas, naves e indumentárias, sendo fácil para qualquer povo em Rhisvi, descobrir o planeta cujo objeto decorativo foi adquirido. Os gruns reconhecem e obedecem, por conexão telepática, exclusivamente ao monarca ou indicado por ele, permitindo montá-los quando este deseja sobrevoar a cidade.
     Os gruns são endêmicos do Planeta Tryari, mas no passado muitos foram capturados pelos aliados de Viga e também sofreram intervenção mental e orgânica para servi-la. Os gruns são os primeiros a atacar a suas vítimas, seu voo é silencioso e pode atingir grandes alturas, suportando bem o frio e o calor. Acasalam-se a cada cinco anos, tendo uma cria por vez, onde realiza em bandos, uma longa migração para as regiões altas e montanhosas do planeta. A única fraqueza destes seres é que são sensíveis a luz, seus hábitos são crepusculares e noturnos e seus vermelhos olhos conseguem identificar fontes de calor a grande distância. Em Tryari, seu planeta natal, os gruns se alimentam exclusivamente da resina adocicada de um tipo de árvore comum existente no planeta: o rasmus. Se um grun ingerir qualquer outra fonte de alimento, provocará o desenvolvimento e mutação de bactérias nocivas em seu organismo. Essa voraz bactéria se espalha pelo sistema circulatório dos gruns e passa a se alimentar do seu próprio corpo multiplicando cada vez mais. Os gruns para não morrerem, precisam se alimentar de carne não contaminada por essa bactéria e qualquer arranhão provocado por eles transmite a doença. Por isso que existem muitos relatos do cheiro fétido que é sentido quando essas feras estão contaminadas, servindo aos aliados de Viga, o que causa muita tristeza na população de Tryari.
     Os habitantes de Tryari cultivam hábitos simples e não se preocupam com suntuosidades e acúmulos de riquezas. O que mais apreciam é manter a tradição de confeccionar objetos e armas artesanais e se aventurarem a caçar feras nas regiões quentes do planeta.
     No alto do palácio, um servo bitinus corre para uma sacada e sopra uma longa trombeta para chamar a atenção dos gruns. Ele olha para o horizonte para ter certeza que foi ouvido e logo recebe confirmação visual de dezenas de gruns manobrando nos ares e retornando. O servo se agita e se retira as pressas com a chegada de Giambo. Os gruns se aproximam liderados por Gruner, que está montado em um deles. O animal abana as asas e pousa suave na sacada. Gruner desce e sinaliza para o alto e todos os gruns voam para as torres.
- Algum problema? – pergunta Gruner.
- Meu senhor. Truskas Zim avisa que chegará trazendo gruns contaminados para a reserva.
- Onde foram encontrados?
- Em nossa galáxia, meu senhor.
- Estarei em meus aposentos, avise-me quando ele chegar.
- Assim será, meu senhor – Giambo se retira respeitosamente.
     Gruner se aproxima da sacada e olha para cidade, pensativo. A presença de gruns contaminados indica que as forças de Viga estão agindo na galáxia, pois havia décadas que isso não acontecia. Mas está satisfeito em saber que os gruns doentes serão tratados e curados com a simples alimentação da resina de rasmus e depois serão libertados antes da migração.
      Uma pequena nave aterrissa na plataforma do palácio. Truskas Zim se dirige para a recepção real e é servido de uma caneca com refrescante bebida de boas vindas. Foi oferecido por servos bitinus, que tiveram dificuldade em trazê-la num tipo de reboque. O deluviano bebe de uma só vez e enxuga a boca com o braço. Giambo abre uma porta para a passagem do seu senhor.
- Truskas!
- Saudações majestade – fala o deluviano com a sua voz potente e grave.
- É verdade que acharam gruns?
- Sim, um grupo de oito, estavam fracos e adormecidos.
- E quem os entregou?
- Encontramos uma pequena nave abandonada que emitia um sinal de socorro nos limites Rhisvi. Não havia tripulação e identificamos a presença de gruns contaminados.
- Descobriram a procedencia da nave?
- Rastreamos o seu sistema que indica que partiram de uma região escura próxima a Áxis. O modelo da nave é desconhecido.
- Sabemos que não existem gruns em Áxis, isso indica que Viga está agindo. Mas por que se arriscariam em se aproximar do povo humarante?
- Não sabemos majestade. O único mundo que possui vida naquele quadrante é o Planeta Gir.
- Qual é a situação desse planeta?
- É pequeno, de atmosfera habitável, mas sem civilização, apenas com animais nativos.
- Já ouvi falar desse planeta – Gruner olha para Giambo.
- Sim, Majestade. Em nossas antigas aulas lhe falei sobre esse planeta onde vivem criaturas fantásticas chamadas de dromis.
- Sim, os dromis! Lembro-me agora.
- O que faremos majestade – pergunta Truskas.
- Onde está a nave em que se encontravam os gruns?
- No setor de descontaminação. E os gruns já estão sendo tratados com rasmus.
- Quero uma análise precisa de cada parte da nave e reúna o conselho, precisamos descobrir mais detalhes antes de contatar a Federação Áxis.
     Algum tempo depois, Gruner se encontrava reunido com o conselho formado exclusivamente por silenciosos deluvianos. Aguardavam a chegada dos primeiros relatórios de investigação da nave, mas já haviam decidido em comunicar a Federação Áxis.
     Uma porta se abre e Giambo entra acompanhado de Truskas que trás um cristal de dados.
- Então? Temos mais informações?
- Sim, majestade – responde Giambo.
     Truskas se aproxima de um painel e introduz o cristal e uma imagem aparece num tipo de tela.
 - As primeiras pesquisas não identificam a origem da nave – explica Truskas – Seu sistema de propulsão é diferente das demais naves conhecidas.
- Poderia nos explicar?
- Certamente, majestade.
- A propulsão foi desenvolvida com uma tecnologia que utiliza um tipo de algas na criação de combustível renovável.
- Biocombustível!
- Sim majestade, desenvolveram enzimas capazes de extrair açúcares dessas algas e usar como fonte de energia e biomassa. Um composto residual desse processo possui alto valor nutricional.
- Interessante! A mesma energia usada para mover a nave é utilizada para se alimentar?
- Exatamente, majestade. O composto possui um baixo conteúdo calórico e de gordura, no entanto possui alta concentração de minerais, vitaminas e proteínas. Até o momento, essas desconhecidas algas parecem ser bastante tolerantes as variações de temperaturas e se desenvolvem rapidamente num compartimento de cultivo específico.
- Nesse caso, a nave não tem propulsão para hipervelocidades?
- Não, majestade. Acreditamos que foram construídas para viajar em pequenas distâncias ou como recurso de fuga.
- Fuga?
- É uma nave pequena, o suporte de vida estava em níveis normais, não existem avarias no casco. Poderia funcionar como uma câmara de hibernação e permitir que a tripulação fique longos períodos à deriva no espaço, aguardando um resgate.
- Mas não foi ativado hibernação?
- Não majestade, não seria compatível para uma tripulação alienígena dividir o mesmo espaço com gruns. Inimaginável, no entanto necessário dizer, que nenhum grun possui capacidade para operar nenhum tipo de tecnologia.
- Então os gruns foram entorpecidos, jogados dentro da nave e enviados para a nossa galáxia?
- Em princípio sim, majestade. Porém seu navegador não tinha uma rota estabelecida, o que faz duvidar de que vieram para cá deliberadamente. Apesar do casco da nave está em perfeitas condições, encontramos vestígios radioativos de poeira produzida por energia fotônica. Uma explosão deve ter lançando a nave aleatoriamente para os limites da nossa galáxia.
- Possui armas? Relatório de tempo de percurso?
- Nenhum tipo de arma foi encontrado, majestade. Apesar de não ter sido observado nenhuma queimadura somática nos gruns produzida por radiação, os vestígios encontrados no casco devem ter sido provocados por disparos. Também nada encontramos na área de carga.
- E o tempo de percurso – insiste Gruner
- Duas semanas de nosso padrão de tempo, majestade.
     Gruner se levanta da cadeira e vai até uma janela onde observa um grupo de gruns sobrevoando as torres. Volta calmamente o olhar para o conselho e com uma expressão de que está muito perto de entender o problema fala com bastante convicção:
- Isso confirma que foi usada como uma cápsula de fuga, mas não explica o que um grupo de gruns estava fazendo nela e sem a tripulação. Que tipo de confronto ocorreu nos limites de Áxis, que pelas regras do acordo de cooperação dos mundos aliados, certamente eles haveriam nos comunicado o ocorrido. E outro mistério, é como uma nave sem hiper propulsão, sem câmara de hibernação ativada, consegue chegar a nossa galáxia, partindo do outro extremo da Galáxia de Áxis. Isso levaria centenas de anos luz!
     Os demais membros do conselho se entreolham. 
- Algum risco biológico? – pergunta o regente.
- Fizemos coletas no gruns, os primeiros testes confirmam apenas a contaminação típica da sua alteração fisiológica. Outros exames químicos precisam de tempo para ter resultados contundentes.
- Precisamos saber a origem desta nave! É a única pista que temos.
- Enviaremos os primeiros relatórios para a Federação Áxis. Não encontramos nada em nossos arquivos que revele a origem desta nave. Podemos está diante de uma civilização não contatada - explica Truskas.
- E certamente, já está sendo vítima de Viga!
- Possivelmente, majestade.
- Fizeram um bom trabalho! Assim que sair os últimos resultados dos exames e resposta da Federação Áxis, quero ser informado imediatamente.
- Assim será, meu senhor – Giambo antecipa a resposta.
      Nas cidades de cada arquipélago, a população está eufórica com os preparativos da festa comemorativa da migração de acasalamento dos gruns. Alguns machos já ostentam estrias prateadas no abdômen, indicando o início de um novo ciclo reprodutivo.
     Os membros do conselho se retiram da sala de reuniões. Giambo fecha a porta e percebe que o Gruner está de volta à janela.
- Estou achando os gruns um pouco agitados. Faz muito tempo que eles circulam as torres.
- Deve ser devido à aproximação da migração, meu senhor.
- Não tenho certeza disso, consigo perceber uma ansiedade diferente neles. Parece que está relacionada à presença dos gruns recém chegados.
- Meu senhor, os gruns estão praticamente curados da sua contaminação, estão calmos e bem dispostos – disse Giambo – Poderão conquistar a liberdade e migrarem com os demais. Nunca tivemos problemas com eles.
- Talvez eu esteja mais alerta que eles, devido os últimos fatos.
- Sim, meu senhor. Uma preocupação justa, quando se trata de Viga. Mas tenho observado que meu senhor não tem dormido bem. Tenho visto na varanda dos seus aposentos, absorvido por pensamentos.
- É verdade. Tenho tido sonhos estranhos.
- Que tipos de sonho, meu senhor.
- Uma jovem humarante que nunca encontrei. Seus olhos têm o azul dos nossos mares e sua voz é doce e confortante.
- Uma jovem humarante meu senhor?
- Sim Giambo. Existe muita familiaridade entre nós.
- Familiaridade?
- Sim, como uma irmã.
- E como é este sonho?
- Confuso e sempre termina da mesma forma quando damos as mãos.
- Meu senhor já conheceu outras mulheres humarantes quando visitou Áxis.
- Mas essa é diferente e já faz um longo tempo em que estive em Áxis.
- Certamente, majestade.
- É como se fosse um chamado, um encontro. Não sei explicar. Quando estou com ela sinto uma grande felicidade e paz.
- Não seria o momento de sua majestade pensar em casamento?
     Gruner esboça um sorriso e toca na cabeça do seu tutor.
- Não se trata de casamento meu fiel amigo. No momento certo, encontrarei a futura rainha.
- Será uma grande alegria para nosso reino, meu senhor. Será finalmente rei.
- O sentimento pela humarante do sonho é fraternal, mas não faz nenhum sentido, pois não tenho irmãos.
- Sente falta de está com pessoas da sua raça?
- Sou feliz aqui e nunca tive essa necessidade, sou sincero quando digo isso.
- Suas palavras são sempre verdadeiras, meu senhor.
- Sabe Giambo! Estava pensando em fazer uma nova visita a Galáxia de Áxis.
- Seria maravilhoso, meu senhor. Mas qual seria a justificativa do nosso regente se deslocar para tão longe?
     Gruner desanima diante dos argumentos de Giambo. Não faria muito sentido deixar Rhisvi apenas por um desejo pessoal, movido por uma curiosidade de um sonho.
- Tem razão e, além disso, Truskas tem sido um excelente porta voz.
- Porta voz? Majestade – disse Giambo com fina ironia.
     Gruner não resiste e sorrir descontraidamente com o humor ácido de Giambo, fazendo uma referência aos deluvianos que praticamente não são de falar muito.

Capítulo 3

PLANEDO OCEANO
(Planeta Oceano)

     Localizado em outro extremo da Galáxia de Áxis, encontra-se uma das mais belas civilizações do mundo humarante: O Planeta Oceano. A sua superfície é quase totalmente coberta de água.
     São águas de baixa densidade, pura, cristalina e de um azul brilhante e fosforescente, devido à presença de algas que fazem cintilar ao menor toque do vento. É também um dos maiores planetas, sendo 2.600 vezes maior que o Planeta Terra e assim como esta, possui uma lua orbital. A sua população na maior parte é formada por humarantes Homo aumarantes.
     A única poção de terra tem pouco mais de 8 milhões km², um minúsculo arquipélago em comparação com o volume de massa líquida do planeta.
     A maioria das cidades encontra-se flutuantes ao longo dos oceanos, submergindo quando necessário nos períodos de alterações climáticas. Na porção de terra firme conhecida como Kampo Verdo (Campo Verde), as cidades possuem o formato de longas e luminosas torres com limitada uma população.   
     Dezenas delas estão espalhadas estrategicamente pelo continente, construídas com o mínimo de impacto ambiental, preservando o ambiente original do planeta.
     Já era noite quando a cidade Turo Orienta (Torre Leste), recebe a comunicação do Cruzador Sankta Spirito que se encontra para a sua primeira parada na órbita do Planedo Oceano. A missão do cruzador nesse planeta é deixar o embaixador humarante aumarante, Nuada Nin, 256 anos, filho do lendário Conselheiro Netuno de Tero Unua, e que estava um longo período no Planedo Kolonjo, participando de decisões diplomáticas que envolvem a adesão de novos mundos à Federação Áxis.
     Na sacada de uma ampla janela panorâmica do cruzador, encontra-se Mei, Yusuke e Dareh conversando com o Embaixador Nuada.
- Kiel belas la luno ĉi-vespere! (Que lua bonita temos esta noite!) – disse Mei.
- Ŝi estas bela (É bonita) – responde o embaixador – É tão bela quanto a lua de Tero Unua, sinto saudades do nosso antigo mundo.
- Quando o senhor volta para Urbo Kristalo?
- Kiel eble plej baldaŭ (O mais breve possível), enquanto não indicar um substituto para as minhas funções.
- O senhor deixará a embaixada? – pergunta Yusuke.
- La arto estas longa, la vivo mallonga (A ciência é duradoura, mas a vida é breve) – responde o embaixador – É preciso seguir para outros aprendizados.
- Soube que o senhor pratica luta com espada? – comenta Dareh.
- Uma luta solitária com o vento – sorrir o embaixador - Quando tenho tempo livre, gosto de praticar, ajuda a manter a mente e o corpo em alerta. Ganhei uma espada samurai de presente do meu pai quando era criança. Seu interesse não é por acaso, eu suponho.
- Também gosto de praticar no campo virtual, apesar de ter melhor desempenho com arco e flecha. Recebo aulas com o instrutor Argos Aury.
- Conheço Argos Aury. Esteve uma vez aqui em Oceano participando de um campeonato. Ele é muito habilidoso, você tem um excelente instrutor.
     Um oficial humarante se aproxima e avisa ao embaixador que o transporte está pronto.
- Preciso ir meus amigos, tenham uma boa viagem.
- Obrigada embaixador – Mei se aproxima e abraça Nuada.
     O embaixador segura suavemente a face de Mei com as duas mãos.
- Existe um brilho especial em seu olhar jovem Mei.
- E existe muita bondade nos seus embaixador. Sentirei falta das nossas conversas.
- Teremos outras oportunidades. Navan! – o embaixador levanta a mão direita em saudação.
- Navan! Embaixador.
      O cruzador recebe sinais de boas vindas e, uma nave pilotada pelo próprio Comandante Akash Abhaya, se desloca seguindo em direção ao planeta. Ele tem aterrissagem programada na cidade flutuante de Sireno (Sereia).
- Não precisava se dar ao trabalho de me trazer comandante – comenta o embaixador com ternura.
- É uma honra que não resisto em dispensar, senhor embaixador. Também não queria perder a oportunidade de ver esse belo oceano de perto.
- Será bem-vindo sempre que quiser. Os segredos desse oceano são conhecidos por poucos.
- Aceito com agrado o convite senhor. E os segredos são necessários e compreensíveis.
     Ao se aproximar de Urbo Sireno, eles são cercados por outras dezenas de pequenas naves que fazem um escolta, deixando rastros luminosos no céu. O mesmo acontece com todas as cidades em terra firme, projetando longos feixes de luzes coloridas para o céu. Da sacada da nave, os três amigos observam.
- Eles sabem como receber bem seus visitantes – disse Yusuke – Mas interessante! Não vejo mais a nave de transporte, sumiu nas nuvens.
- Estão felizes com a chegada do embaixador – comenta Mei - Ele é extraordinário e muito querido!
- Imagino quanto conhecimento habita em seu ser – diz Dareh, pensativo.
- Alguém sabe qual a próxima parada? – pergunta Yusuke.
- Stacio Limo Nordo (Estação Fronteira Norte) – responde Dareh.
- Estamos do lado oposto do nosso destino, essa viagem vai demorar mais do que imaginava.
- Gostaria de conhecer essa estação – revela Mei, curiosa.
- Você vai gostar – diz Dareh – Ela fica próximo a um pequeno planeta chamado Ruĝo (Vermelho). Foi a primeira e mais antiga estação de fronteira de Áxis, é tradicionalmente formada por descendentes do Planedo Marso (Planeta Marte).
- O planeta é vermelho?
- Não, o planeta não é vermelho, na verdade é cinza-azulado e muito frio. Sua atmosfera ainda está sendo processada pelas máquinas de terra formação e que já é possível respirar sem ajuda de trajes. O nome vermelho é como eram chamados os habitantes do Planeta Marte que ficava 12 minutos-luz de Tero Unua.
- Bem perto.
- Sim, mas num passado remoto, uma viagem de ida durava seis meses. Mas com o avanço da tecnologia espacial foi diminuindo gradualmente.
- É muito tempo de viagem.
- Sim, eles eram determinados e corajosos.
     Yusuke escuta a conversa:
- Eu morreria de fome! Nem pensar numa viagem dessas!
- Ele é sempre assim? Só pensa em comida?
- Não Mei, só quando pensa em ficar sem ela – sorrir Dareh.
- Por que você não passa um tempo na cozinha do cruzador – sugere Mei – Assim você se acalma.
- Sabe que você me deu uma excelente idéia – Yusuke estala os dedos.

     Dareh e Mei se entreolham e sacode os ombros sem entender as intenções do médico. Minutos depois a chegada do Comandante Akash, o cruzador se movimenta para fora da órbita do Planeta Oceano. Com uma nova rota traçada, a nave acende e acelera os motores sub-luz, desaparecendo mais uma vez na escuridão do espaço, deixando um rastro de partículas.

Capítulo 4

STACIO LIMO NORDO
(Estação Fronteira Norte)


     A migração do povo humarante para a Galáxia de Áxis e os séculos que sucederam após isso, não foram suficientes para enfraquecer alguns hábitos de comportamento e enraizadas tradições.
     Os habitantes do Planeta Vermelho é um dos melhores exemplos de que a cultura vai junto com o viajante. Descendentes dos humanos que viviam no Planeta Marte, os vermelhos praticamente não foram influenciados pela cultura unida humarante.
     Houve necessários ajustes e adaptações para que o seu estilo de vida pudesse ser preservado. A cultura humarante estimula e aprecia as antigas tradições, e as aulas e instruções sobre Tero Unua são à base da educação desse povo. Também encontram no aperfeiçoamento da ciência, as condições para o desenvolvimento e sobrevivência.
     Numa sociedade tão pacífica como a humarante, como se comportaria diante de uma guerra? Uma civilização inserida numa pequena galáxia que desde a sua chegada nunca foi ameaçada e, quando houve, foi a centenas de anos no Planeta Terra.
     Os humarantes não conhecem ameaças, fome, doenças e outros conflitos que só conhecem mediante a história, quando no passado foi obrigado a enfrentar perigosos inimigos e posteriormente, se tornar um dos seres mais poderosos do universo. A expectativa de vida chega até 210 anos para os humarantes sapiens e 330 anos para os humarantes aumarantes. Essa longevidade está relacionada à qualidade de vida, o avanço da medicina e das próprias características genéticas de cada raça.
     Para os mundos que vivem com a paz e a segurança sempre ameaçados, torna-se essencial a formação de uma ordem militar, no investimento de esforços e tecnologias bélicas capazes de se defender e atacar. Mas quanto maior o poder das armas, maior a responsabilidade em usá-las.
     Mas como criar um efetivo militar se não existe uma cultura de guerra? Com exceção dos vermelhos, os humarantes não pensam nisso, nem tão pouco em conflitos e revoluções. Eles sabem o poder de fogo e destruição de suas armas. Quando existe a possibilidade de usar algum tipo de força, está acontece pelo campo diplomático e em casos extremos, algumas armas de baixo impacto são ativadas e disparadas, mas sempre pensando em poupar as vidas dos adversários.
     O Planeta Vermelho continua a mesma tradição do Planeta Marte: Formar soldados e oficiais, que na prática, trabalham juntos com algumas funções distintas. Em confrontos diretos, o comando de naves armadas e de caças são atribuições exclusivas dos militares, sendo que escoltas de cargueiros podem ser executadas por pilotos civis.
   A vida dos vermelhos difere dos antigos marcianos em pequenas, mas profundas mudanças. O clima e a atmosfera são opostos, pois Marte possuía temperaturas elevadas, enquanto o atual planeta é rigorosamente frio com amenidades em alguns períodos, permitindo realizar passeios ao ar livre, o que em Marte só poderiam ser feitos com o uso de roupas especiais.
     O Planeta Vermelho possui uma população bastante rotativa. É basicamente um campo de instrução militar, sendo poucos os que lá nasceram. A grande maioria pertence a outros mundos humarantes da Galáxia de Áxis.
     A Stacio Limo Nordo (Estação Fronteira Norte) se orgulha de ser a primeira no gênero, criada para o monitoramento de comunicações. Localiza-se no ponto histórico de “entrada” do primeiro contato com a galáxia, onde os primeiros viajantes humarantes chegaram, partindo da Via Láctea. Foram guiados por um co-criador em sua forma original chamado de Deus Áxis, originando assim, o nome dessa galáxia em sua homenagem.
     Esse co-criador nunca mais foi visto, tornando-se quase uma lenda entre o povo humarante, que acredita que ele retornará para mais uma vez guiá-los a outras distantes regiões do universo.
     Para quem comanda uma estação de comunicação como se fosse um front de defesa, Aveline Mars não é muito de conversa, comportamento típico dos antigos marcianos. Aos 25 anos de idade, recebe essa responsabilidade com louvor. Assim como do Dr. Lunn Aodh, ela também passou a infância entre os sofisticados equipamentos e conhece cada estrela que circunda os céus de Ruĝo.
     Aveline foi além do seu tradicional silêncio e timidez que lhe emprestam um charme enigmático, somado a sua beleza desprovida de vaidades exageradas. Como não poderia deixar de ser para os que nascem no Planeta Vermelho, ela é um Mars, título que a identifica como uma militar. Foi treinada para o uso de armas e artes marciais. Devido a sua experiência empírica comprovada, não precisou ser ensinada em comunicações e apenas aperfeiçoada nas ciências físicas e matemáticas em que é mestra.
     Aveline trabalha com uma amiga chamada Aurora Mi, 28 anos, uma humarante sapiens que já está há quatro anos com os vermelhos. Seu planeta natal é Coroni, que se localiza na fronteira leste da galáxia. A sua população é formada de uma ordeira sociedade de agricultores. O planeta possui um clima estável com terras férteis. Os coronianos são trabalhadores alegres e orgulhosos dos seus filhos que decidem ficar no planeta seguindo a tradição dos seus pais e, saudosos daqueles que atenderam o chamado de outras vocações e vivem em outros mundos.
     Aurora sente muita falta da família. Estava decidida em voltar para o planeta natal quando recebeu o convite de Aveline para trabalhar com ela. Conhece a solidão e disciplina rotineira que é reservado aos que trabalham nas estações de fronteiras. Aurora ficou feliz pelo convite de Aveline, só não sabia como se relacionar com uma brilhante profissional e colega de trabalho, que ao contrário dela, fala pouco.
- Trouxe chá – disse Aurora entregando um copo para Aveline que acaba de acordar para assumir seu turno.
- Dankon (Obrigada).
- Está do jeito que você gosta, bem forte.
- Está muito bom.
- Sua face está bem relaxada, o descanso lhe fez bem.
    Aveline pergunta as horas e uma voz computadorizada responde. Ela não acredita:
- Não entendo...acho que estamos com alguma falha no despertador.
- Não temos falha amiga, eu desativei.
- Mas por que?
- Você estava muita exausta, deixei você dormir mais um pouco.
- Obrigada, mas não deveria fazer isso. Nossos horários são programados e precisamos manter nosso ritmo biológico.
- Aveline, não se preocupe, está tudo bem. Apenas compensei o tempo de 2 horas a mais que você ficou de vigília.
- Não posso lhe culpar.
- Você passou do seu horário e não é primeira vez.
- Mas você passou do seu tempo de repouso e agora? Como ficamos? Você também vai dormir mais?
- Só um pouco, quero lhe acompanhar mais tarde na transmissão de chegada do Sankta Spirito.
- Sankta Spirito?
- Sim Aveline. O cruzador chega em 4 horas. Descansarei um pouco e te encontro na célula.
- Tudo bem – Aveline olha nos olhos de Aurora e começa a sorrir.
- O que foi?
- O Sankta Spirito tem realizado paradas regulares por aqui.
- Você notou?
- Sim, principalmente o Comandante de Akash, que sempre faz questão de vir pessoalmente.
     Um pouco tímida, Aurora disfarça a conversa:
- Ele trás algumas encomendas de minha família.
- Muito gentil da parte dele – Aveline tenta ficar séria.
     As duas amigas não resistem e passam a sorrir juntas.
- Ele gosta de você.
- Também gosto dele, mas como amigo.
- Vocês poderiam trabalhar juntos no Sankta Spirito. Já pensou?
- Aquele cruzador é um sonho. Poderia ver minha família muitas vezes.
- Então?
- Mas o meu coração não acendeu para ele.
- Não vejo nada de errado com ele.
- Ele é perfeito! Acho que esse é o problema. Já lidamos demais com precisões e perfeições aqui, não precisaria agora de um marido perfeito.
- Temos perfeitos imperfeitos aqui em Ruĝo se preferir.
- Mas são muito apegados ao planeta e o seu trabalho é a sua diversão.
     Aveline faz uma careta que desaprova o comentário.
- Desculpa. Não queria ofender.
- Não ofendeu amiga – Aveline segura a mão de Aurora e se levanta da cama.
- Sabe Aveline, eu sou feliz aqui e não consigo imaginar fazendo outra coisa, mas não queria criar falsas esperanças para alguém e, além do mais, é preciso sentimento.
      Ainda vestindo um uniforme de trabalho, Aveline escuta com paciência o desabafo da amiga como se estivesse recompensando pelas horas a mais de descanso que sua colega proporcionou desligando o despertador.
     Mas na verdade, Aveline entende e concorda com Aurora. Nada em Áxis é mais importante que o seu trabalho, é até mais importante que a própria família. Monitorar as fronteiras, os sinais e as possibilidades de improváveis ataques inimigos é algo que nunca se pode descuidar. Os recursos tecnológicos para esse trabalho estão sendo sempre aperfeiçoados e testados. Fazer parte disso é uma experiência fantástica, pois não há solidão para aqueles cujo trabalho é escutar o universo. Aveline tem orgulho do que faz e mais do que escutar universo, apesar de ninguém comentar sobre o assunto, existe a grande expectativa de localizar um sinal do Deus Áxis, um co-criador e guia dos humarantes.
- Você já se interessou por alguém?
- Meu coração ainda não brilhou – sorrir Aveline, que se despede da amiga para assumir seu turno.
     A célula de observação de uma estação é algo de extraordinário, sua estrutura é muito parecida com os antigos planetários da Terra. Localizar e escutar o universo com tantos recursos tecnológicos facilita explorar e identificar qualquer movimento a centenas de anos luz. Todos os sinais das quatro estações na Galáxia de Áxis estão sincronizados, permitindo assim uma riqueza de detalhes das imagens de cada astro ou objeto não identificado no espaço.
     Aveline senta numa confortável poltrona que parece flutuar no ar e tudo acende ao seu redor quando ela toca sua mão numa estrutura de cristal que está no fim do braço da cadeira. A uma voz eletrônica avisa da atualização dos últimos protocolos e confirma a chegada do Cruzador Sankta Spirito, no horário indicado por Aurora.
     As Estação Fronteiras, são bases de monitoramentos, observação e escutas do universo. São instaladas em asteróides com poucos quilômetros de extensão e que possuam órbitas regulares e estáveis. As estações estão adaptadas para oferecer o máximo de conforto e qualidade de vida para os seus tripulantes. Em cada quadrante da Galáxia de Áxis, estão espalhados milhares de satélites que auxiliam as estações com potentes lentes e antenas. Cada satélite possui um sofisticado banco de dados e coletas que analisa com precisão em seu campo de orbitagem. Esses dados filtrados nos satélites podem ser aperfeiçoados nas estações de fronteiras gerando novas perspectivas de informações.
     Após sincronizar as informações solicitadas pela Estação Fonteira Sul, Aveline encontra uma equação matemática codificada e infiltrada no sinal. Ela conclui a charada e identifica a assinatura de uma mensagem secreta do Dr. Lunn em antigo dialeto marciano, dizendo: “Não acionei protocolo de registro para esse outro sinal. Preciso da sua opnião”.
     Aveline acessa os dados usando uma rede privada e segura.
- São dois sinais? – fala ela em voz baixa e curiosa.
     Durante horas, Aveline gera milhares de calculos no computador da estação para entender o mistério do segundo sinal, não mais importante e preocupante que o primeiro, já identificado e pronto para ser compartilhado com as demais estações, chegando ao conhecimento da sede da federação. O primeiro sinal, é referente ao som emitido por um buraco negro que ainda não tinha sido registrado. O computador informa resultados não conclusivos com o pacote de dados que foi enviado pelo Dr. Lunn que se refere ao segundo sinal, no entanto, indica a presença de rastros de partículas fotônicas e uma grande quantidade de neutrinos na órbita do Planeta Gir. Essas duas combinações são comuns quando ocorre um evento de uma batalha e movimentação de naves com capacidade de hipervelocidades. Acontece que nada foi detectado pela estações, principalmente a Estação Sul, a mais próxima do planeta.
     Aveline recebe outra mensagem codificada: “Tenho captado outros sinais estranhos, talvéz juntos possamos decifrar. Consiga permissão para vir aqui”. Aveline responde também com sinal codificado: “ Mas como vou fazer isso agora? Não posso deixar minha parceira!” Dr. Lunn responde: “Em alguns minutos você poderá responder ao Comandante Akash, a próxima parada do Sankta Spirito será aqui na Estação Sul”
     Um sinal eletrônico na estação é ativado, informando a saída de uma nave da hipervelocidade, próximo ao asteróide da estação. Aveline não se deu conta do tempo em que ficou distraída na tentativa de entender o segundo sinal misterioso. Quando vai tentar responder para o Dr. Lunn, toma um susto com o toque de Aurora em seu ombro:
- Desculpa amiga, não queria te assustar.
- Tudo bem. Só estava concentrada.
- Do que se trata?
-Uma mensagem da Estação Sul – responde Aveline, cancelando discretamente o contato com o Dr. Lunn.
     Aurora olha no terminal o relatório de sincronismo.
- Mais um buraco negro para o nosso catálogo? Por isso você ficou tão concentrada. Tem fascinação por singularidades e já tem um relatório bem adiantado.
- Na verdade, considero minha especialidade.
- Conheço esse olhar Aveline, não está pensando em...
- Aurora. Preciso que você complete o relatório para a federação com os dados da Estação Sul.
- Você começou tão bem, é sua especialidade, por que não termina?
- Não tenho dados suficientes, usarei outro terminal no laboratório e farei um relatório complementar.
     A voz do Comandante Akash interrompe a conversa:
- Saudações estação!
- O Sankta Spirito chegou – disse Aurora.
- E não veio sozinho. Um certo comandante veio junto.
- Lá vem você de novo Aveline! – sussurra Aurora - Comandante Akash seja bem-vindo a Stacio Limo Nordo. Aguardando instruções.
- Obrigado Aurora. Temos algumas novidades por aqui. Recebemos uma solicitação da Estação Sul de convidar e conduzir a Tenente Aveline para compartilhamento direto. Caso ela aceite, tem uma hora para embarcar.
        Aurora balança negativamente com a cabeça para Aveline não aceitar.
- Aceito o convite senhor e sempre estou de malas prontas.
- Já imaginei isso tenente.
- Aurora. Preciso ir até a Estação Sul e descobrir mais sobre isso com Lunn.
- Vou ficar aqui sozinha?
     Aveline retoma o contato com o comandante:
- Imagino que o senhor deve ter providenciado companhia para Aurora.
- Sem dúvida que sim, as duas devem vir para o Sankta Spirito.
- Não entendemos senhor.
- Explico. O Embaixador Novik do Planeta Coroni, ficou sabendo da situação e autorizou férias para Aurora. Ela ficará um tempo com a família.
- O que? – Aurora não acredita no que ouve.
- O cruzador a deixará em casa. Dois técnicos de Rugo já estão a caminho, chegaram em poucos minutos.
     Um sinal eletrônico solicita a abertura de hangar para aterrissagem da nave de apoio, enquanto outro sinal informa a chegada de uma pequena nave do Planeta Rugo saindo da hipervelocidade.
- Bem movimentado por aqui hoje?
- Capitão Adani. Seja bem-vindo – responde Aveline.
- Trouxemos reforços para a estação.
- Pode descer no hangar 2 capitão.
     O Capitão Adani Mars olha para seu companheiro de viagem.
- Enquanto estamos chegando, elas estão saindo. Parece que não temos sorte.
- Já estou convencido disso – comenta o Tenente Lido Mars – Agora vai demorar em vê-las de novo.
- Mas não perdi as esperanças tenente.
     Aurora olha para Aveline e comenta com humor:
- Um certo capitão também está chegando na estação.
- Quem?
- Você nunca desconfiou do jeito que o capitão olha para você?
- Sinceramente, não. Mas observei que o Tenente Lido tem o hábito de seguir seus passos.
- Lido? Você anda vendo demais Aveline!
- Sei.
- Foi tudo tão rápido? – disse Aurora.
- O que foi rápido?
- Essas decisões? A sua ida para a Estação Sul, minhas férias com a família, a nossa substituição?
- Não achei. Somos treinados para sermos eficientes.
- Você acha que Akash articulou tudo?
- Acho que não, ele não teria motivos – responde Aveline tentando ficar séria. Aurora não resiste ao ver o esforço da amiga e ambas compartilham um sorriso.  
     A cumplicidade permite a sinceridade da amizade:
- Vamos Aurora, dê uma chance para ele. Não há nada de errado em pelo menos ouvir o que ele tem a dizer. Sua resistência não faz sentido. Não tenha medo de se apaixonar.
- E o capitão? – pergunta Aurora.
- Gosto dele sim, como amigo. Tivemos poucas oportunidades em Rugo de conversar sobre sentimentos. Mas se eu tivesse metade do que você sente e não quer admitir por Akash, eu não o evitaria tanto.
- Nossa! Sempre quis conhecer o Sankta Spirito. É uma nave linda não é?
- Sim. E misteriosa – comenta Aveline – Existem compartimentos não revelados no passeio virtual de conhecimento.
- Você acha?
- Desconfio que sim. Os próprios Planetas Colônia e Oceano são envolvidos em mistérios, foram poucos os humarantes que lá estiveram de verdade.
- O Planeta Colônia é um local sagrado e a casa dos Mestres da Luz, é natural que tenha suas regras e seus mistérios, mas sinceramente, não tenho curiosidade deles – revela Aurora.
- Pois ao contrário de você, eu tenho uma vocação e atração por mistérios.
- Quem sabe você não encontra alguns mistérios na Estação Sul.
- Desconfio que vamos encontrar sim. Lunn não faria um pedido de compartilhamento direto se não considerasse importante. Ele é muito intuitivo e um dos melhores no que faz.
     Aveline e Aurora estão descontraídas e felizes com os recentes acontecimentos. Vivendo e trabalhando numa estação de fronteira durante meses, faz de qualquer evento uma grandiosa quebra de rotina. Aveline se mantém equilibrada para não demonstrar a sua ansiedade em saber o que o Dr. Lunn descobriu.
     A prática de enviar mensagens sem uso de protocolos entre as estações não é considerado contra as regras, simplesmente não é muito usual, no entanto seria violar o direito de cada um de ter acesso as suas comunicações pessoais. Os relatórios enviados pelas estações são extremamente específicas, conclusivas, prontas e inquestionáveis. O fato de Aveline não compartilhar a informação enviada pelo Dr. Lunn, se deve em circunstâncias que ela mesma nunca pensou em fazer. Conhecendo seu amigo, ela sabe que o Dr. Lunn não enviaria uma complexa mensagem que poderia passar despercebido como uma falha na filtragem de dados, provocada pelo atraso de ajustes orbitais. Aveline, assim como o Dr. Lunn, pretendem informar a federação o que observaram e suspeitaram, mas antes, precisam ter certeza, pois não querem que suas reputações sejam questionadas. Alguns médicos da federação já identificaram alguns males relacionados à excessiva permanência e solidão nas estações de fronteiras, um deles estaria relacionado a vestígios de sinais inimigos que invadiram os domínios da galáxia. A mobilização militar nessas áreas tornou-se tão rotineiras e desgastantes que foram necessários aplicar novos parâmetros de análises, fazendo com que os técnicos das estações fossem mais comedidos nas informações de seus relatórios. No caso da Tenente Aveline e Dr. Lunn, pode-se considerar uma exceção, pois ambos foram criados nesse ambiente e certamente sabem a diferença entre ilusão de ótica e realidade.
     A possibilidade de rever a sua família e amigos no seu planeta natal, desperta em Aurora um sentimento de grande alegria. Além do mais, chegará em grande estilo, a bordo da mais bela nave da federação. A resistência de Aurora em ceder aos bons sentimentos do Comandante Akash, se deve ao fato de que sua prima Nida Cenina, assessora do Embaixador Novik, havia lhe confessado seu interesse pelo comandante. Sabendo que as suas funções na estação e em Rugo seriam incompatíveis com os interesses do comandante e, para não ferir as expectativas da sua amada prima, Aurora sempre evitou a possibilidade se sentir-se culpada em atrapalhar seus planos amorosos. O Comandante Akash sempre demonstrou interesse por Aurora, apesar de desconfiar dos olhares meigos e apaixonados de Nida. A menor possibilidade de que o Sankta Spirito passe pelo quadrante onde se encontra a Estação Norte, o comandante sempre encontra um justo motivo de lá chegar, mesmo que rapidamente, apenas para ver Aurora e deixar seus agrados, na maioria das vezes, produtos cultivados por sua família em Coroni.
     O Comandante Akash aguarda a apresentação e troca de funções na estação. Aveline se retira da célula de avistamentos e, se encontra com o Capitão Adani e o Tenente Lido que ficarão provisoriamente na estação até o retorno de Aveline, que geralmente é de poucas semanas.
- Então capitão! Seja mais uma vez bem-vindo a estação – disse Aveline, com uma saudação militar.
- Dankon
     O capitão responde a continência e desabafa.
- Estou começando a me acostumar nessa estação, mas fica muito solitária sem a presença de vocês.
     Aveline olha para Aurora para saber se ela captou o interesse dos dois oficiais. Como se fosse duas telepáticas, Aurora tenta disfarçar as faces vermelhas e se controla para não sorrir. Para disfarçar, ela se vira numa pequena dispensa e apanha alguns copos, enchendo-os com sucos e sugerindo um brinde:
- Se me permite senhor! Um brinde de agradecimento a tão gentis palavras – Aurora não olha para Aveline por que iria estragar tudo e criar um constrangimento.
     O capitão e o tenente aceitam os gestos das belas colegas e Aveline percebendo a situação de Aurora, sugere para que ela confira suas malas.
- Bem lembrado, farei isso – Aurora se retira e o Tenente Lido se oferece para ajudar.
     O capitão olha para Aveline e ergue o copo num brinde:
- Pretende ficar muito tempo fora?
- Acredito que desta vez passe pelo menos quatro semanas. Espero que não esteja fora das suas possibilidades, sinto-me segura quando a estação está em suas mãos.
     O capitão respira fundo pronto para desabafar o coração, mas Aveline foi mais rápida.
- Sabe que lhe tenho muita estima e admiração e ficaria muito feliz que numa próxima folga pudéssemos conversar mais sobre outros assuntos.
     O capitão discretamente adianta um passo, olha para trás se certificando de que estão a sós:
- Eu adoraria tenente. Seu trabalho nessa estação é de fundamental importância e amplamente reconhecido pela federação. O povo de Rugo sempre cita seu nome com muito orgulho.
- Apenas faço o meu trabalho, todos são muito bons em Rugo no que sabem fazer de melhor.
     Um pequeno silêncio envolve os dois:
- Aveline, acredito que você já percebeu que...
      Aveline põem suavemente a mão nos lábios de Adani. Seu olhar é doce e sincero, mas sua expressão é bem convincente.
- Não precisa dizer, conheço seus sentimentos e lhe garanto que muito me agrada
     O Capitão Adani segura a mão dela:
- Você já pensou na possibilidade?
- Sim, claro que pensei. Você acha que aqui nesse asteróide não há tempo de pensar em nossas próprias vidas? No amor?
     O capitão esboça um sorriso.
- Parece que a vida aqui lhe deixa mais bonita.
     Aveline fica alguns segundos olhando Adani e pensando que seria feliz com ele, mas seus sentimentos só tem espaço para uma grande amizade. Ela se afasta um pouco e olha para um monitor na parede e observa Aurora com duas pequenas mochilas e o Tenente Lido checando a nave de apoio da estação. O capitão se aproxima e olha para uma janela:
- Estava com saudades daqui. Tem a sua presença, mesmo quando está ausente.
     Aveline se aproxima do capitão e, face a face com ele, dá um beijo suave em seu rosto.
- Sei que antes de qualquer coisa, somos grandes amigos Adani.
- Eu sei. Desde que te vi pela primeira vez na escola de instrução pensei: Essa garota vai ser minha grande amiga!
     Aveline sorrir.
- Sou muito grata a você por tudo. Ter seu apoio e paciência foi...
     Adani retribui o gesto e põem as pontas dos dedos nos lábios de Aveline:
- Tudo o que tem na sua vida foi conquistado com seus méritos sabe disso. Sou muito feliz em ser seu amigo, mas faço uma exigência! Quero ser o melhor amigo.
     Aveline brincando faz um movimento de que está pensando no assunto:
- Pode ser! Já tenho uma melhor amiga, falta um melhor amigo!
- Faltava, agora você já tem – responde Adani, que observa o monitor e ver Lido e Aurora na nave principal retirando alguns equipamentos.
- Trouxe novos brinquedos?
- Na verdade é uma arma. Da última vez notamos que não existem por aqui.
- Não achei necessário, aqui é uma simples estação de comunicação e pesquisa.
- Tudo bem, mas enquanto eu estiver tomando conta desta preciosidade quero boas companhias. Um antigo hábito marciano.
- Entendo. Existe um compartimento de tiro lá em baixo caso precise testá-la.
- Já testamos. São para uso externo. Falando nisso, os trajes estão em ordens?
- Estão novos. Nunca usamos, as antenas estão sempre funcionando e quando necessário, recolhemos a estação inteira para o solo.
- Vou precisar ir lá fora fixar esses equipamentos. Trouxemos cargas extras e potentes para os propulsores externos.
     Aveline não acha estranho o excesso de preocupação do Capitão Adani com os procedimentos de defesa, pois é bem típico do povo de Rugo. Mas seria a primeira vez que se faz isso numa estação de fronteira.
- Está esperando uma guerra? – pergunta Aveline, curiosa.
     O capitão procura em outro monitor o mapeamento do asteróide, localizando os melhores pontos e fica satisfeito com o que encontra.
- Perfeito, já tenho os pontos certos. E respondendo a sua pergunta tenente, não gosto da forma que alguns médicos da federação concluem os diagnósticos dos observadores.
- Nunca tivemos problema nessa estação.
- Sei disso. Vocês são muito comedidos nas informações. Mas os demais que trabalham nas outras estações captaram alguma coisa e isso deveria ser levado em consideração.
- Não seja injusto capitão. Claro que eles levaram em consideração, acontece que existem alguns fenômenos na massa escura que podem passar como miragens, alguns raros reflexos de luz em gases e até em vapores de água, a nossa galáxia é rica desses componentes. Nós mesmos já observamos algumas vezes.
- Acredito em tudo isso, mas não vou hesitar em atirar nelas se nossas vidas dependerem disso. Além do mais, que mal faz atirar em miragens?
     Aveline balança a cabeça negativamente e sorrindo:
- Como quiser capitão.
     Uma mensagem do Cruzador Sankta Spirito é escutada no sistema de áudio interno solicitando o embarque.
- Precisamos ir.
     O capitão fica de frente com Aveline com as duas mãos pousadas em seus ombros.
- Faça uma boa viagem amiga.
- Obrigado amigo. Cuide de minha estação!
     Ambos se despedem com um abraço.
- O Tenente Lido levará vocês até o cruzador e...
     Antes mesmo de concluir a frase, o capitão observa o corpo de Aveline se tornando transparente e evaporando no ar. Ela ainda tem tempo de dar um rápido aceno com a mão.
- Sankta Spirito! – Diz o capitão olhando para cima – Ainda não me acostumei com isso.
     O capitão olha para o monitor e ver o tenente olhando para o vídeo gesticulando com os braços abertos. Ele ainda queria ter breves momentos com Aurora que também foi tele transportada.
     Sem perder tempo, o Capitão Adani avisa para o tenente que vai usar os trajes e instalar os equipamentos em pontos estratégicos do asteróide.
     Horas depois, os dois oficiais completam os sincronismos dos aparelhos que são mastros de 10 metros com esferas nas pontas, alimentadas por cilindros nucleares fixados na base.
     O Tenente Lido entra na célula de observação, senta na cadeira e inicia as transmissões de protocolo, comunicando a federação e outras estações de fronteiras que a estação norte realizou a troca provisória de equipe.
     O Capitão Adani continua na ponte revendo os dados de monitoramento deixado por Aveline e busca nos arquivos por informações referentes às miragens. Tem acesso ao arquivo privado, mas encontra uma senha:
- Não acredito! Senha? Por que ela colocaria uma senha exatamente nos arquivos de análises das miragens?
     O capitão fica alguns minutos olhando para a janela de senha do monitor imaginando qual seria. E mesmo a contragosto, digita de primeira tentativa o nome AMIGO e imediatamente surgi um vídeo de Aveline:
- Olá amigo. Desculpe a senha. Sabemos que os bons amigos não têm segredos, por isso se conhecem bem e, suas ações são previsíveis. Não pude deixar de perceber que da última vez você tentou achar essas anotações, mas eu ainda não havia registrado. São anotações pessoais das miragens e não foram protocoladas. Não queríamos passar pelas avaliações dos médicos da federação. Espero que o amigo não corra esse risco.
     O vídeo encerra. O capitão passa a mão sobe os cabelos e sorrir:
- Aveline...Aveline!
     O capitão localiza os arquivos deixados pela tenente onde estão as coordenadas dos pontos onde foram vistos as miragens. Ele gera um arquivo e transfere para a célula de observação, onde o amigo sem perguntas orienta as antenas para elas.
- É miragem que eles querem? É miragem que eles terão! – disse o capitão, que com um simples toque num teclado de luz, faz os mastros espalhados na área externa liberar gases e faíscas elétricas, fazendo em poucos segundos todo o asteróide desaparecer.
     O Tenente Lido confirma:
- Estamos invisíveis!
- Pode desligar! Ponha o alarme de luz no perímetro avançado e fique no primeiro turno. Qualquer alteração me chame. Se eu estiver certo e com um pouco de sorte vou desvendar esse mistério! – disse o capitão, desconfiado de que as miragens sejam outras coisas.
Capítulo 5

SANKTA SPIRITO
(Espírito Santo)

     O teletransporte de Aveline e Aurora para o Cruzador Sankta Spirito é concluído. As duas amigas estão visivelmente surpresas de como uma ação real pode se parecer com uma virtual. A tecnologia que consegue desfragmentar cada molécula da matéria e conduzi-la para outro ponto determinado é uma experiência incomum para a grande maioria dos humarantes. No início, sente-se um pequeno formigamento no corpo provocado por uma leve estática, seguido de um rápido frio intenso que se dissipa em milésimos de segundos, onde os olhos do transportado apenas percebem uma sobreposição de imagens do lugar que está saindo para onde está chegando. Na primeira vez é sempre estranho e confuso, mas depois é sempre reconfortante e divertido.
- Isso é simplesmente incrível! – alegra-se Aurora - Você está bem?
- Estou ótima! Realmente é uma viagem estranha.
     Aveline olha para o seu redor deslumbrada com as paredes e o teto imaculadamente brancos e brilhantes do interior da nave.
- Olhe Aurora, o asteróide e a estação. Estão manobrando a nave – aponta Aveline para um deque transparente.
     Uma nota longa de um som grave, semelhante a uma buzina de navio, é escutada em toda nave. É emitido sempre para chamar a atenção da tripulação e passageiros de que o cruzador está entrando ou saindo da hipervelocidade. Algumas vezes é utilizado para anunciar sua presença quando chega aos céus de algum planeta da federação.  
     O deque se ilumina, Aurora e Aveline só conseguem enxergar luzes difusas no exterior da nave.
- Sejam bem-vindas – disse o Comandante Akash.
- Dankon – responde as duas, quase ao mesmo tempo.
     O comandante sobe na plataforma circular e gentilmente ajuda com as mochilas das convidadas e as entrega aos cuidados de um soldado. Ele segura na mão de Aurora e acompanha na descida de um baixo e único degrau.
- Muita gentileza comandante.
- Nedankinde – responde o comandante – O Soldado Lear mostrará seus aposentos, aconselho que vocês descansem um pouco. Daqui a 6 horas nos encontraremos.
- Algo em especial comandante? – pergunta Aveline.
- A presença de novos passageiros nesta nave é sempre um momento especial tenente. Vamos nos reunir num jantar no deque superior. Temos outros passageiros que gostaria de apresentá-las.
     Aurora fica um pouco desconfortável com o anúncio do jantar:
- Será uma honra, apesar de geralmente não trazermos roupas adequadas para essas ocasiões.
- Não se preocupem com vestimentas, temos uma rouparia de ocasião. Vocês podem acessar no terminal de seus aposentos e escolher o que lhe agradar. 
     O comandante olha para o soldado, e este mostra o caminho a ser seguido. Eles entram num elevador panorâmico que após subir alguns metros, entra na parede e vai deslizando e parando na porta de cada aposento. Aveline é a primeira a ficar:
- Tenha uma boa estada tenente – deseja o soldado.
- Dankon.
     Antes do elevador subir, ela recebe um aceno lento de Aurora.
- Ĝis!Aveline retribui o aceno, sem muita empolgação.
     Aurora está entusiasmada com as acomadações. Assim que entra, ele escuta uma suave voz feminina dando as boas vindas com o sotaque típico dos povos do seu planeta natal, indicando o local de armário, de banho, a luminosidade, alimentos e outras coisas que ela já sabia, quando conheceu a nave numa situação virtual.
- Incrível! Pessoalmente é muito melhor. Esse perfume quase imperceptível relaxa e dá uma sensação de paz.
     Aurora deita na cama e adormece.
     Enquanto isso, Aveline aproveita para tomar um banho de vapor floral e escolher uma roupa militar mais adequada, algo diferente dos macacões vermelhos tradicionais usados na estação. Ela aciona um display que projeta uma imagem em três dimensões e sem muito interesse, começa a pesquisar alguns modelos de roupa. Toda vez que ela acha uma peça interessante, separa com a mão para outro campo holográfico e a uma imagem igual a dela surge no quarto, girando lentamente, como uma modelo virtual.
- Acho que este serve. Combina com a cor da nave – pensa Aveline. Escolhendo um macacão branco.
     Aveline solicita a roupa e em poucos segundos, os objetos se materializam  num nicho transparente na parede, acompanhado de um par de sapatos, meias leves e alguns adornos opcionais
- Isso é que é rapidez!
     Ela veste a roupa, penteia os cabelos curtos e usa alguns dos produtos e adornos sugeridos e, ao se afastar da parede, seu reflexo de espelho desaparece.   
     Sente fome e abre um compartimento retirando uma rugônia, fruta típica de Rugo, uma das raras cultivadas no planeta por sistema hidropônico. A fruta tem textura e consistência semelhante a uma maça e seu sabor é uma mistura que se aproxima da pêra com a refrescância de uma hortelã.
     Ela se dirige para uma mesa e senta-se numa confortável cadeira. Ela aciona em display luninoso de informações. Sem perder tempo, se conecta com a Estação Fronteira Sul. Um sinal eletrônico é emitido com a saída de uma pequena esfera de luz que flutua, se desloca e se expande ao tocar o chão. Uma perfeita imagem do Dr. Lunn aparece.
- Como vai Aveline?
- Olá Lunn. Já estou no Sankta Spirito.
- Que bom, estou acompanhando vocês daqui.
- A rapidez desta nave é sempre algo interessante de acompanhar.
- Isso é verdade.
- Temos escala? – pergunta Aveline.
- O comandante tem instruções de seguir direto para cá. Tem uma passageira ilustre entre vocês.
     Aveline dá uma mordida na fruta e dobra uma perna na cadeira e fica bem relaxada:
- Não me diga que é Aurora?
- Mais ilustre um pouco.
- Não faço idéia, algum embaixador?
- Mei.
     Aveline dá outra vigorosa mordida na fruta.
- Olha só! Uma celebridade entre nós – Sorrir.
- Ela está acompanhada de seu antigo instrutor e adivinhe do que mais? –  
     Desafia Dr. Lunn.
- Pela sua cara de felicidade, só pode ser um médico.
- Acertou! Você é muito esperta.
- Não foi difícil, agora me fale uma boa notícia.
- Essa é a boa notícia. A má notícia é que eles vão ficar aqui com a gente por um tempo.
     Aveline tira o pé da cadeira e se aproxima lentamente da imagem:
- Você está brincando não é Lunn?
- Pura verdade! Mas fique tranqüila. Será por poucas semanas.
- Poucas semanas? – Aveline ergue a sobrancelha – Poucas semanas foram tudo o que consegui de tempo para ficar na sua estação e vou retornar em outra nave militar que com certeza não será o Sankta Spirito.
- Agradeço em atender o meu pedido Aveline! Não lhe chamaria se não fosse urgente.
- Não estou acostumada com muita gente na estação, principalmente envolvendo pesquisa de compartilhamento direto, não é nada pessoal, apenas metódico, compromete a nossa concentração – desabafa Aveline.
- Sei como se sente, penso da mesma forma. Mas entenda, não tive como evitar, não poderia esperar que eles fossem embora – responde o Dr. Lunn com habitual tranquilidade – Recusei minha temporada de férias assim que tive contato com os primeiros registros.
- Desde quando você tira férias? – Aveline ironiza com humor.
- Tenho programas virtuais de pescarias por aqui e assisto alguns jogos da federação.
- Muito divertido!
- Você sabe que me considero seu melhor amigo e faria de tudo para deixar as condições favoráveis para o nosso trabalho, mas foi um pedido do General Meadhas, não poderia recusar.
     Quando o Dr. Lunn falou que se considera seu melhor amigo, o pensamento de Aveline se voltou para a Estação Norte. Lembrou do último encontro que teve com o Capitão Adani.
- O que eles estão aprontando na minha estação? – fala sozinha e com voz baixa.
- O que disse?
     Aveline improvisa uma resposta:
- Mei e seus amigos sempre serão bem vindos em todas as Estações de Fronteiras que quiserem conhecer e você é sim, um dos meus melhores amigos.
- Acredito nisso, só não me coloque na sua famosa lista, ficarei em desvantagem alfabética – sorrir
     Aveline retribui:
- Não seja bobo. Agora quero saber se aqueles registros que você mencionou estão sendo compilados?
- Já está tudo pronto, esperando apenas você chegar. Antes que eu me esqueça, você está muito bonita, vai para um encontro?
- Encontro? Lunn! Até você!
     O Dr. Lunn se deixa levar numa curta gargalhada, ele sabe que os assuntos relacionados ao amor provocam timidez em Aveline.
- Por que não? Não vejo a hora de conhecer o sortudo que vai domar esse coração.
- Encarcerado nessa estação? Acho muito difícil de você conhecer.
- Como queira amiga. Aproveite a mordomia do Sankta Spirito, nos veremos em 72 horas.
     Aveline se despede do Dr. Lunn e aproveita as horas restantes para caminhar pelas dependências da nave. Está acostumada a dormir pouco e está ansiosa em chegar à Estação Sul. Pensou em chamar Aurora para acompanhá-la, mas imaginava que ela estaria ocupada escolhendo roupas para o jantar.
     Quando fez a sua viagem virtual pelo Sankta Spirito, Aveline gostou muito de um lugar em especial. Trata-se de um jardim bastante acolhedor, com fontes coloridas, sons da natureza e alguns hologramas de pássaros e insetos. Seria um ambiente perfeito para relaxar a sua mente, até o momento de retornar aos aposentos e aguardar o chamado do comandante.
     Aveline encontra um ambiente ideal e solitário numa área do jardim. Ela se senta e encosta-se num banco, esticando as pernas, de frente para um pequeno lago. Ela fecha os olhos e começar a meditar. Aos poucos vai se entregando naquela paz e relaxando continuamente. Pouco tempo depois, sua aguçada audição percebe passos sutis se aproximando, ela continua de olhos fechados enquanto uma jovem mulher se aproxima. Percebendo que estaria incomodando a meditação e privacidade de alguém, a mulher discretamente se retira, mas Aveline chama a sua atenção.
- Pode ficar Mei. Não está incomodando.
     Mei para e se vira, observando detalhadamente aquela mulher que ela seguramente, sabe que não lhe foi apresentada.
- Desculpe, parecia tão concentrada, não quis incomodar. Como sabia que era eu?
- Esta é uma nave militar com uma tripulação com muitos afazeres – fala Aveline, ainda com os olhos fechados – Além de mim e minha amiga que está nos seus aposentos, fiquei sabendo que tem mais dois homens e uma mulher.
- Mas existem outras mulheres aqui na nave, como poderia saber que seria eu?
- A tripulação de mulheres não usa florais aldeídos, extraída de flores naturais. Um sensível e delicado perfume que acredito ser um dos preferidos pelas mulheres que vivem em Urbo Kristalo. Uma cidade que possui os mais belos jardins da federação, onde as pessoas por hábito gostam de ficar recolhidas e, também onde esta nave foi construída.
     Mei fica tão impressionada e admirada pelos comentários de Aveline que se deixa sorrir ingenuamente, como uma criança que se diverte. Aquele som de sorriso tão atípico, captado pelos ouvidos de Aveline a faz abrir os olhos, virar a cabeça e conferir pessoalmente a presença de Mei.
     Aveline ainda se depara com um lindo sorriso de Mei, que vai sumindo como um belo por do sol e com dois radiantes olhos azuis que parecem resumir todos os mistérios do universo. Aveline pisca demoradamente os olhos como se quisesse despertar de um sonho.
- Você deve ser Aveline, acertei? – disse Mei, brincando com o jogo de interpretações.
     Aveline fica curiosa e com simpatia pergunta.
- Como pode saber?
- Você está usando trajes de visitantes, está apresentável para uma ocasião especial, mas se manteve fiel ao macacão, acredito que seja uma das roupas usadas por observadores da estação. Estava de olhos fechados e percebeu a minha presença. Mesmo relaxando, a sua audição e olfato estava em alertas, uma qualidade de uma militar que só poderia ter sido treinada em Rugo. E o fato de você não está em seus aposentos...Bem, você deve ter vindo para o jardim para acalmar a mente. Está envolvida com seus pensamentos e responsabilidades com a estação que comanda. E você é bem diferente do que o Comandante Akash descreveu do que poderia ser Aurora.
- Muito bem! Estou impressionada! Acertou em tudo – Aveline se levanta.
     As duas se aproximam e se abraçam:
- Prazer em conhecê-la Mei. Não posso dizer que nunca havia falado de você, pois não seria uma verdade.
- Prazer também em lhe conhecer Aveline.
     Ambas seguram as mãos da outra:

- Não sabia que era tão popular – sorrir Mei.

- É diferente – comenta Aveline – São poucas as crianças que nascem no Planeta Colônia e sou de um povo naturalmente curioso.
- Curiosos?
- Sim. Quer dizer, temos um padrão de civilização, um idioma e vários mundos na nossa galáxia. Mas sempre existem as variáveis. Algum povo mantém antigas tradições, surgem sotaques e interpretações culturais diferentes. Nascer, ser criada e educada na Cidade de Cristal deve ser uma experiência maravilhosa.
- Entendo o quer dizer. Acha que eu seria sincera em dizer que penso o mesmo do seu planeta? Da sua cultura e do seu jeito de falar e vestir?
- É por isso que está aqui?
- Em parte sim. Tive oportunidade de conviver com outras atividades, mas estar numa estação de fronteira sempre foi meu objetivo, para o desespero do meu pai.
- Ficar longe da popularidade?
Mei sorrir:
- Acredite, não sabia que era tão popular. E não se preocupe que não me considero a mais importante personalidade deste universo. Mas sempre desconfiei pelo excesso de zelo dos meus pais e amigos. Ser filha do general que comanda as forças de defesa da federação, por si só não justifica tantos cuidados. Não vejo perigo iminente de ter um cruzador me escoltando, um antigo e confiável instrutor e veja só! Um médico! – Mei põem a mão na cintura.
- Principalmente um médico – concorda Aveline com ironia.
- Não reclamo, por que sei que este zelo é sincero e amoroso. Mas meus amigos, filhos de pessoas ilustres de Cristal, não recebem os mesmos cuidados.
- Você está adulta e sente que lhe tratam como uma criança – comenta Aveline.
- Poderia pensar assim, mas não é. Meu pai tem muita paciência comigo e o dobro de preocupação. Acho que ele pensa como poderia proteger uma federação se não consegue controlar os impulsos de curiosidade da própria filha.
     Aveline sorrir concordando:
- Você é muito bonita, já tem namorado? – Aveline percebe que foi direta demais – Desculpe, não queria parecer inconveniente. Acho que meus modos devem ser muito rudes para você. Não temos vida social na estação para polir certas expressões.
- Se eu lhe responder, podemos tentar ser amigas? Você me contaria tudo sobre a estação?
     Aveline olha atentamente para Mei e percebe que não seria difícil ser sua amiga. A pergunta que ela considerou indiscreta para se fazer a alguém que conheceu há poucos minutos, já seria uma prova de que havia uma sintonia entre elas. Apesar da sua beleza e delicadeza, Mei é mais forte e determinada do que Aveline imaginava, inclusive com semelhanças de personalidade iguais a dela.
- Então você trocaria um pedido de desculpas por uma amizade?
- Há algum problema das duas virem juntas?
- Não – sorrir Aveline – Venha sentar-se aqui e vamos descobrir.
     Mei e Aveline iniciam uma longa e animada conversa.
     Em algum momento, Aveline tem a impressão de ter visto alguém caminhando do outro lado do jardim, um vulto transparente. Ela não dá muita atenção e conclui que deve ser um dos muitos efeitos holográficos do lugar.
      O tempo passa rápido, elas estão distraídas e envolvidas em seus assuntos que nem percebem que está próximo da hora do jantar de recepção.
- Nossa! Estamos atrasadas – disse Aveline.
- Nos encontramos no Jantar?
- Sim, claro! E você vai conhecer quem é na verdade, a maior celebridade desta nave – Aveline pega a mão de Mei e incentiva uma pequena corrida.
- Não vai ser difícil – Sorrir Mei – Aurora!
- Isso mesmo!
     Aveline e Mei se despedem. A tenente vai direto para os aposentos de Aurora. Ao parar em frente à porta, uma mensagem de voz informa a Aurora que Aveline solicita vê-la.
- Entre! – fala Aurora, ainda terminando de por um par de brincos.
     A porta desmaterializa em luz:
- Aveline! Peguei no sono e quase perdi a hora e...
- Desculpa! Entrei no quarto errado – Aveline se retira ensaiando uma brincadeira.
- Ei! Sou eu! Então? Estou bem?
     Aveline volta, olha para Aurora da cabeça aos pés:
- Não te reconheci. Você está muito bem com esse vestido. Onde você descobriu?
     Aurora veste um salwar kameez branco com listas lilás e discretos adornos.
- Você não imagina o que tem nesses registros! É uma roupa indiana de Tero Unua, não é linda! Não sei como eles fazem isso!
- Estou impressionada! Aliás, hoje parece que as pessoas resolveram me impressionar – disse Aveline, conferindo seu macacão branco num espelho.
- Não entendi.
- Ah! Não é nada. Depois te conto. E eu? Como estou?
- Avançamos muito com esse macacão branco. Você fica bonita de todo jeito Aveline.
- Amigas não metem viu?
- Não se preocupe, está apresentável, acho que eu que exagerei.
     Aveline se aproxima da amiga:
- Você está incrível! Aproveite a ocasião.
- Você deveria experimentar.
- Quem sabe em outra ocasião.
     Uma voz feminina avisa para Aveline e Aurora para se dirigirem para o deque inferior, o mesmo em que chegaram à nave.
     Elas acompanham os sinais luminosos no piso indicando o elevador. Ao chegar ao deque, o Soldado Lear está esperando e pede para elas subirem na plataforma, já imaginando o que iria acontecer.
- Existe outra forma de chegarmos ao nosso destino? – pergunta Aurora ao soldado.
- Sim, por uma via expressa, mas levaria mais tempo, a nave tem alguns quilômetros de extensão.
- Você não vai querer amassar sua roupa vai? – pergunta Aveline sussurrando no ouvido de Aurora. Ela responde negativamente meneando a cabeça.
- Então segura a minha mão e respira fundo!
     O soldador Lear se diverte com a situação esboçando um sorriso discreto. Ele se afasta da plataforma e as duas amigas são tele transportada para o outro lado da nave.
     Elas reaparecem em outra plataforma. O Comandante Akash as recepciona mais uma vez.
- Sejam bem-vindas – O comandante abre os braços com alegria, vestindo um traje militar de muito bom gosto. Ele não faz cerimônia em mais uma vez segurar a mão de Aurora, ajudando-a a descer da plataforma.
- Você está linda – sussurra em seu ouvido.
- Dankon. O senhor está muito elegante.
- Por favor, me chame de você.
     O esforço do comandante em ser discreto com a presença de Aurora é quase inútil. Toda tripulação da nave e outros lugares da federação sabem do amor que ele sente por Aurora. Não um amor declarado e confesso, mas um amor de atitudes que é observado e incentivado por todos. O Comandante Akash é muito querido na federação e nos mundos aliados. Ele é natural de Urbo e seu irmão Horus Abhaya, 65 anos, é o embaixador que representa o planeta. Dotado de uma rara habilidade diplomática, uma tradição em sua família, sempre teve um carisma, bom senso e espírito humanitário. Comandar um cruzador militar nunca fez parte das suas intenções. Tem na música seu passatempo predileto e coleciona artes plásticas de vários mundos que visita. Costumava auxiliar o irmão em minimizar conflitos em mundos não aliados e, numa destas situações, presenciou num encontro diplomático para dois povos inimigos que vivem no mesmo planeta. Houve o início de uma discussão e um confronto físico direto entre eles. Antes mesmo que a guarda de segurança agissem para debelar a briga dos alterados agressores, eles param de repente e se rendem a uma bela música que sai de um violino tocado pelo Akash Abhaya. Inebriados pelos acordes, eles se acalmam e dias depois conseguem se entender e aceitar a ajuda da federação. Alguns meses depois, vivendo em paz e sob uma só nação, os Iabiz fundaram a orquestra sinfônica de Opar e, se apresentaram no teatro da embaixada em Urbo. Nesta noite inesquecível, Akash teve uma especial participação com seu violino, sendo acompanhado por um coral infantil formado por vários povos da federação, inclusive a pequena Mei, nessa época, fazia parte do grupo. Eles cantavam a música Sankta Spirito Brilas (Espírito Santo brilhando).
     Os métodos de Akash não eram convencionais, mas funcionava como a liga que faltava para estreitar laços entre povos e mundos diversos. Organizou dezenas de exposições de obras de artes representando a cultura humarante e de outros seres que se aliavam a federação.
     Os engenheiros do Planedo Kolonjo criaram o maior, mais bonito e rápido cruzador intergaláctico da federação. Um símbolo de união, cujo objetivo era estreitar as distancia entre os povos de mundos aliados, oferecendo ajuda, transportando seus representantes e não rara às vezes, se fazer presente na atmosfera de planetas em festas comemorativas. Quando chegou o momento de substituir o comando do cruzador, o nome de Akash Abhaya foi unanimidade para comandar esta nave especial, cujo nome foi batizado de Sankta Spirito em homenagem a música célebre.
     O comandante segue acompanhado de Aurora e Aveline para a área próxima, reservada ao jantar. Lá os demais convidados já estão presentes: o Comandante Sarte Sigmar, Mei, Dareh, Yusuke.
- Senhores estas são as nossas outras convidadas, Aveline Mars e Aurora Mi da Estação de Fronteira Norte – apresenta o Comandante Akash.
     De início, apenas Dareh e Yusuke se levantam e cumprimentam Aveline e Aurora. Os demais já se conhecem e apenas acena com a cabeça. Mei vai em direção de Aurora.
- Prazer em conhecê-la Aurora.
- É um prazer e honra conhecê-la também Mei.
     Aveline se aproxima de Mei.
- Como vai? Há quanto tempo? – brinca Aveline. Aurora acha estranho a intimidade da amiga para com Mei.
- Tenente! Como é bom revê-la! 
     Mei esclarece que já haviam se conhecido ocasionalmente no jardim.
     O Comandante Sarte Sigmar, Aurora e Aveline também já se conhecem devido à relação de trabalho entre eles. Todos se acomodam em suas cadeiras em volta de uma mesa, decorada com flores e frutas, o branco como sempre é a cor do ambiente. O Comandante Akash senta-se ao lado Aurora.
- Estou muito feliz com a presença de todos e espero que as suas estadas sejam bastante proveitosas, apesar de rápido. Normalmente, o nosso cardápio em bem simples, porem nutritivo. Em algumas ocasiões, respeitamos os hábitos alimentares de alguns povos e permitimos algumas exceções. O Dr. Yusuke além de conceituado médico é também um gastrônomo e nós pediu para que ele mesmo sugerisse, ou melhor, faria o nosso jantar, sem fugir é claro dos conceitos nutritivos.
     Risos.
- Espero que gostem – disse Yusuke.
- Eu conheço os dotes culinários de Yusuke e lhes garanto que continuaram vivos após prová-las.
     Outros risos.
- No mínimo morreram com suas papilas gustativas felizes.
     Yusuke devolve a brincadeira e o humor definitivamente se instala no ambiente.
- Mi estas ĉiomanĝanto (Eu como de tudo) – diz Comandante Sarte.
- O mais interessante desse jantar – continua o Comandante Akash – É que os ingredientes foram trazidos por ele. Apesar do formato da comida ser muito parecido com o que servimos na nave, estávamos desprovidos de alguns temperos não usuais.
     Mantendo o humor, Yusuke faz uma observação:
- Um toque especial, para um momento especial. Caso não gostem, fico feliz do comandante ter disponibilizado essas suculentas frutas, assim não correrão o risco de dormir com fome.
     Risos.
     O Comandante Akash toca na mesa e o jantar se materializa. Os olhares são de surpresa.
- Senhoras e senhores! Hoje teremos bolinhos de tsampa! Uma rara iguaria tibetana da cultura Tero Unua – disse Yusuke, de pé e se exibindo com estilo.
     Os convidados gostam da apresentação do prato e do aroma, sendo Dareh o mais satisfeito, pois é um dos preferidos quando aceita os convites de Yusuke em Urbo. 
- E para acompanhar! Um excelente vinho! – Yusuke olha para o comandante, que se encontra distraído olhando para Aurora – Comandante!
- Sim! O nosso acompanhamento! Claro!
     Uma fina jarra de cristal, taças e talheres aparecem.
- Esse médico parece bem simpático, talvez ganhe a minha confiança se não for um dos que concordam que os observadores imaginam coisas no espaço e nos asteróides – sussurra Aveline no ouvido de Aurora.
- Saberemos em breve – responde à amiga.
     O Comandante Akash se levanta e serve o vinho nas taças.
- O Dr. Yusuke, só para constar, foi aplaudido pela equipe de alimentação da nave e me foi solicitado convidá-lo para fazer parte da tripulação, infelizmente tive que recusar por medida de segurança de saúde e para que não nos tornássemos obesos.
     Risos.
- O Dr. Yusuke compreendeu a minha decisão e lhe sou muito grato – continua o comandante.
- Acredito que a obesidade seria o seu menor problema com a tripulação comandante, também sou um apreciador de vinhos – responde Yusuke.
- Acho que não conseguíramos estabelecer nossas rotas com precisão – disse o Comandante Sarte e ninguém consegue segurar os risos, principalmente Mei, que não se lembra da última vez que riu tanto. Seus olhos lacrimejam.
- Um brinde a vida! Um brinde a luz!
     Todos correspondem ao chamado do comandante anfitrião erguendo as taças - Bonan apetiton! (Bom apetite!)
     O jantar é muito apreciado e se torna ainda mais divertido com as histórias de Yusuke. Ele conta com detalhes, os momentos em que ficou algumas horas preso no Planeta Atar. Foi uma situação em que suspeitavam que ele fosse um aturiano disfarçado. O povo de Atar foi o que mais sofreu com as investidas de cópias de falsos seres aturianos, que assim ficaram conhecidos, pois se desconhecia a sua origem planetária. A federação conseguiu expulsar os falsos atarianos que para diferenciar dos nativos, ficaram sendo chamados de aturianos.
     O Dr. Yusuke participava da equipe que “desinfetava” esse mundo. Ele havia se afastado de uma delegação diplomática, a primeira e última que participou, para colher amostras de plantas medicinais em uma pequena comunidade agrícola que não o conhecia. Ele esqueceu de informar as autoridades locais que faria esse passeio em seu pequeno momento de folga. Durante a prisão, os guardas atarianos lhe ofereceram um prato de comida. Ele pegou o prato e cheirou e, como sempre anda com amostras de temperos, fez uso deles no prato e compartilhou com os guardas. Foi um sucesso, alguns chefes de clãs foram visitá-lo e confirmaram que se tratava de um representante da federação.
     O Dr. Yusuke foi solto imediatamente com pedidos de desculpas, ensinou como plantar e usar as ervas aromáticas e, voltou para a sede diplomática com a promessa de não comunicar oficialmente o “incidente”.
     Outros assuntos foram conversados, como por exemplo, a presença de Mei e seu interesse pelas estações de fronteiras, as férias de Aurora, os trabalhos realizados por Dareh e Yusuke em Urbo. O comandante relatou algumas aventuras da nave enquanto transportava autoridades diplomáticas de outros mundos. E desmistificando alguns casos paranormais de que alguns passageiros juravam que escutavam vozes e vultos nos corredores e deques da nave.
     O jantar havia terminado. O Comandante Akash convida todos para subirem na plataforma. Ele gostaria de compartilhar um momento final para encerrar o encontro. Todos são tele transportados para o ponto mais superior e extremo da nave. Encontram-se agora numa cúpula, onde a luz disforme da hiper velocidade que se encontram, não permite nada identificar do lado de fora.
     O comandante faz um anuncio:
- Meus amigos. Estamos muito próximo da constelação de Niar. Sairemos da hipervelocidade no centro do seu principal aglomerado de estrelas e iluminaremos temporariamente os nossos olhos. Para compensar, vamos acelerar para 50% a nossa velocidade. Não queremos que se atrasem.
     Aveline e Aurora ficam entusiasmadas, conhecem bem essa constelação vista de estação, mas nunca estiveram presentes. O ambiente fica escuro e o piso e as paredes transparentes. Depois que o som de aviso de saída da hipervelocidade é escutado, tudo se ilumina com a beleza das brilhantes estrelas. Todos parecem flutuar no espaço, um momento de puro êxtase que o comandante não dispensaria para encantar Aurora.
- É de uma beleza que não se cansa em admirar – Disse ela.
- De fato, uma beleza divina – responde o comandante, olhando para Aurora com paixão. Ela retribui com um sorriso e segura a sua mão.
     A nave segue com seus propulsores iluminados e todos contemplam as estrelas e nebulosas, acompanhado pelo som de uma música clássica vibrante da cultura Tero Unua, escolhida pelo Comandante Akash.
     Na Estação de Fronteira Sul, o Dr. Lunn acompanha a nave na célula de observação e registra o desaceleramento.
- Reduziram a velocidade? Devem está admirando Niar – pensa.
     O grupo se espalha no recinto. Mei conversa com Dareh e fala do encontro que teve com Aveline. Yusuke se aproxima de Aveline e arrisca uma conversa elogiando a nave e o trabalho dela na estação.
     Aveline não perde tempo e vai direto ao assunto:
- Lamento que nem todos os médicos da federação confiem em nosso trabalho!
- Posso lhe garantir que nunca concordei com esses procedimentos. Tive a oportunidade de ler os laudos e são inconclusivos.
- Sério? Alguns colegas simplesmente foram afastados de suas funções, apenas as estações norte e sul mantiveram suas equipes.
- Em parte, a Estação Sul foi quase toda substituída, apenas o Dr. Lunn insistiu em não aceitar as férias, continua sozinho na estação.
- Sabemos disso, estou indo ajudá-lo. Será que as férias de Aurora se devem a isso? Ela está com problemas de miragem?
     O Dr. Yusuke sorrir amigavelmente. Ele compreende a preocupação de Aveline.
- Nenhum registro recente consta nada sobre Aurora. Tive a curiosidade de perguntar ao comandante e ele disse que era uma surpresa boa para ela.
     Ambos olham discretamente e observa o comandante muito próximo de Aurora.
- Espero que sim. Ela é muito especial para nós – disse Aveline.
- E muito mais para ele.
     Um pouco afastados, o Comandante Akash e Aurora conversam silenciosamente.
- Tenho uma notícia para lhe dar – fala o comandante – Mas antes quero lhe tranqüilizar em dizer que suas férias não estão relacionadas com estresse de trabalho.
- Você quer dizer, os observadores de miragens – Aurora sorrir.
- Sim. Mas está também relacionado a um evento muito importante que diz respeito a nós dois.
- Nós?
- Você está voltando também, por que a sua prima Nida vai casar. Ela quer você como a sua madrinha.
- Casar? Mas eu achava que ela e você...
- Nunca a quis – interrompe o comandante – Aurora, eu sei que já é do conhecimento de toda galáxia o amor que sinto por você e que todos correspondem com isso. Mas preciso saber.
     O comandante abre uma caixinha de cristal. Em seu interior uma fina corrente de puro ouro e um pingente de diamante.
- O que quer saber? – os olhos de Aurora brilham de alegria.
- Você aceita casar comigo?
     Aurora olha para os lados e emocionada diz que aceita.
     Os dois se aproximam ficando face a face. Aurora olha para o ambiente ainda um pouco iluminado pelas estrelas de Niar. O comandante entende as suas intenções e em poucos segundos tudo fica escuro, tempo suficiente para eles se beijarem discretamente, sem que os outros vejam.
     Novamente o som de aviso é ouvido, a nave volta a entrar na hipervelocidade. O Comandante Akash se despede e todos seguem para os seus aposentos.
     Antes de dormir, Aveline acessa uma memória de vídeo de seus pais que faleceram bastante idosos. Ela relembra com emoção os momentos de infância na estação e quando brincava em Rugo com seu amigo Adani.
     Também em seu quarto e escutando uma ritmada música popular de Urbo, Yusuke negocia com o display em autorizar uma pequena jarra de vinho com uma graduação alcoólica um pouco maior. Depois de muita insistência tem o seu pedido atendido por Turim, um atariano que é chefe de alimentação da nave e que se tornou seu novo amigo, recomendando moderação. Yusuke agradeceu a gentileza e disse que não se preocupasse que ele tem um remédio instantâneo para ressaca, o que muito agradou o chefe de alimentação que ficou de visitá-lo em Urbo nas próximas folgas.
     Dareh aproveita para conversar um pouco em frente a um holograma, com o seu instrutor Argos Aury. Ele fala do encontro que teve com o Embaixador Nuada e da possibilidade de um dia vir a participar de um campeonato no Planeta Oceano.
     A tripulação do Sankta Spirito está recolhida, com exceção da ponte de comando que está sendo apresentada a Aurora pelo Comandante Akash. Ela fica impressionada com os painéis luminosos e com a avançada tecnologia muito superior da encontrada na estação de fronteira que ela vive e trabalha.
     Durante um sono profundo, Mei tem um pesadelo envolvendo Gruner. Ele está preste a cair em um precipício e ela tenta erguê-lo. Sem forças suficientes, ela não consegue segurar sua mão por muito tempo e o ver cair. Ela acorda assustada e senta na cama. Já havia tido outros sonhos com esse homem misterioso, mas nunca em circunstâncias tão assustadoras.
     Mei perde o sono e escuta vozes fora dos aposentos e resolve ir conferir.   
     Usando uma camisola branca de seda, ela põe os chinelos macios e silenciosamente vai seguindo pelo corredor. Ela ver dois vultos luminosos seguindo em direção ao jardim, mas perde a coragem de segui-los quando se lembra do caso relatado pelo comandante de visões e vultos. Ela sente um cheiro adocicado e convidativo que fica próximo de uma porta. Curiosa, ela se aproxima e um sinal eletrônico é acionado. A porta se abre e Yusuke aparece de pijamas, segurando um prato de frutas com doces e calda de caramelos.
- Jovem Mei? Pensei que estava dormindo.
- Tive um pesadelo, perdi o sono.
- Bom eu não sei se estou dormindo, mas esses doces são um sonho.
     Mei sorrir.
- O cheiro é bom.
- Posso pedir mais se você se quiser.
- Não seja guloso doutor, o que tem neste prato é o suficiente para nós dois.
- Hum, está bem! Acho que calculei mal a minha gula. Entre um pouco, ainda não tenho sono, podemos conversar sobre o seu pesadelo.
     Mei aceita o convite e elogia o doce.
- Diga-me Mei, como é possível ter pesadelos nessa nave maravilhosa? Tem algo haver com as estórias do comandante?
- Você não vai acreditar.
- Não vai saber se não me disser.
- Depois que eu tive o pesadelo, escutei vozes e fui olhar. No final do corredor avistei dois seres transparentes e luminosos, não consegui identificar.
     Yusuke põe a mão no queixo e pergunta bem sério:
- Você não trabalhou em estação de fronteira, trabalhou?
- Não. Por quê?
- Não é nada importante, esqueça. É o seguinte Mei, o espaço pode ser um lugar muito interessante, mas não sabemos de todos os seus mistérios.
- Então acredita em mim?
- Mas claro! Você é jovem e saudável. Não há motivos para se preocupar.
- E as visões?
- Essa nave é grande, existe muito espaço aqui dentro. Acredito que possa ser retornos de ecos. Também existem muitas imagens holográficas por aqui, principalmente perto dos jardins. Se fosse algo inteligente ou que pudesse levantar suspeitas e, até mesmo nos ameaçar, o comandante saberia disso. Enfim, é uma nave muito segura.
- Tem razão, acho que me deixei levar pela imaginação. Até nisso essa nave é incrível. E quanto aos meus sonhos, faz alguns meses que os venho tendo.
- São recorrentes?
- Não exatamente. São circunstâncias diferentes, mas sempre tem a presença de um homem desconhecido.
- Alguma das raças humarante?
- Humarante sapiens, com certeza.
- Algum detalhe que possa ser mais específico como vestimentas e idioma?
- Apenas as vestimentas, são diferentes. Mas não há diálogo, apenas entendo os sentimentos.
- Sem querer se indiscreto. Esses sentimentos são os mesmos que o comandante sente por Aurora?
     Mei sorrir como menina.
- Não, de forma nenhuma. É um amor fraterno, uma linguagem corporal de família. É como a alegria de um reencontro.
     Dr. Yusuke pensa um pouco e arrisca um diagnóstico.
- Para que você não vá dormir sem respostas, posso dizer que durante o jantar você falou que essa viagem é um antigo desejo seu de procurar novos desafios e se reencontrar com a sua verdadeira natureza. Não sou especialista nessa área, mas acredito que o seu subconsciente se manifesta em seus sonhos tentando encontrar uma comunicação.
- O que devo fazer?
- Deixe os sonhos lhe trazer as respostas. Não fique ansiosa em querer interpretá-los e aproveite suas vivências da melhor maneira possível.
     Mei dá um abraço em Yusuke. Ele põe a mão em sua cabeça e entrega um frasco de florais para ela beber.
- Isso lhe ajudará a dormir.
- Obrigada.
     Yusuke acompanha Mei até a porta do seu aposento. Ao retornar se depara com um vulto luminoso suspenso, sorrindo e olhando para ele, distante uns trinta metros. O médico fecha e abre os olhos, achando que capturou a sugestão de Mei ou das estórias do comandante. Pensou em tudo, até em se recusar que foi o excesso de vinho que bebeu. Ele se esforça para observar melhor o rosto do ser que se desloca e desaparece.
- Um draconiano?
     Ele se adianta um pouco mais para tentar ver novamente, mas só existe silêncio. Yusuke volta aos aposentos e liga o display, procurando consultar arquivos draconianos. Ele tem acesso a vários registros. O rosto é draconiano, mas as vestimentas muito rústicas. Não encontra nada parecido.
     O médico se convence dos próprios conselhos que deu para Mei. Ele toma uma dose do floral e vai deitar, dormindo rapidamente.
     Durante o tempo restante na nave, os passageiros se dedicam as suas atividades corriqueiras e, nem Mei ou Yusuke comentam sobre as visões.
     Dareh faz treino virtual com espada, ensinando alguns truques para Mei que se diverte. Aveline é acompanhada pelo Soldado Lear para conhecer algumas armas novas e praticar tiro virtual. Yusuke se encontra com médicos da tripulação, alguns são velhos conhecidos.
    Aurora está passeando no jardim com o Comandante Akash. Ele revela seus planos para uma nova vida.
- Aurora, quase não consegui dormir pensando em nós, fazendo planos e de como você aceitou meu pedido de casamento sem hesitar.
- Eu escondi meus sentimentos pelo amor que tenho a minha prima, mas agora sei que ela vai casar, me libertei dessa culpa.
- Não deveria ter passado por isso. E não há culpa em amar. Entendo suas razões.
- Quem será seu marido?
- O filho do Embaixador Novik.
- Smarvi?
- Ele mesmo. Está estudando para no futuro assumir as funções do pai. Nida tem muita experiência nesses assuntos, já acompanha o embaixador há muitos anos. Ela e Smarvi estavam muito próximos e descobriram que havia algo em comum entre eles alem da diplomacia.
- O amor – sorrir Aurora.
     O comandante convida Aurora para sentar em um banco perto de uma fonte de água natural.
- Aurora. Estou há muitos anos no comando do Sankta Spirito. Durante esse tempo, tive muitas experiências inesquecíveis e acredito que correspondi as expectativas. Quero viver com você em Coroni, colaborar no com seu povo em tudo que for possível e ficar mais próximo da sua família e criar nossos filhos.
     Aurora se emociona.
- Você vai deixar o comando?
- Sim. Existem outros irmãos comandantes muito bem recomendados para assumir a nave. Conversei com o General Meadhas e ele foi muito simpático e aceitou meu pedido. Mas tudo dependeria de você aceitar o meu amor e casar comigo.
- Aceito todos os termos comandante – sorrir Aurora – Mas quando será?
- Muito em breve, algumas semanas. Deixarei você em Coroni e completarei algumas missões, a última delas é retornar com Mei para a Cidade de Cristal. Participarei da cerimônia de transferência de função e o novo comandante me conduzirá para perto de você, na minha última viagem no Sankta Spirito.
- Estarei esperando por você Akash. Estou muito feliz, parece que estou vivendo um sonho. Sentirei falta de Aveline e da estação, mas nada se compara está com você e minha família.
     O tempo passa e o Sankta Spirito finalmente chega a Estação de Fronteira Sul. Todos sobem no deque de transporte. Aurora se aproxima de Aveline e dá um abraço cruzado e alternado à antiga moda marciana, hábito preservado em Rugo.
- Boa sorte amiga – responde Aurora – Posso contar com a sua presença em meu casamento?
- Não perderia por nada.
     Aurora se despede dos demais e vai para perto do Comandante Akash. Em poucos segundos, são tele transportados para a estação. O Comandante Sarte Sigmar desloca os cruzadores do casco do Sankta Spirito e segue para o asteróide, ficando perto de sua órbita.
     Aurora e o Comandante Akash observam a movimentação na estação, onde naves menores descem dos cruzadores levando suprimentos e outros equipamentos. O som de partida é anunciado, o cruzador se ilumina de luz branca e o entra na hipervelocidade.

Capítulo 6

STACIO LIMO SUDA
(Estação Fronteira Sul)


     A materialização na estação se completa, o Dr. Lunn dá as boas vindas para todos e começa a explicar o funcionamento da estação. Yusuke percebe uma discreta desatenção do chefe da estação para com ele.
- Bom, como perceberam a estação tem poucos alojamentos e espaço para circular livremente. O suporte de vida possui a capacidade máxima de dez pessoas. Abastecida, ela tem uma autonomia de dois anos. Sua estrutura permite suportar pequenos fragmentos do espaço e, quando necessário, ativamos os escudos eletromagnéticos. Quando estão em funcionamento, nossas comunicações ficam comprometidas temporariamente. O asteróide foi adaptado com propulsores de ajustes de orbita, o que evita que fiquemos girando aleatoriamente – conclui Dr. Lunn.
     Yusuke fala baixo no ouvido de Aveline:
- Acho que ele não gosta de mim. Será que ele pensa que sou do time de médicos que dá férias para os observadores?
- Não se preocupe, deixe Lunn comigo. É uma ótima pessoa e um bom amigo. Falarei com ele sobre a sua situação.
     O Dr. Lunn encaminha o grupo para os alojamentos e depois vai recepcionar os militares no hangar e receber os suprimentos. Aveline acomoda Mei em seu beliche e pede para ela descansar um pouco para se acostumar com o nível de gravidade.
- Fique tranqüila. Nas primeiras horas é comum sentir algum desconforto, depois passa. Se precisar de algo é só me chamar. Vou para a célula de observação enquanto Lunn atende os militares.
- Estou bem – responde Mei – Esse floral que Yusuke me deu é milagroso.
     Aveline sorrir e beija a sua testa.
     Em outro alojamento Dareh observa Yusuke muito calado.
- O que houve? Parece preocupado. Já sei! Você acha que o Dr. Lunn não foi com a sua cara? Eu percebi seu comportamento, mas acho que ele lhe conhecendo melhor vai mudar de idéia.
- Esse é o menor dos meus problemas – comenta Yusuke – Aveline disse que falaria com ele sobre mim. É uma pena que os médicos da federação sejam tão desprezados pelos observadores. Também não os culpo, meus colegas exageraram.
- Então? Por que essa cara?
- Estou com saudades do display da nave e principalmente da sua cozinha. Fico pensando que o General Meadhas tinha razão, acho que eu enlouqueceria aqui dentro.
     Dareh tenta animar o amigo:
- O que é isso Yusuke, não exagera! São apenas algumas semanas.
- Algumas semanas comendo ração de estação. Mas tudo bem! Está valendo à pena. Tem algum planeta civilizado aqui perto?
- Estamos numa estação de fronteira, isso te lembra alguma coisa?
- Sim. Que não vamos achar um restaurante descente num raio de cem anos luz – gesticula Yusuke com os braços.
     Aveline segue direto para a célula de observação e começa a ler os registros que Lunn deixou disponível. Ela começa a acessar com bastante rapidez os modelos de simulação e fica muito impressionada com o que ver.
     Lunn entra na célula:
- Interessante não é?
- Isso é muito interessante! O primeiro sinal que você me enviou era típico de um buraco negro, um som de tambor, mas este sinal é intrigante. Vem da mesma região.
- Chegou a uma conclusão?
- Sim! Tudo indica que seja um pedido de ajuda. Mas de quem ou de que? E principalmente de onde?
- Infelizmente Aveline, não temos como gerar aqui os cálculos mais complexos. Levaria meses só para criar simulações das prováveis coordenadas de onde esse sinal está sendo enviado. Seja lá o que for esse pedido de ajuda, o sinal atravessou a singularidade numa relação de espaço e tempo de milhões de anos.
- E os outros registros?
     Lunn aciona outro canal privado e criptografado.
     Aveline observa os detalhes das conclusões do amigo e mais uma vez além de surpresa fica visivelmente preocupada.
- Lunn! O que é isso? São concentrações de partículas atômicas?
- Exatamente! Mas como pode ver, essas subpartículas são desconhecidas, nunca foram registradas.
- Elas estão espalhadas em bolsões e em quantidades na nossa galáxia.
- Percebe os intervalos? Não há variação de massa, eles estão aqui e depois ali. São as nossas famosas miragens. Olhe aqui no mapa estelar. Elas se concentram próximo das estações Leste e Oeste, exatamente onde os nossos colegas foram substituídos.
- Elas também se deslocam para aqui e a estação norte!
- Exato! Deslocam-se numa rota definida e coordenada, mas não há rastros, é como estivessem “submergindo” na matéria escura e voltando para a superfície para “respirar” ou, para ver se estão seguindo no caminho certo, o que seria muito inteligente para partículas atômicas.
- Orientação de posicionamento! Inteligente demais para minha compreensão. Mas o suficiente para uma investigação militar.
- Desconfio que estejam viajando na subluz.
- Como ninguém pode ver isso Lunn?
- Nós vimos, mas não foi dada a credibilidade. O fenômeno de fato, se comporta muito similar aos demais existentes no universo, mas quando você dirige o foco para confirmar, já sumiu.
- Mas você os seguiu?
- Sim Aveline, apesar dos registros quânticos serem inconclusivos. Mas quando fiquei sozinho na estação, quebrei todos os protocolos que um observador poderia fazer. Acho que a minha carreira aqui está no fim. Não poderia coordenar os focos compartilhando com as outras estações. Não queria chamar a atenção e ser mais um a sair de férias forçadas por algum médico da federação.
- E como chegou a essa conclusão de migração consciente de partículas viajando na subluz? – pergunta Aveline, digitando novas formas de gerar simulações.
- Não tenho conclusão real, mas estamos tendo uma ajuda de um amigo nosso em comum.
     Aveline para a digitação e olha fixamente para Lunn.
- Adani!
     Lunn se defende:
- Não me olhe assim! Sabemos que a Cidade de Cristal é o único lugar em Áxis em que tem condições e tecnologia para compilar esses dados e gerar as simulações praticamente sem margem de erros.
- Então, como um cientista ousado, que não tem simpatia por militares resolve exatamente chamar um Mars?
- Aveline! Você é um Mars, mas também é a chefe da estação. O que temos aqui é uma movimentação coordenada suspeita se concentrando próximo das estações de fronteiras. Eu sei que estou errado em não informar a federação sobre isso, mas corremos o risco de sermos substituídos e ignorados, como aconteceu com os outros.
- Adani não deveria esconder isso de mim!
- Não fique decepcionada, Adani gosta muito de você e respeita seu trabalho. Ele só quer lhe proteger e está se arriscando muito nessa operação. Apesar da força militar de Rugo ter mais autonomia do que os outros povos, ele sabe que é seu dever investigar.
- Ele disse que levava armas para estação, o que você sabe disso?
     Lunn suspira e continua:
- É verdade! Ele levou algumas armas e outros equipamentos. Sabemos que você não usa armas.
- Nenhuma estação usa! Sabe disso.
- Claro que sei, não teria utilidade aqui. Mas nesse caso, já sinto falta de ter algumas.
- Pode me dizer o plano? Ou também é segredo?
- Adani vai tentar realizar uma coleta das partículas migrantes. Coordenei esses registros com ele em Rugo e chegamos à conclusão que outro grupo de partículas está seguindo para lá. Vai passar próximo ao asteróide da sua estação.
- Como pretende fazer isso?
- Pelos nossos cálculos, haverá uma emersão em breve. Adani fará um desvio da orbita do asteróide para se posicionar exatamente no lugar certo. Seus saltos são bem previsíveis. Ele posicionou antenas eletromagnéticas para ativar e desativar os escudos por alguns segundos. Nesse tempo, o asteróide ficará invisível e uma projeção dele estará nas coordenadas antigas, apenas por medida de segurança Nesse tempo, a estação vai ser desligada e toda a energia concentrada na “armadilha”, ficará obviamente sem transmitir e captar sinais.
- E como capturar um fantasma, como pretende fazer?
- Adani levou uma cápsula de contenção. O tamanho é exagerado para abrigar ínfimas amostras, mas era o que tinha disponível.
- E assim será possível identificar fragmentos de unidades biológicas básicas?
- Será possível, assim como outros tipos de unidade. Sabemos que a vida se manifesta no universo em formas e composições diferentes. Mas com essas provas completas, poderemos apresentar à federação que as nossas observações não eram miragens, e mais do que isso, torcer que seja apenas um fenômeno físico inusitado e não conhecido.
- Adani sabia da chegada do Sankta Spirito?
- Não sabia. Você e Aurora voltariam para Rugo. Ele sabia que você o ajudaria se contasse a verdade. Como eu disse, ele queria lhe poupar da acusação de cumplicidade. Entrei em contato com o Comandante Akash, ele é razoável e atencioso com os observadores de estação. Disse que precisava da sua ajuda e que os substitutos estavam chegando de Rugo, ele deixou que você decidisse. Mandei parte dos registros para estimular a sua vinda para cá. Depois, tive tempo de informar para Adani. Confesso que esse cruzamento de coincidências saiu melhor do que esperava.
- É minha estação, é meu trabalho e minha responsabilidade está lá. Você fez um excelente trabalho aqui Lunn. Todos os dados foram incrivelmente simulados e intuídos, mesmo com os poucos recursos técnicos da estação. Acho que não haveria necessidade da minha presença só para confirmar suas conclusões ou me proteger. Posso tomar minhas próprias decisões – desabafa Aveline.
- Não gostou de viajar no Sankta Spirito?
- Uma experiência inesquecível! Mas não fui convidada para a sua festa!
- Aveline, foi uma exigência de Adani, não tenho influência sobre ele, e como seu amigo, concordei que poderia ser perigoso para você. Desculpe se te magoamos, não foi nossa intenção, acredite.
     Aveline apóia os braços no painel, baixa a cabeça, respira fundo e olha para Lunn.
- Desculpa amigo. Acho que faria o mesmo por vocês. Mesmo assim, preferia ter ido para Rugo. Minha viagem de volta será mais demorada sem o Sankta Spirito.
- Ainda acha que sua presença aqui foi desnecessária não é?
     Aveline balança a cabeça afirmativamente.
- Vamos lá Lunn! Eu lhe conheço bem, não é só isso?
- Não. Veja esses registros!
     Lunn abre outro arquivo.
     Demonstrando um pouco de cansaço, Aveline analisa outros registros da estação. Para ela, as leituras dos mesmos são simples, mas o suficiente para dessa vez, seu semblante mudar de cor.
- São resíduos de energia fotônica e uma concentração anormal de neutrinos na órbita do Planeta Gir!
- Exatamente! Agora você entende os motivos por que lhe chamei aqui. Quero que me ajude a decidir qual desses três problemas vamos resolver primeiro. Você não só foi convidada para a festa, como também está bem no meio dela.
- Lunn! Não podemos esconder isso dos outros!
- Você tem toda a razão, poderemos formar uma equipe. Mas e o médico?
- Yusuke? Eu queria falar com você sobre isso. Ela é contra o comportamento dos médicos e não acredita nos diagnósticos deles. Ele não participou disso, mas teve acesso aos registros. Nada justificava a saída dos nossos colegas das estações leste e oeste. É um bom homem e um excelente gastrônomo.
- Isso me deixa mais tranqüilo.
     Enquanto Lunn e Aveline se concentram em suas decisões, Mei se levanta de sua cama e vai caminhando pela estação. Ela chega numa sala que tem uma imagem panorâmica do asteróide. Mei observa as estrelas, a paisagem rochosa e sem vida. Aos poucos, ela vai sentindo uma sensação estranha e subitamente seus olhos vêem o Cruzador Sankta Spirito no espaço sob a estação. Ela observa a nave manobrando, escuta som de aviso e entra na hipervelocidade. Mei se sente fraca e, antes de desmaiar, é amparada por Dareh.
- Mei! O que houve!
     Ela não responde, está inconsciente.
     Dareh chama Aveline e Lunn pelo comunicador e leva Mei nos braços para a enfermaria. Todos correm para lá e Yusuke se aproxima.
- Deixe-me eu ver isso!
     Todos se afastam.
     Yusuke faz um exame clínico inicial e utiliza um scanner de mão que emite uma luz azul que percorre da cabeça aos pés.
- Então Yusuke! O que houve?
- Não encontrei evidências. Os níveis de oxigênio no sangue estão normais, não é síndrome de adaptação.
     Mei começa a recuperar os sentidos e tenta se levantar. Yusuke a impedi.
- Tenha calma jovem, devagar.
- Eu estou bem Yusuke, não sei o que houve.
- Você desmaiou. Lembra de alguma coisa?
- Por favor! Não comentem nada ao Comandante Sarte, ele não permitiria que eu ficasse aqui.
- Calma, não se preocupe ninguém falará nada.
     Mei se levanta, convencendo a todos que está melhor.
- Quando eu estava na janela, vi o Sankta Spirito. Ele fazia manobras e entrava na hipervelocidade, parecia que tinha bastante pressa.
- Mas a nave já se foi há muito tempo? - disse o Dr. Lunn.
- Sim eu sei. Foi um sonho, uma visão.
- Você está melhor?
- Estou sim Lunn, acredite!
- Tenho uma receita médica excelente para todos! Uma boa sopa de cogumelos frescos! Alguém pode me mostrar onde fica a cozinha? – pergunta Yusuke.
     Lunn se apresenta:
- Faço questão de lhe mostrar.
- Não se preocupem! Já provei essa sopa e posso garantir que é deliciosa – elogia Dareh.
- Nos encontramos no refeitório em 40 minutos – diz Aveline, sinalizando com o olhar para Lunn, avisando que seria um bom momento para explicar para todos o que está acontecendo.
     No caminho, Lunn fala mais atencioso com Yusuke e diz que Aveline falou sobre ele.
- Dr. Yusuke, quero me desculpar pelo meu comportamento, sei que não foi adequado.
- Desculpas aceitas, na condição de que me chame apenas de Yusuke! Entendo suas razões, acho que agiria da mesma forma Dr. Lunn.
- Lunn! Por favor.
- Sinceramente – continua Yusuke - Não entendo por que fazem isso? Não há razão para afastar vocês.
- Também considerei algumas possibilidades e nunca houve registros disso nos históricos das estações. Aceito ou não, Tudo era relatado, nunca houve férias forçadas.
- Não quero parecer grosseiro Lunn, mas ainda acho estranho você ainda está aqui sozinho.
- Não foi fácil. Acho que Aveline e eu fomos poupados devido ao grande respeito que a federação tem pelos nossos pais e...
     Lunn olha para Yusuke dando seu primeiro passo rumo a uma confiança mútua.
- Vamos Lunn. Suas leituras faciais revelam preocupação e um desejo incontrolável de dizer um segredo para um novo amigo.
     O Dr. Lunn sorrir.
- Tem razão. Nós sustentamos os registros, não enviamos os relatórios e a única pessoa que compartilhei foi Aveline. Violei dezenas de protocolos e possivelmente serei afastado da estação.
- Então a coisa parece ser grave!
- Mas do que imagina! Na verdade só pude revelar alguns segredos quando consegui trazer Aveline para cá.
     Eles chegam à cozinha e Yusuke começa a preparar a sopa.
- Tenho certeza que algo de grande e perigoso está acontecendo. Essa estação foi o único lar que conheci, vivi muito tempo aqui com os meus pais que eram observadores como eu. Conheço cada equipamento, antigo e novo e nenhum pedaço desse céu me escapa.
- Podemos ajudar?
- Acredito que sim. Após o jantar, Aveline e eu contaremos tudo que sabemos e formaremos uma equipe de decisões.
- Pode contar comigo! – disse Yusuke que aperta a mão de Lunn.
     Todos estão reunidos no refeitório da estação. A sopa de Yusuke é elogiada e ele agradeceu envergando o tronco em agradecimento e espalhando simpatia:
- Meus amigos, obrigado! Acho que a sopa foi uma sugestão muito bem aceita. Mais existe alguns fatos que o Lunn e Aveline querem nos contar. Temendo que sejam notícias indigestas, resolvi deixar a sobremesa para outra ocasião.
     Yusuke procura seu acento e aguarda que os observadores revelem seus segredos.
     Lunn e Aveline vão direto ao assunto. Eles relatam os três registros, gerando muita curiosidade e insegurança. Sugere a criação de uma equipe e que provisoriamente nada seja comentado com o Comandante Sarte.
     Dareh e Yusuke concordam em colaborar, mas tem ressalvas em não comunicar ao comandante e a própria federação, pois a sua maior preocupação é com a segurança de Mei.
     Aveline entende a situação de Dareh e Yusuke. Sabe da grande responsabilidade de está salvaguardando o bem estar de Mei. Mas revela que não tem certeza se no momento existe algum lugar seguro na federação. Lunn tranqüiliza, dizendo que tudo depende de um teste que será feito na estação norte e, que acha precipitado alertar o comandante. Ele falou da situação difícil dos observadores. Houve unanimidade, de que algo muito estranho está acontecendo.
- É possível que um combate ocorresse na atmosfera desse planeta e que a estação não conseguisse detectar? – pergunta Mei.
     Lunn responde:
- Estive observando as últimas imagens dos telescópios de órbita que focalizou o Planeta Gir. As últimas imagens e leituras indicam forte tempestade magnética na atmosfera do planeta. Um fenômeno metereológico rápido, intenso e atípico nunca observado. Quando parei as atividades normais da estação e me concentrei apenas nas miragens, procurei todo tipo de registro anormal nas áreas mais próximas do asteróide onde estamos. Não encontrei nada que chamasse a minha atenção, com exceção da tempestade em Gir. Na oportunidade e movido pela curiosidade, foquei as antenas para compartilhar leituras mais precisas na sua atmosfera, movendo um telescópio que estava mais próximo do planeta.
- Identificando assim os elevados níveis de radiação? – pergunta Dareh.
- Exatamente! Avançadas naves que utilizam hipervelocidades sempre deixam suas assinaturas na matéria escura, os rastros de neutrinos e energia fotônica são comuns nesses casos. Aqui mesmo da estação, já observamos e identificamos os trânsitos de muitas naves da federação, inclusive do Sankta Spirito.
- E na órbita do Planeta Gir essas assinaturas não foram identificadas? – pergunta Mei.
- Não foram. Em última hipótese, uma troca de motores subluz de uma nave já produziria uma variante nova.
- Mas o tempo de vida útil desses propulsores é praticamente ilimitado – interrompe Dareh.
- O que não seria o caso – completa Aveline – Não há rota comercial em Gir e também não está incluído na lista de planetas de apoio. Lendo aqui os registros, diz que é um planeta frio e montanhoso com poucas planícies e baixa biodiversidade. Não existe colônia nativa de seres conscientes. É uma área de reserva.
     Lunn continua com as informações;
- A principal função das estações de fronteiras é monitorar a entrada de seres não aliados da federação. Como isso nunca ocorreu, nos dedicamos a monitorar as nossas próprias movimentações e pesquisar os corpos celestes. Produzimos excelentes materiais científicos que muito nos ajudou a conhecer a nossa galáxia

- O suficiente para saber que o fenômeno de Gir não era normal? – pergunta  Yusuke.
- Nossos antecessores nunca registraram nada parecido. Não podemos ficar aqui parados enquanto o Capitão Adani e o Tenente Lido se arriscam na estação norte!
     Dareh fica visivelmente preocupado com a segurança de Mei. Ela percebe isso e toma a iniciativa.
- Será que não seria melhor ir ao planeta e conferir de perto?
     Aveline concorda:
- Precisamos reunir provas eficazes do que aconteceu no Planeta Gir.
     O Yusuke olha para Dareh.
- Senhores! – continua Aveline – Não sabemos o que aconteceu! Alguma coisa estranha entrou em nossa galáxia e não sabemos ao certo há quanto tempo isso acontece. Essa investigação, antes de ser científica é de responsabilidade militar, como convenceremos o Comandante Sarte a liberar uma escolta até o planeta?
     Yusuke desvia o olhar para Mei.
- O nosso passaporte está bem aqui!
- Eu?
- Claro que sim Mei! O que motivou a sua vinda para cá foi seu interesse em conhecer o trabalho da estação. Você diz ao comandante que tem interesse em conhecer o Planeta Gir e tenho certeza que ele não negará o pedido.
     Aveline confirma que chegou o período de visitas científicas. Pediremos autorização de um acesso provisório e rápido.
- Não! Acho arriscado – Dareh não concorda.
     Mei se aproxima de Dareh e põem a mão em seu rosto.
- Dareh. Até agora tem sido muito bom e divertido tudo o que passamos, mas não é isso que quero para minha vida. Estamos diante de algo novo e misterioso e que pode colocar em risco a segurança de toda a federação. Não podemos nos esquivar da nossa obrigação. Temos escolta militar, excelentes cientistas e muitas dúvidas. Não sou uma especialista, mas conheço um pouco de cada coisa e posso ser útil. Precisamos ir naquele planeta!
     Dareh sabe que Mei está certa. Sua exagerada preocupação com ela rivaliza com a confiança e as recomendações do General Meadhas em acompanhá-la.
- Todos concordam? – Pergunta Dareh no que os demais confirmam positivamente - Tudo bem! Quando partiremos?
     Lunn acessa um holograma:
- Os nossos equipamentos de pesquisa são portáteis e fáceis de conduzir. As mochilas com os matérias básicos de exploração podem ser disponibilizadas pelo comandante. Em duas horas vocês poderão partir, ficarei aqui na estação aguardando o contato do Capitão Adani.
- Falarei com o comandante sobre a nossa visita ao planeta – conclui Mei.
     Sem saber das reais intenções do grupo, o Comandante Sarte concorda com a didática pesquisa de Mei e libera dois cruzadores e um destacamento para acompanhar os trabalhos em solo, na condição de que ele também esteja na equipe. Na célula de observação, o grupo observa um holograma do planeta e escolhem alguns pontos para aterrissagens e acampamento.
- Estamos com sorte – disse Lunn – Chegaremos nesse ponto com luz. Esse planeta tem uma rotação lenta, são 48 horas com luminosidade para cada duas congelantes noites com o mesmo tempo.
- O planeta é muito longe daqui? – pergunta Yusuke.
- Não é distante e dispensa a hipervelocidade. Na velocidade da luz, em uma hora e quarenta minutos estaremos em sua órbita.
     Aveline chama a atenção do grupo:
- Temos três eventos misteriosos que podem estar relacionados. Precisamos começar a entender o que é possível no momento. Não queremos que ninguém aqui corra riscos desnecessários. Ficaremos todos juntos.
     Aveline convida Dareh e Yusuke para ajudá-la com os equipamentos de pesquisa que fica em outra seção da estação. Mei fica sozinha com Lunn, aprendendo mais sobre o planeta.
- Você está melhor?
- Sim Lunn. Estou ótima. É que desde a presença no Sankta Spirito que coisas estranhas acontecem comigo.
- Mei, nos conhecemos há pouco tempo, mas quero que saiba que poderá confiar em mim. Tenho uma curiosidade. Por que você escolheu esta estação?
- Bom. Na verdade foi o meu pai que escolheu. A estação estava praticamente vazia e sua fama lhe precede.
- Posso dizer o mesmo de você. Sempre tive curiosidade de lhe conhecer pessoalmente. Quando tenho oportunidade, acompanho alguma notícia em que você está envolvida. Conheci uma garotinha que disse que quando crescer quer ser igual à Mei. Você é uma inspiração sabia?
     Mei fica tímida e olha para Lunn e, pela primeira vez, seus olhos se encontram revelando muito mais que admiração.
- Desculpe. Não tive a intenção de...
- Não precisa se desculpar. Antes de vir para estação fiquei curiosa com o seu trabalho e li o seu histórico. Se meu pai não escolhesse essa estação, eu mesmo o faria.
- Fico feliz em ouvir isso. Aqui não temos muita vida social. Nossos amigos são os outros observadores de fronteiras, militares em transito e algumas vezes a Cidade de Cristal. Depois que os meus companheiros de trabalho foram afastados me concentrei no trabalho.
- Uma vida muito solitária.
     Lunn aciona o holograma e com movimentos da mão procura imagens da flora e fauna do Planeta Gir. Ele encontra uma flor muito bonita, segura a imagem holográfica na mão e entrega para ela que agradece e faz de conta que está sentindo o aroma.
- Linda!
- Essa planta floresce nas montanhas, é muito rara.
- Você é feliz aqui?
- Está aqui é uma realização para mim. Era melhor na infância antes dos meus pais seguirem para luz. Eu corria por esses corredores e aprendia muito com eles na célula de observação.
- Você tem família? Irmãos?
- Não tenho. E atualmente, Aveline e Adani são o que tenho de mais próximo de uma família.
- Você e Aveline são muito próximos não é? O mesmo trabalho, as mesmas aspirações. Tem muito em comum – Mei insinua que existe algo mais.
     Lunn percebe as dúvidas de Mei e resolve poupá-la.
- Tenho Aveline como minha melhor amiga ou uma irmã que nunca tive.
- Entendo.
- E você? Já pensou em um dia sair da estação? Fazer outro trabalho?
- Sim. Aqui existe tempo para pensar em muitas coisas, de fazer planos. Além do mais, existe uma longa lista de espera de outros cientistas que desejam trabalhar aqui provisoriamente. Pensei em ceder minha vaga várias vezes.
- E que te impede de fazer isso?
- Está com alguém especial. Ter minha própria família, aprender coisas novas.
- Existe alguém especial em sua mente? 
     Lunn sempre admirou Mei. E com o tempo, essa admiração foi se tornando num inexplicável sentimento, mais forte e ao mesmo tempo impossível. Mas agora, Mei estava na sua frente. Podia sentir a sua presença com todo o seu esplendor. O destino a levou até ele.
- Desculpa Lunn. Agora foi a minha vez de ser indiscreta.
- Você disse que coisas estranhas acontecem com você. Entendo o que quer dizer.
- Entende? – Mei fica curiosa.
- Já faz algum tempo que tenho sonhos de um realismo incrível.
- Sonhos?
- Sim, sonhos. Neles estou sempre com uma mulher num lugar bonito, diferente, em um planeta desconhecido para mim. Nesses sonhos, sinto a força do seu amor e também a admiração de um povo nativo simples e hospitaleiro – revela Lunn.
- E essa mulher, consegue saber quem é?
- Sim.
     Lunn se levanta e vai para perto de uma pequena janela e observa o espaço.
- Lunn – Mei se aproxima, toca em seu ombro. Ele se vira e olha bem fundo nos seus olhos fazendo seu coração acelerar.  Mei não precisava saber o nome da mulher dos sonhos de Lunn, sabia que era ela. E quando em Urbo viu a sua imagem pela primeira vez, teve uma forte intuição de que ele era especial. Nunca sonhou com ele, mas o que estava acontecendo naquele momento era muito forte e transpirava emoções e desejos. Os dois estavam cada vez mais próximos, seus lábios quase se tocam, mas são interrompidos com um chamado de Aveline para que eles sigam para o hangar.
     Uma nave de transporte estava chegando. Eles não perceberam que o tempo havia passado tão rápido e se afastam silenciosamente. Lunn retira uma pequena placa de cristal do painel. Serve para gerar imagens holográficas de coordenadas. Ele olha para Mei com ternura e estende a mão.
- Precisamos ir.
     Mei segura à mão de Lunn e ainda respirando um pouco ofegante o abraça, encostando a cabeça em seu peito.
- Sim. Precisamos.
- Tenha cuidado. Estarei em contato com vocês.
- Ficaremos bem.
     Antes da nave de transporte aterrissar no asteróide, Lunn entrega uma fina e pequena lâmina de cristal para cada um.
- O que isso? Uma pequena lembrança da estação? – pergunta Yusuke.
- É um antigo projeto dos meus pais. É um localizador biométrico. Ele interage com o DNA dos seus usuários e permite que cada um de vocês conheça o estado de saúde do outro – explica Lunn.
- Interessante – fala Yusuke – E como funciona?
- Assim que nós colocarmos sob o dorso da mão, ela se expande e forma um fino e transparente bracelete. É quase imperceptível. Quando você toca na parte de cima uma vez, ela emite uma luz branca e cinco pequenas formas geométricas básicas e luminosas aparecem. Corresponde à distância que se encontra de quem deseja localizar: Azul está perto, verde está num raio de 500 metros, Amarelo está até 15 km. Tocando na parte de baixo, no pulso, terá uma leitura da energia vital: Azul está normal, Amarelo está doente ou ferido e vermelho... – Lunn dar uma pausa – Bom. Vermelho está em coma.
- E depois do coma? – insiste Yusuke.
- A luz correspondente pisca incessantemente indicando que está morto. Mas a sua localização de aproximação ainda funciona – conclui Lunn.
- E como saberemos quais as formas que indica cada um? – pergunta Dareh.
- Por etapa de ativação, vou mostrar como se faz.
     Lunn ao colocar a lâmina sob o punho, ela se movimenta para os lados se fundindo no pulso. Um losango acende e na parte de baixo uma luz azul. Mei e os demais repetem o processo. No dela surge um círculo, em Aveline um triângulo, em Dareh um retângulo, e Yusuke um quadrado.
- Observem. Cada bracelete possui agora os cincos desenhos e todos estão saudáveis e próximos.
- Qual a fonte de energia desses braceletes? – Pergunta Yusuke.
- O bracelete possui uma nano bateria que emite radiação laser de baixa intensidade e bem conhecida pelos médicos da federação.
     Yusuke concorda:
- É verdade. Utilizamos a radiação laser de baixa intensidade em terapias. Se o ajuste estiver nos níveis certos, funciona como um estimulante fisiológico. Também ajuda a transportar pelo fluxo sanguíneo, os nutrientes para partes necessitadas do corpo. Parabéns! Seus pais fizeram um belo trabalho por aqui.
- Eles tiveram ajuda dos humarantes do Planeta Oceano. É apenas um protótipo que teria seu uso desnecessário em nossa população. Na verdade foi concebido para monitorar um garotinho hiperativo que vivia aqui na estação.
     Risos.
- Meus pais apresentaram aos militares, e os testes em operações arriscadas em mundos não aliados se mostraram satisfatórias. Certamente eles devem ter aperfeiçoado, mas estes modelos são únicos.
- Como assim? – pergunta Mei.
- Quando fui indicado para trabalhar aqui, encontrei mensagens secretas dos meus pais com instruções de localizar um pequeno cilindro de titânio que estava numa rocha específica no asteróide. Dentro dele encontrei os braceletes. A diferença destes é que eles podem interagir com os nossos NRs (Nanorobs), mas desconheço como pode ser essa interação.
- Como assim desconhece? – pergunta Dareh – Seremos os primeiros a testá-las?
- Parece que sim – responde Lunn – Os militares por medida de segurança, não concordariam que seus soldados compartilhem interações com seus NRs o que seria também desnecessário. Mas fiquem tranquilos! Meus pais não fariam nada que prejudicasse a saúde de quem utilizasse os braceletes.
- Interagir com nanorobs! Muito curioso! – fala Yusuke.
     Dareh olha para o objeto em seu punho:
- E se eu quiser tirar o bracelete? Como faço?
- Acreditem. Depois de um tempo usando o bracelete você não vai querer tirar. Eu pesquisei as anotações dos meus pais que diziam que os nanorobs potencializavam todos os benefícios e funções dos braceletes e a interação é opcional. Nessas circunstâncias, acredito que apenas o seu nanorob pode desativar o bracelete, se assim você desejar.
- Mas nós não interagimos com o nanorob – Comenta Dareh.
- É verdade, não é uma relação simbiótica. Mas nesse caso, se acontecer, teremos que aprender a lidar com isso.
     Aveline fica em silêncio e apreensiva. Ela interagiu quando criança com seu nanorob. Tudo começou em Rugo, quando ela caiu numa fenda que expelia gases tóxicos. Ninguém conseguiria resgatá-la a tempo e a exposição prolongada aos gases lhe mataria em poucas horas. O seu nanorob se manifestou espontaneamente e começou a orientá-la de como poderia sair da fenda, deslizando por corredores estreitos nas rochas. Se fosse um adulto, dificilmente sobreviveria. Quando finalmente conseguiu sair, Aveline agradeceu ao que ela pensava ser a voz de um anjo e perguntou o seu nome. O “anjo” disse que seu nome é Iron e que ela prometesse não revelar o que aconteceu. Aveline cresceu interagindo algumas vezes com o seu anjo, até saber pelo próprio, que todos os humarantes têm um dentro de si. Esses casos pessoais de interação com o NRs são pouco revelados e conhecidos.
- Aveline! Está tudo bem? – pergunta Mei – Está um pouco distraída.
- Sim, estou bem. Pensava na paciência que o meu nanorob deve ter comigo.
     Todos riem.
- Acho que ele gosta muito de você – disse Mei brincando.
- Creio que sim.
     A nave de transporte aterrissa e após o embarque, todos com exceção do Dr. Lunn seguem para o cruzador de comando. Sem perder tempo, ele corre para a célula de observação e inicia contato privado com o Capitão Adani.

     Da janela da nave, Mei observa a estação e fica triste por saber que mais uma vez Lunn se encontra solitário. Seu coração já sente saudades da voz e dos seus olhares. Ela sorrir ao lembrar-se do primeiro beijo que não aconteceu e das incertezas que o futuro lhes reserva. Algumas lágrimas escorrem dos seus olhos. Definitivamente, Mei reconhece que está apaixonada.
Capítulo 7

LA NANOROBS
(Os Nanorobs)


     No antigo Planeta Terra, a raça humana que vivia na superfície se uniu a raça aumarante que vivia nas profundezas da terra e dos mares. Essa coexistência foi celebrada com a criação de um único povo: Os humarantes.
     Essa próspera união foi motivada inicialmente pela sobrevivência em defender seus mundos das forças destrutivas dos aliados de Viga, que enviou seus guerreiros da morte. Seres mentalmente dominados, para capturar e escravizar o povo do Planeta Terra.
     Com a ajuda de outros seres dimensionais igualmente poderosos chamados de deuses, que viviam infiltrados e com a mesma aparência humana, o povo humarante finalmente pode vencer o inimigo. Por muitos anos, eles usufruíram de todas as suas potencialidades e viveram gloriosos dias de paz e desenvolvimento cultural e científico.
     Uma das primeiras celebrações entre os dois povos seria de unificar a língua. Para os aumarantes não haveria dificuldades, pois a sua capacidade mental lhes permitiam aprender e falar rapidamente todas as línguas e dialetos conhecidos na Terra. Sendo assim, ficou para o povo da superfície decidir qual seria a língua oficial humarante. Esse processo não foi demorado, pois havia poucos troncos lingüísticos que sobreviveram aos duros tempos, em que a geologia e o clima do planeta enfrentavam profundas transformações.
     Numa tentativa de unificação, foi sugerida uma língua antiga, que na época foi criada para facilitar a comunicação entre os povos do mundo inteiro, e que se adaptaria perfeitamente a essa nova realidade: O esperanto.
     Então, uma nova língua oficial do povo humarante foi estabelecida, não obstante, a livre escolha de que cada cultura ou clã preservasse seus tradicionais idiomas.
     Com o tempo, houve a necessidade do povo humarante de garantir a sobrevivência e variabilidade genética das suas raças, sua população estava em declínio e as crianças eram raras. Durante séculos houve um rígido controle de natalidade, num planeta de limitado recursos naturais. A solução seria encontrar outros planetas que tivessem condições favoráveis para abrigar toda a população e que principalmente, não fosse habitado por alguma civilização. Os humarantes não levariam as suas necessidades ao extremo, ao ponto de dominar e colonizar mundos indefesos, mesmo que isso lhe custasse à própria extinção.
     Os draconianos, uma raça alienígena amiga dos humarantes, que conviveu com os maus tratos e toda sorte de sofrimentos provocados por Viga, e que viviam nos limites do mesmo sistema solar, ofereceram cordialmente um dos seus planetas mais parecidos com a Terra.
     Apesar dos draconianos acharem que tem uma dívida de gratidão para com os humarantes em libertá-los da escravidão, não foi possível aceitar a oferta. O planeta não acomodaria satisfatoriamente a raça humarante em longo prazo. O povo draconiano estava vivendo um rápido progresso e reestruturação da sua sociedade.
     O Planeta Terra já enfrentava dificuldades com frequentes abalos sísmicos e intensas tempestades solares.  Em razão da aproximação da Galáxia Via Láctea com a Nuvem de Oort, considerada um berçário de cometas, estavam na rota de vários asteróides e, apesar dos muitos esforços de desviá-los no espaço, em algum momento a situação ficaria crítica e incontrolável.
     Também havia as colônias humanas no Planeta Marte, Ceres e algumas expedições que iniciavam tentativas de colonização em luas que orbitavam outros planetas no sistema solar externo. Houve uma retenção do progresso nessas colônias pelas mesmas razões da Terra: Não havia segurança.
     No entanto, o que causava mais constrangimento aos humarantes era o que fazer com os robs, os seus mais fiéis colaboradores, na possibilidade de uma viagem a outro mundo. Não havia grandes naves suficientes para conduzir todos. Os robs, seres cibernéticos que foram os responsáveis em apoiar nas principais conquistas, pediram deliberadamente que os humarantes seguissem em busca de um novo lar, enquanto a maioria ficaria no Planeta Terra. Obviamente, isso não foi aceito, pois o planeta seria, cedo ou mais tarde, destruído.
     Os robs são o que se poderia chamar do apogeu tecnológico dos humarantes em termo de interatividade com máquinas. Houve uma extraordinária evolução deles ao ponto de alguns se tornarem autoconscientes e com corpos e atitudes semelhantes aos humanos, porém, estavam longe de experimentar as emoções mais simples em sua totalidade.
     Mas deixar o sistema solar em busca de planetas habitáveis era o menor dos problemas do humarantes, pois eles eram guardiões dos seres mais singelos e extraordinários já conhecidos: Os aumarinos.
     Criados pelo Deus Navan, os aumarinos, antigos habitantes do Planeta Sinos, conhecido pelos humanos como Marte, representava a uma parte dos mistérios que envolvia os interesses de Viga. Por milhões de anos, eles hibernaram no interior da Lua, e foram reanimados pelos deuses Navan e Luna.
     Os aumarinos já haviam completado sua rápida evolução biológica enquanto viveram em um novo mundo com atmosfera saudável, oceanos e lagos. A lua não era mais a mesma, tinha se tornado azul. E seria a primeira a sofrer os efeitos de uma catástrofe natural em massa já anunciada.
     Por razões desconhecidas dos humarantes, os deuses havia desaparecidos. Na verdade, estavam disfarçados em corpos de outros seres em longínquos locais do universo, evitando que Viga pudesse atingir seus objetivos.
     Até que um dia, a Esfera Navan surgiu na atmosfera da Lua e recolheu toda água e toda vida aumarina, transportando-os para um lugar ignorado do universo. Os deluvianos que controlam a astro-nave informaram apenas que foi ordem do próprio Deus Navan e que os aumarinos já estavam prontos para cumprir a sua missão. A Lua mais uma vez foi transformada, mas ainda preservando uma fina camada de atmosfera e água.
     Nesse período, um contato foi realizado com os deluvianos por Khufu, filho do Deus Snefru. Ele tinha o poder e os recursos necessários para manter a comunicação. Khufu era o mensageiro silencioso dos humarantes e os deluvianos eram o elo entre ele e os deuses.
      Antes de partirem, os deluvianos deixaram instruções aos humarantes de como deveriam se preparar para a grande viagem e que a Deusa Luna sabia das necessidades deles. A esfera da deusa foi transportada do antigo mundo do fundo dos oceanos e com a atuação da tecnologia humarante, atuou e desenvolveu um novo mundo no interior da Lua. Como aconteceu com os aumarinos em remotos tempos, todo o povo humarante foi transportado e concentrado em câmaras de hibernação. Depois, todo o conhecimento cultural, científico e amostras genéticas da biodiversidade conhecida na Terra foram recolhidos.
     Esse grande esforço coletivo de trabalho que duraram incansáveis 10 anos, não teria acontecido, se não fosse a imprescindível colaboração dos robs.
     Os robs eram máquinas de fundamental importância para os humarantes, pois as suas vidas estavam literalmente em suas mãos biossintéticas. Foram eles que manipularam a esfera azul que passou a gerar energia para o deslocamento da Arca Lua, como passou a ser chamada. Os robs faziam todo esse trabalho rapidamente e com precisão. Todas as leituras e cálculos de rotas definidas pelos deluvianos, nos intermináveis e complexos caminhos do universo, foram minuciosamente conferidos pelos robs.
     Viajando na hipervelocidade, a Arca Lua fazia paradas regulares a cada 100 anos e nesses intervalos, ficavam expostos às investidas dos aliados de Viga que os perseguiam, mas eles sempre escapavam.
     A Arca Lua não era uma astronave de combate, era um antigo casulo que foi adaptado para viagens intergalácticas. Possuía limitações de velocidades, de suporte de vida e desprovida de nenhum armamento de combate no espaço. Era frágil nesse aspecto. Seus escudos de energia até poderiam suportar uma batalha, mas não a sua preciosa carga.
     Durante toda a viagem, os robs monitoravam as funções vitais dos humarantes. Durante os intervalos da Arca Lua, os principais líderes de clãs eram reanimados de suas câmaras. Passavam alguns dias reunidos, recebendo relatórios de viagens e realizando exames clínicos. Foi nesses exames, que os robs perceberam que os organismos dos humanos sofriam mais as consequências da prolongada viagem do que os aumarantes. Havia o risco de morte ou falência de órgãos a cada 500 anos que estavam na câmara de hibernação, e esse foi o maior desafio dos robs, salvar a vida dos seus criadores.
     Os aumarantes conseguiram desenvolver a transmigração de consciência e memória genética, mediante a cultura de corpos clonados. Mas esses procedimentos só funcionavam com a sua raça e com a estrutura que tinham na Terra. Os corpos humanos não possuíam uma predisposição orgânica favorável para certos procedimentos como a dos aumarantes, uma herança adquirida dos aumarinos por milhares de anos de evolução.
     Quando uma nova reanimação dos líderes foi realizada, os robs relataram a situação. Houve momentos de muito silêncio, não tinham como prever quanto tempo os corpos poderiam sobreviver e quanto tempo duraria a viagem. A Arca Lua já estava com novas coordenadas definidas e sua esfera de energia recarregada e pronta para seguir sua jornada.  Até que os robs apresentaram a solução. Eles usariam a nanotecnologia e passariam a viver e interagir dentro dos corpos humarantes. Como nanorobs, poderiam controlar as funções vitais dos adormecidos e garantir sua sobrevida.
     Os líderes humarantes não tiveram outra opção a não ser aceitar e, autorizaram o procedimento. Um pequeno grupo de robs que cuidavam da navegação da Arca Lua e outros que eram médicos, não passaram pelo processo. Os demais robs, passaram a fazer parte do corpo dos humarantes. O resultado dessa decisão foi positivo, os corpos mantiveram as suas funções vitais e durante mil anos assim permaneceram.
     Quando a Arca Lua fez a sua última parada, se encontrava dentro de uma desolada vastidão. Nesse espaço intergaláctico do universo, onde não havia estrelas, os robs viram se aproximar uma gigantesca esfera de luz de uma categoria não conhecida. Eles receberam sinais reconfortantes de que não era hostil, que se nome era Áxis e que estava ali para conduzi-los ao seu destino final.
     A esfera revelou para os robs a sua nobreza e hierarquia, e enviou novas coordenadas a serem seguidas. Os robs informaram que os corpos adormecidos nas câmaras estavam debilitados e que a energia da esfera da Deusa Luna e os nanorobs é que os mantinham vivos. Os robs sabiam que a situação era crítica e que todos os recursos disponíveis já tinham sido feitos. O Deus Áxis fez algumas manobras em torno da Arca Lua, e como um scanner, lançou um poderoso foco luminoso sobre ela, confirmando as informações dos robs. O casulo não tinha condições de prosseguir. Foi quando a benevolente esfera se expandiu e absorveu totalmente a Arca Lua. Em poucos segundos depois, já estavam na entrada de uma bela galáxia. A viagem havia chegado ao fim.
     O Deus Áxis como os robs o chamavam, indicou alguns planetas muito próximos em que os humarantes deveriam provisoriamente ficar e onde existiam condições de sobrevivência. Durante esse período, os corpos eram reanimados por etapas e a Arca Lua realizava o transporte entre os mundos enquanto descobriam outros.
     Os humarantes ficavam confusos durante a recuperação, não acreditavam que passaram mil e trezentos anos viajando. Eles relatavam eventos e lembranças de atividades constantes e corriqueiras na Arca Lua, mas não lembravam que estavam em câmaras de hibernação. Isso se deve, por que os nanorobs sincronizaram projeções e emoções em seus cérebros. Os humarantes estavam em profunda letargia, mas tinha uma vida, produzida virtualmente pelos seus nanorobs. Foi quando já despertados e revitalizados, os humarantes perceberam que não existiam mais robs entre eles. Coube aos líderes de cada clã, explicar as medidas desesperadas que foram autorizadas para que todos pudessem ficar vivos. Houve muita comoção e agradecimento mental aos nanorobs, onde muitos deles sucumbiram no esforço de manter viva a maior herança de Tero Unua.
     Após dezenas de anos, a civilização humarante conseguiu florescer rapidamente. Em reconhecimento a grande obra dos robs e nanorobs, foi decidido que eles voltariam a conviver com os humarantes, que fariam parte deles e cada nova criança que nascesse em Áxis, seria agraciado pelo seu próprio nanoanjo, como foram carinhosamente chamados.
     E assim são os nanorobs, que há vários séculos depois da chegada do povo humarante ao seu novo lar, ainda habitam silenciosos os interiores dos seus corpos. Eles finalmente conseguiram perceber e experimentar as emoções e mais do que isso, adquiriram o prazer de um ser consciente, vivo e feliz.

Capítulo 8

LA ATAKO
(O Ataque)


     Todos os preparativos para a celebração da migração dos gruns estão prontos. O pátio do Castelo de Ar tok está totalmente ocupado pela sua população que se amontoaram aos milhares. A maioria dos presentes é nativa de Tryari, que já possui uma população multirracial bastante expressiva da Galáxia de Rhisvi.
     O monarca Gruner Ar acena para multidão e é ovacionado quando surgiu na sacada no alto do castelo, de onde sinalizará aos gruns para se concentrarem e partirem para a migração. O seu tutor Giambo Zoolie e o deluviano Truskas Zim estão ao seu lado e quando é dada a ordem, alguns bitinus sopram as grandes trombetas ao mesmo tempo. A população fica eufórica e levanta os braços entoando canções que desejam boa viagem e retorno seguro aos gruns. Após se acasalarem e seis meses depois, os gruns retornam com os seus filhotes, representando o início de um novo ciclo no calendário do planeta.
     Mas nem todos estavam ali nesse momento solene e importante na cultura de Tryari. Um pequeno grupo de cientistas, orientados pelo tryariano Wustah Drac, recebe o resultado dos exames químicos dos oitos gruns que foram resgatados. O cientista chefe quando olha o resultado num cartão de cristal, fica eufórico e emite um alerta para que a segurança comunique ao regente imediatamente.
     Nesse mesmo instante, centenas de gruns já sobrevoam em círculo ao redor do pátio, e alguns muito próximos de onde se encontra Grunner. O regente ergue os braços e aos poucos, os gruns finalmente iniciam sua migração.

     Diante de tanto barulho, da população, das trombetas e dos gruns, Gruner não percebe que um dos gruns que está alguns metros acima da sacada, fecha as asas se precipita sobre ele para atacar. No momento é que o animal abre as garras para lhe desferir o golpe fatal, o líder dos gruns intervém, jogando o grun agressor contra a parede. Gruner cai no chão e é amparado por Giambo.
     O grun inimigo se recupera rapidamente do impacto e parte para cima do grun líder e uma seqüência sanguinária de golpes mortais acontece no ar. Eles se prendem em suas garras e caem girando batendo nas paredes das torres. Wustah chega com uma guarda e avisa para Truskas que os gruns capturados são na verdade aturianos disfarçados. Os outros gruns inimigos também partem em vôo rasante para atacar Gruner e são defendidos por outros gruns que o defende. Truskas retira uma arma escondida em suas vestimentas e atira nos gruns aturianos. A munição luminosa desvia dos gruns amigos e acerta os gruns inimigos fazendo-os derreter.
     As maiorias dos gruns que migraram não perceberam o ataque, apenas os gruns do regente que são últimos a deixá-los. No pátio, a população observa atônito o estranho evento e se dissipa assustada. O grun líder voa para o alto da sacada, trazendo desmaiado o primeiro grun que liderou o ataque contra Gruner. Ao jogá-lo no chão, a guarda de segurança lança um jato de líquido amarelo no animal, prendendo-o no chão.
     Truskas se aproxima de Gruner:
- Está ferido?
- Não. Eu estou bem! Mas o que está acontecendo aqui?
     Wustah se aproxima:
- Comentemos um grande erro majestade! Liberamos os gruns cedo demais. Os exames provaram que seus corpos possuíam resíduos de arsênico, típico dos aturianos.
- Um ataque premeditado – comenta Truskas
     Gruner se movimenta até o parapeito da sacada e observa a população:
- Não tenho dúvidas disso! Fomos ingênuos e confiantes demais. Todo cuidado é pouco quando se trata de aturianos. Alguma contaminação em nosso povo?  
     Wustah responde com segurança:
- Seguramente não houve. Os gruns foram liberados no momento que os demais estavam prontos para migrarem.
     Gruner chama os gruns de sua proteção pessoal que lutaram com os inimigos e faz sinal para que eles entrem na janela da torre. Os animais obedecem e a janela se fecha. O grun líder não entrou, ele se aproveita da distração de todos e desce para o abismo que fica abaixo do castelo.
- Esses gruns estão de quarenta! Se não foram contaminados liberte-os para cumprir a sua jornada.
- Sim majestade – responde Wustah – Dessa vez precisamos de menos tempo para confirmar isso, o exame será bem específico, amanhã serão liberados.
     Gruner se aproxima do grun aturiano, Truskas adianta o corpo insinuando cuidado. Gruner balança a cabeça informando que está tudo bem, mas Truskas recarrega a arma e o acompanha.
- Por que me atacou? O que quer? – pergunta Gruner
     Com uma voz gutural, o inimigo totalmente imobilizado responde com grande esforço:
- Você ou seu povo! Você se entrega a nós e seu povo vive!
- Por que eu faria isso? – Gruner pega a arma de Truskas e aponta para a cabeça do prisioneiro.
- Vai me matar? Seu pai seria mais tolerante! – engasga o falso grun.
- Do que está falando?
- Príncipe Gruner, filho de Navan e Lilith! Nunca lhe contaram? Está sendo traído por aqueles que lhe protegem!
     O monarca chama os guardas e estes anestesiam o grun, levando-o de volta ao cativeiro com redobrada segurança.
     Gruner olha para Truskas e Giambo.
- O que ele está falando?
- A verdade que sempre esteve em seu coração majestade, e que precisava ser revelada no momento certo – explica Giambo.
- Verdade? Sobre os meus pais?
- É uma longa história senhor – interrompe Truskas – Sugiro que se recupere em seus aposentos e mais tarde lhe contaremos toda a verdade.
     Com as mãos, Giambo humildemente mostra o caminho para Gruner.
- Por favor, majestade, confie em nós.
     Em silêncio, Gruner se dirige para a sacada e ainda ver o restante da população seguindo para os seus lares. No horizonte, ainda percebe a sulhueta de gruns em sua longa viagem até as altas montanhas. Ele se vira e olha para Truskas e Giambo.
- Quem mais poderia confiar? Encontro vocês nos meus aposentos. Não se atrasem.
     Gruner se retira entregando a arma para Truskas e pondo a mão gentilmente na cabeça de Giambo. Os dois se entreolham.
- O momento chegou – disse Giambo – Ele tem o direito de saber!
- Nunca negamos esse direito, só o protegemos dele – responde Truskas.
- Como será que ele vai reagir?

- Ele ama seu povo e todos dessa galáxia. Saberá tomar a decisão certa.
No fundo do precipício, pousado numa pedra, o grun líder observa no solo a chegada de um homem encapuzado que se aproxima devagar. O animal alça vôo e pousa em sua frente.
- Essa foi por pouco! – disse o encapuzado – Nos surpreendeu.
     O grun líder se ilumina e se transforma em Seth.
- Vão perceber em breve a minha ausência, preciso retornar a torre.
     O homem retira a cobertura e o rosto de Latem aparece.
- Faça isso, aguardarei você na Lua Negra.
     Seth volta a se iluminar, transforma-se no grun líder e alça vôo. Latem observa com atenção, põem a cobertura na cabeça e segue andando tranquilamente, em pouco tempo estará fora da cidade.
     Gruner entra em seu quarto. Troca de roupa e segue para o cativeiro sem que Giambo e Truskas soubessem. Ele encontra Wustah e pede explicações mais detalhadas sobre essa habilidade dos aturianos em imitar formas.
- Essas imitações nem sempre são perfeitas majestade. Mas nesse caso é impressionante! O aturiano replicou perfeitamente o nosso grun. Acredito que ele seja mais próximo de uma raça pura.
- Então quanto mais puro, mais perfeita é a cópia?
- Sim majestade. Temos muitos registros antigos que confirmam isto. Mas é a primeira vez que nos deparamos com um caso assim.
- Ele pode copiar sem que toque ou coma o ser em questão?
- Uma amostra de sangue é o suficiente. Mas quanto mais contato tiver com o ser original, mais rápido é transformação.
- Desperte-o! Quero ficar a sós com o prisioneiro. Fique do lado de fora, não quero que ninguém saiba que estou aqui.
     Wustah obedece, borrifa um spray no rosto da fera e ao sair, não resiste à obrigação de falar com o regente:
- Tenha cuidado majestade. São seres muito ardis.
- Veremos!
     O aturiano desperta um pouco confuso. Gruner inicia o interroga:
- Então Viga já está com planos de nos atacar de novo. E para isso, manda a sua escória de aturianos!
     Engasgado, o aturiano não consegue articular a palavra na forma de grun:
- Renda-se!
     Gruner percebe que não vai conseguir extrair informações do grun aturiano. Ele chama Wustah e ordena que mantenha o prisioneiro sedado.
- O que sabemos sobre a fisiologia dessas criaturas, além de copiar outras?
- Temos alguns registros enviados pela federação. Um deles se refere à preservação de memórias corporais antecedentes.
- É possível reverter alguma delas? Esse grun não consegue falar. E o mais curioso, fala a nossa língua.
     Wustah acessa um banco de dados:
- Os humarantes conseguiram fazer algumas reversões pesquisando e usando drogas com efeitos semelhantes aos inibidores neurais. O idioma Tryari é o mais falado em nossa galáxia, possivelmente esse aturiano absorveu essa habilidade de alguma cópia. A reversão de últimas cópias varia para cada aturiano. Quanto mais puro, mais cópias são possíveis reverter, aqui diz que a memória linguística é permanente, uma habilidade nata da sua espécie e não adquirida, não se conhece sua forma de comunicação original.
- Nós temos como produzir essas drogas?
- A federação compartilhou com vários povos aliados a formula para a produção de um composto que identifica um aturiano, a mesma que usamos em Tryari, esse espécime deve ter desenvolvido alguma resistência natural, dificultando sua identificação.
- E quanto à reversão?
- Majestade, a federação também descobriu como processar a reversão.  Essa última necessita de uma amostra pura do DNA da última espécie copiada. Os aturianos copiam muitos seres no universo que são praticamente impossíveis de coletar amostras.
- O que não é o nosso caso, temos amostras dos nossos gruns?
- Temos tudo sobre os gruns, majestade. Nossa tecnologia não é avança como a dos humarantes, mas até nisso eles pensaram.
     Wustah vai até um armário e retira uma caixa hermeticamente fechada com um display de segurança. Ele digita algumas séries e um lacre se abre. Gruner se aproxima curioso.
- Aqui está majestade. Em algumas horas com esse equipamento, a formula estará pronta. Só para complementar, se as cópias reversas demorarem mais de uma hora não haverá como reverter o processo.
- É permanente?
- Não se sabe ao certo. Mas usando a formula inicial não será mais possível, seu organismo já fez uma leitura de defesa, teria que ser outra droga. São criaturas complexas. Todos os DNAs absorvidos de cópias reagem diferentes ao tempo de permanência, o que se sabe é que os inibidores fazem seu corpo perder a capacidade de copiar, regenerar e de se curar.
- Então morre?
- Sim, majestade. Foi o que aconteceu em todos os testes. Eles não só absorvem as características dos seres que copiam, mas também as suas deficiências genéticas e suas doenças. Ele morre sofrendo de todas elas ao mesmo tempo. Seu corpo vai apodrecendo e depois resseca. Um sofrimento muito justo pelo custo de vidas por eles ceifadas.
- Prepare a fórmula! Vamos usá-la! Avise-me assim que estiver pronto.
- Farei majestade.
     Gruner vai ao encontro de Giambo e Truskas. Ele entra na sala e os encontra com uma fisionomia preocupante.
- Majestade – saúda Giambo.
- É bom vocês terem uma boa história para contar e, por favor, só a verdade!
- A verdade é tudo que nos interessa, majestade – disse Giambo – Estamos cumprindo nosso dever como foi determinado pela sua mãe, a Deusa Lilith.
- Deusa? Então ela não morreu?
- Não, majestade. A expressão deusa não é por acaso. Ela é ser dimensional, uma co-criadora. O senhor é um semideus e...
     Gruner interrompe:
- Meus amigos. Conheço vocês há muito tempo e vamos deixar as formalidades de lado. Sabem que nunca apreciei isto.
     Truskas olha para Giambo:
- Existe uma maneira mais fácil dele entender.
- Entender o que? Vamos lá! Chega de mistério! Temos um problema sério para resolver, nosso povo foi ameaçado! – Gruner começa a perde a paciência.
     Truskas fecha os olhos e levanta a cabeça para cima. Mentalmente ele envia uma mensagem. O ar na sala se torna frio e três fachos de luz recaem sobre eles.
     Gruner fica surpreso. Encontra-se numa galeria vazia, dividida em arcos cujo teto é suportado por altas e grossas colunas.
- O que está havendo?Onde estamos?
- Fomos teletransportados, majestade – explica Truskas – Estamos dentro da Lua Negra, próximo ao Planeta Tryari. Sabemos que tem muitas perguntas. Queira nos acompanhar.
     Giambo acelera os passos logo atrás.
     Eles caminham pelo corredor da galeria.
- Lembra-se bem dos nossos estudos? E da presença dos deuses em nossas vidas?
- Sim Giambo, lembro. Mas sempre achei que seria mais uma lenda do nosso povo.
- Não é majestade. Esse lugar, por exemplo, é um legado da sua mãe.
- Existe outra igual a essa?
- A Estrela Navan – responde Truskas – A mais poderosa de todas. Esses corpos celestes foram criados para percorrer imagináveis distâncias no universo, sua força de ataque e defesa são perfeitas.
- As forças de Viga sempre sucumbem quando ela está presente – completa Giambo.
- Muitas vidas foram perdidas, muitos povos e planetas extintos. Nem sempre estavam quando foi preciso. A Galáxia Rhisvi foi uma das mais devastadas – lembra Gruner, instruído pelas histórias de Giambo.
- É verdade majestade – responde Truskas – Não conhecemos as movimentações dos deuses, mais confiamos nas suas providências. A perseguição de Viga é implacável. Suas forças sempre atacam e escravizam os seres indefesos para chamar atenção.
- A Lua Negra foi deixada pela sua mãe para ajudar na sua proteção e de Rhisvi. Estamos seguros, majestade – diz Giambo.
- Nunca é o suficiente. Sempre haverá falhas. Um grupo de aturianos copiados de gruns penetrou nossas defesas e nos atacou. O que mais virá? O que Viga deseja não são as criaturas do universo, ela quer algo mais. O aturiano disse “Você ou seu povo! Você se entrega a nós e seu povo vive!”.
- Uma ameaça a mais majestade – Giambo tenta convencer.
- Quem é o meu pai?
- O Deus Navan majestade. Sua concepção aconteceu no mesmo planeta em que os humarantes vieram, a Tero Unua. Por isso a sua semelhança física. Os seus pais assumiram uma forma orgânica. Sua mãe lhe deixou aos nossos cuidados com recomendações de lhe revelar toda a verdade.
- Filho de deuses, concebido em Tero Unua? Isso me faz um semideus humarante?
- De fato majestade. É a sua espécie.
     Gruner analisa os fatos:
- Pelo que percebi nas histórias, os deuses se escondem entre as criaturas tomando suas formas, não é muito diferente dos aturianos nesse aspecto! –
- Uma comparação um tanto exagerada majestade – adverte Giambo – Seus pais protegeram muitas vidas nesse universo.
- E por que não eliminam Viga? Acaba logo com esse sofrimento? O que tanto Viga deseja? O que os deuses temem?
- Não sabemos majestade.
- Você tinha razão Giambo! São muitas perguntas e vagas respostas! Queriam os meus pais, como eles não estão aqui, querem o seu filho! Eles não querem me matar, querem algo que eu tenha ou que possa representar!
     Truskas e Giambo observam o comportamento temperamental de Gruner, típico do povo de Tryari, conflitando com as conclusões lógicas e sensatas dos seus pais.
- Então explica tanto esforço dos aturianos – continua Gruner - Eles queriam me capturar e não copiar o meu DNA. Mas com qual propósito? Usar de isca para atrair os deuses? Não sou mais importante do qualquer outra criatura que vive nesse universo!
- Ter a sua vida em risco é uma razão muito forte para Viga conhecer a fúria dos deuses, majestade. Ela não ousaria. Mas não sabemos o que está acontecendo de fato, pode ter sido uma insurgência localizada – comenta Giambo.
- Truskas! Já recebemos respostas da Federação Áxis?
- Não majestade. Já deveriam ter respondido.
     Gruner abre os braços e gira lentamente o corpo.
- Estão vendo? Garanto que se enviarmos agora um aviso de emergência eles não vão responder!
     Truskas e Giambo sabem que por ser um semideus, Gruner tem poderes intuitivos que ainda não sabe controlar e que sempre foram seus verdadeiros guardiões. Eles não podem interferir nessa manifestação divina, mas entregariam as suas vidas para ela numa simples ordem do filho dos deuses.
     Gruner escuta uma voz feminina chamando o seu nome. Ele para e pergunta a Truskas e Giambo se eles escutaram. Ambos dizem que não. Gruner vai andando lentamente e chega à área central da galeria. No piso, encontra-se uma mandala de círculos separados por outros. Gruner caminha até o meio do círculo, toca a mão sob o piso e uma brilhante esfera negra surge, flutuando sobre ele. Mais uma vez, ouve uma voz doce e amigável.
- Gruner, meu filho. Sou eu, sua mãe.
- Mãe?
     Truskas e Giambo não conseguem ouvir a voz, mas sabem que a Deusa Lilith com quem ele está falando. Eles se ajoelham em sinal de respeito, e depois ficam completamente surdos. Observam os lábios de Gruner articulando palavras, mas não conseguem entender.
     Gruner agora consegue ver a sua mãe, mas não pode tocar na sua imagem. A deusa explica que está muito longe dali e que espera o dia em se encontrar com ele. Ela explica o que está acontecendo e deixa instruções para o filho seguir. A audição de Truskas e Giambo volta ao normal, eles não só conseguem escutar a deusa com também vê-la.
- Levantem meus fiéis amigos. Sou grata por tudo que fizeram pelo meu filho. Estamos novamente enfrentando tempos difíceis. Os inimigos se preparam para atacar e desta vez estão mais fortes e em maior número. Nossos filhos carregam em seu ser, a chave que abrirá o caminho para os deuses continuarem a sua jornada e finalmente libertar essa dimensão da tirania. Mas para isso, é preciso que todos os seres se unam e nos ajude nessa última batalha pela vida, pelo direito de existir, de evoluirmos e conhecer outras verdades.
- Nosso povo é grato pela vida e pela formação da nossa existência, minha deusa. Também lutaremos pelo nosso destino divino, que um dia seguirá seus passos – responde Giambo.
     Truskas entoa um mantra ritualístico sagrado dos deluvianos e completa a frase em sua língua nativa que diz: “Em tua vida, a nossa vida prospera”.
     Eles não percebem, mas um coral de vozes de dezenas de deluvianos que os cercam, repetem a frase sagrada proferida por Truskas. Esses deluvianos que discretamente se aproximaram atraídos pela forte vibração da deusa, são os antigos guardiões e condutores da Lua Negra.
     A Deusa Lilith se despede do filho e a esfera retorna para o interior da astronave. Gruner se aproxima de Truskas e Giambo:
- A verdade já é conhecida. Sou grato.
- Estamos aqui para lhe servir majestade, sabemos que os deuses têm um propósito para todos nós – responde Gruner.
     O deluviano pergunta do regente:
- O que faremos?
- Vamos nos encontrar com Wustah no laboratório! Tive uma idéia e acho que vamos ganhar tempo.
- Tempo? Majestade – pergunta Giambo.
- Os aturianos querem capturar os filhos dos deuses, somos partes de algo muito maior, para que os co-criadores completem a sua jornada. E Viga quer impedi-los. Tivemos sorte de descobrir a tempo de poder protegê-los. Vocês já sabiam disso eu presumo?
- Não conhecemos todos majestade. Mas sabemos que Mei é sua irmã – responde Truskas.
- Como vamos encontrar os demais? – pergunta Giambo
- Usaremos a Lua Negra. Quando eu estiver com a minha irmã, conseguiremos encontrar os outros semideuses. Mas antes, precisamos convencer as forças de Viga que o filho do Deus Navan e da Deusa Lilith foi finalmente capturado.
     Giambo não endente os planos de Gruner que pede a Truskas o retorno para Tryari.
     No laboratório, o ambiente fica frio. Um deslocamento de ar faz vibrar alguns equipamentos. Wustah não consegue entender o que está acontecendo e antes de sair correndo, se depara com as faixas de luz trazendo Gruner, Truskas e Giambo.
- Vai a algum lugar? – pergunta Gruner, se divertindo um pouco com a expressão de medo de Wustah.
- Majestade!
- Se acalme, preciso que você nos ajude!
- O que devo fazer?
- É verdade que alguns povos adoravam os aturianos e havia sacrifícios voluntários para servi-los?
- É só uma lenda majestade. Não temos como provar.
- Acredite Wustah! Algumas lendas têm um fundo de verdade – Gruner olha para Giambo e Truskas.
- Não estou entendendo, majestade – disse Wustah.
     Gruner se aproxima do grun aturiano:
- Chegamos à conclusão que este prisioneiro aturiano é muito próximo da raça pura. Eu pergunto: Uma doação voluntaria de fluidos poderia criar uma cópia perfeita de outro ser? E o mais importante! Poderia sustentar essa imagem por vários dias?
- Em teoria sim. Majestade. Mas o doador deveria ter uma saúde perfeita, uma vitalidade de um jovem e um motivo muito forte para fazer isso.
     Gruner olha fixamente para Wustah ao ponto dele compreender as suas intenções:
- Não! Majestade. O senhor não pretende...
     Gruner oferece o braço para que Wustah colha a quantidade necessária de sangue e outras amostras para fazer um composto e injetar no grun aturiano. Ele explica os detalhes de quais alterações genéticas devem ser feitas e segue para os seus aposentos.
     Horas depois, Wustah avisa para todos voltarem ao laboratório.
- Aqui está majestade – disse Wustah – Esse composto é perfeito. Estou impressionado com a qualidade da sua saúde, suas taxas são incrivelmente equilibradas até para os da sua espécie.
- Podemos fazer o teste?
- As sua ordens majestade.
     Truskas engatilha a arma e olhar para Gruner.
- Apenas por precaução – fala o gigante deluviano.
     Wustah injeta o composto no grun e este começa a se contorcer e se transformar em poucos segundos numa cópia nua e perfeita de Gruner.
- Funcionou! – Giambo fica impressionado – Está respirando.

- Quanto tempo levará para confirmar suas condições? – pergunta Gruner.
     Wustah retira uma amostra de sangue do falso Gruner adormecido e põem num equipamento de leitura.
- Impressionante! Não temos leitura de degeneração celular acentuada, e não há nenhum sinal evidente que seja um aturiano. Ele não pode mais copiar nenhum ser vivo  – revela Wustah – Mas por segurança vamos esperar alguns dias.
- Quero que minha cópia seja bem tratada e que tudo fique em segredo! Ninguém além de nós pode entrar nesse laboratório.
     Gruner caminha para sair do local quando o aturiano fala com a voz sonolenta:
- Tenho fome.
- Espere majestade. Acho que já podemos tirar algumas conclusões – disse Wustah.
     O cientista se aproxima do aturiano.
- Você sabe falar?
- Sim.
- Quem é você? – pergunta Gruner.
- Não lembro.
- Seu nome é Gruner, monarca de Tryari.
- Gruner, monarca de Tryari. – repete o aturiano.
     O verdadeiro Gruner faz sinal para que todos fiquem em silêncio.
- Você está aqui para proteger o seu povo – Gruner inicia uma série de sugestões hipnóticas.
     Truskas se aproxima de Wustah.
- É perigoso?
- É difícil dizer, mas acho que no momento ele é um ser que acabou de nascer. O inibidor cerebral é muito potente, criou uma disfunção mental permanente, como era previsto. Ele não terá discernimento, apesar de parecer receptivo a sugestões mentais, sua expressão será essa, de um ser derrotado, fraco e humilhado.
- Ele recebeu um sangue saudável, geneticamente perfeito, sua expectativa de vida poderá se prolongar indefinidamente, como ele morrerá? – pergunta Giambo.
     Wustah responde:
- Não podemos arriscar em deixá-lo viver sem nosso controle, por isso alteramos a sua imunidade a nível celular. Ele estará vulnerável a qualquer ambiente insalubre, viroses e bactérias. O fato de não existir degeneração celular acentuada, não quer dizer que ele já não esteja morrendo.
- Então ele poderá adoecer ainda em nosso convívio?
- Sim Giambo, isso é possível. Infelizmente não podemos manter o laboratório esterilizado, ele necessita de uma câmara de hibernação.
- Truskas! O que você sugere? – pergunta Gruner.
- Temos câmaras de hibernação ativas na nave em que os gruns contaminados vieram. Poderemos deixá-lo lá, pronto para entregar ao inimigo. Podemos fazer ajustes para que a nave seja controlada a distância, assim não arriscará a vida de nenhum piloto.
- Perfeito! Prepare a nave o mais rápido possível e deixe-a na plataforma real. Quero uma guarda permanente no local, ninguém poderá entrar ou sair!
- Será providenciada, majestade – Truskas se retira do laboratório.
- Giambo e Wustah! Preciso que vocês estejam atentos ao que vou dizer. Vou seguir com Truskas para a Galáxia de Áxis, preciso encontrar minha irmã.
- Irmã? Majestade – Wustah fica confuso.
- Isso mesmo! Minha irmã, seu nome é Mei. Sei que parece estranho, mas confie em mim, Giambo explicará tudo para você. Não sabemos quando o inimigo chegará, mas sinto que será em breve. Eu não estarei aqui, seguirei com a Lua Negra.
- O que faremos majestade? – pergunta Giambo.
- Mantenha o povo calmo. Acredito que as forças de Viga não atacarão o planeta se o seu líder se entregar pacificamente. Ative o controle da nave e envie esse aturiano para eles. Quando partirem, quero que alerte toda a Galáxia de Rhisvi, que eles se preparem para a uma guerra.
     Giambo abaixa a cabeça e é consolado por Wustah que põem a mão em seu ombro.
- Sempre temi esse dia majestade. Desde que a rainha mãe retornou de Tero Unua que acompanho a sua gestação e tive a honra de ser seu tutor. Agora, vejo que os tempos de paz mais uma vez chega ao fim – lamenta Giambo.
- Meu fiel tutor. Não tema. Faremos todos os sacrifícios possíveis para que a paz volte a reinar, não só aqui em Rhisvi, mas em todo o universo. Use todos os recursos necessários para manter o inimigo distante do nosso povo. Ela estará em suas mãos, eu voltarei!
- Farei o que ordena majestade. Tenha cuidado! – Giambo abraça o regente.
     Gruner partiu com Truskas para a Lua Negra e segue para a Galáxia de Áxis na esperança de achar a sua irmã.


Capítulo 9

PLANEDO CORONI
(Planeta Coroni)
 

     Já fazia alguns dias que Aurora Mi havia chegado à Cidade de Estania, a capital do Planeta Corini, localizado na extremidade oeste da Galáxia de Áxis.
     Uma grande reunião de familiares e amigos de outros clãs estão presente às margens do Lago Lujik para a celebração de casamento de Smarvi Novik e Nida Mi.
     Aurora está feliz ao lado da prima e sonhando como será o seu casamento com Akash. Mantendo a tradição, os casamentos são sempre realizados na Cidade de Estania, uma bela região cercada de muitos lagos e rios com águas translúcidas. Foi no passado, um dos primeiros pontos de desembarque de humarantes trazidos pela Arca Lua, tornando-se com o tempo um lugar sagrado, de contemplação, meditações e cerimônias.
     Não existe atividade mais importante no planeta que não seja a agricultura e tudo a ela relacionados. O Planeta Coroni é o principal fornecedor de alimentos para a Federação Áxis, e a qualidade dos seus produtos é o resultado de muito trabalho e dedicação do seu povo.
     Os hábitos do Coronianos são muito simples. As crianças desde cedo aprendem a lidar com a terra, conhecer as sementes e plantá-las adequadamente. Quando são jovens, escolhem as mais diversas profissões que darão suporte as atividades agrícolas. O seu calendário de eventos é o mais celebrado dos povos humarantes. Com exceção dos casamentos e nascimentos, as demais festas estão reservadas em agradecimento as colheitas.
     Todo coroniano tem duas residências, uma no Hemisfério Norte e outra no Sul. Eles se movimentam de acordo com o clima e sazonalidade das estações. Esta migração não é obrigatória, mas necessária, apesar de sempre ficarem alguns mantenedores em suas regiões. Os períodos relacionados às fortes chuvas e nevascas, deixam o solo impróprio para o cultivo numa parte do planeta, enquanto que em outras é o momento certo de plantar. Para cada clima se desenvolve várias técnicas de cultivo sustentável e as migrações em família são sem dúvida um dos momentos mais esperados.
     Aurora se aproxima da prima:
- Você está muito bonita!
- Dankon! Soube que Akash lhe pediu em casamento e estou muito feliz por você.
- Você não imagina quanto prima!
     Nida se aproxima de Aurora e sussurra em seu ouvido:
- Sempre soube que Akash te amava, o que eu sinto por ele é uma profunda admiração. Mas me diga prima, quem em Áxis não sente isso – Sorrir Nida.
- É verdade! Ele é maravilhoso – Aurora retribui o sorriso.
- Quando pretende se casar?
- Ele estará em breve entregando o comando do Sankta Spirito e vem para Coroni definitivamente. Meus pais já sabem das suas intenções e também estão muito felizes.
- E a estação? O seu trabalho?
- Nada agora é mais importante do que está no meu planeta natal, com minha família e o meu amor. Vou decidir com Akash onde daremos a nossa colaboração. Também queremos ter filhos.
- Entendo – Nida segura à mão da prima – Vocês serão muito felizes.
- Vocês ficaram na embaixada?
- Sim! O trabalho na embaixada me uniu a Smarvi. Há muito o que fazer, temos muitos planos. Ele assumira o lugar do pai.
- Tenho certeza que vocês farão uma grande diferença e o deixará muito orgulhoso. Venha nos visitar.
- Sempre que for possível. Será mais fácil agora, que viajaremos com Sankta Spirito. Diga-me, estou curiosa, como é lá dentro?
- É incrível! Não foi possível conhecer tudo, mas você entenderá quando estiver lá.
- Não vejo a hora.
     Smarvi se aproxima exibindo um elegante traje de cerimônia:
- Atrapalho as damas em tão animada e secreta conversa?
- Smarvi! – Aurora o abraça e beija a face – Assuntos femininos, mas bem interessantes!
- Posso imaginar – Smarvi ergue as sobrancelhas – Vamos? O sagrado nos aguarda.
     Todos se reúnem ao redor dos noivos. As cores do entardecer parece moldar o cenário romântico. Todos estão em silêncio e compenetrados nas palavras do Sagrado, representante de cerimonial religioso, que segura duas taças de puro cristal com água do Lago Lujik. Perto dali, algumas crianças se divertem no gramado atirando fitas para o ar.
      Smarvi e Nida se emocionam com as doces palavras e votos. Bebem a água das taças e se beijam. Os convidados atiram fitas para o ar e uma pequena orquestra e coral jovem completam a cerimônia.
      Os noivos são cumprimentados e abraçados pelos familiares e amigos.
     Inesperadamente, a luz do crepúsculo é ofuscada por negras nuvens que se deslocam. O céu escurece deixando todos curiosos.
- O que será isso? – pergunta Smarvi.
     Nida o abraça assustada.
- Esta se movendo em nossa direção! – alerta Aurora.
     Perto do lago, algo assusta as crianças que correm e choram apavoradas.
- As crianças! – Grita Smarvi – Peguem as crianças!
     Por instinto e medo, todos correm para os abrigos e tentam se proteger. Muitos caem no chão, enquanto outros ajudam a levantar e ninguém entende o que está acontecendo. Um zumbido forte abafa os pedidos de socorro.
     Aurora segura uma criança e corre com ela nos braços. Ela tropeça e cai, tenta se levantar e não consegue, sua visão fica turva, seu corpo entra em espasmo. Ela tateia o solo com as mãos tentando achar a criança, mas está sem forças. Ela se deita ela olha para o céu chamando o nome de Akash. Um alienígena se aproxima e a observa de perto. Aurora perde os sentidos.
Capítulo 10

KAPTILO
(Armadilha)


     Já havia se passado vários dias na Estação Fronteira Norte. O Capitão Adani e o Tenente Lido pacientemente revezavam as atividades de monitoramento. Toda energia da estação havia sido canalizada para célula de observação e os mastros fixados no asteróide. Nenhum trabalho rotineiro de comunicação estava sendo realizado. A estação estava temporariamente desligada. O Tenente Lido permanecia relaxado na cadeira da célula, parecia dormir, no entanto estava concentrado em escutar o menor sinal específico das partículas migrantes. A monotonia e o silêncio aumentavam as expectativas dos oficiais, até que um bip eletrônico muda tudo. O Tenente Lido avisa que tem leituras da aproximação:
- Vou para o deque de embarque! Quanto tempo até chegar aqui?
- Estão avançando rápido! Já estou deslocando para posicionamento!
     O asteróide da estação ativa os propulsores e segue para um ponto determinado no espaço, exatamente onde as partículas migratórias vão passar. O Capitão Adani confere mais uma vez a armadilha e aguarda o sinal do Tenente Lido.
- Algum contato visual? – pergunta o Capitão.
- Tenho as miragens! Estamos em seu caminho! Faltam 10 minutos!
- Ative a invisibilidade e concentre a energia para a câmara!
     Os mastros do asteróide iniciam o funcionamento criando uma atmosfera de gases e faíscas elétricas tornando-se invisível. A estação fica completamente escura.
- Faltam 30 segundos! – avisa o tenente – A câmara já está programada para ser ativada.
- Muito bem! Silêncio de rádio.
     No momento exato, uma pequena luminosidade aparece dentro da câmara seguida de uma névoa com movimentos rápidos. O Capitão Adani se aproxima do vidro de proteção, ele observa curioso. O que havia capturado não é exatamente o que imaginava.
- Mas o que será isso?
     A névoa se dissipa e surgi um ser alienígena desconhecido dentro da câmara. As luzes de emergência da estação acendem.
- Adani! Já estão fora de alcance! Capitão! Capitão! – insiste o tenente.
- Estou aqui! Contate as estações de fronteiras! Emita um alarme e envie as provas!
- Não consigo! Ainda tenho muita estática! O campo eletromagnético do asteróide ainda não dissipou!
- Continue tentando! Use todos os satélites de órbita!
- Não recebo sinais das estações!
- O que? Envie o sinal de alerta para a Estrela Farol em Rugo!
- Não consigo! O campo de partículas migratórias bloqueou a transmissão! Eles estão seguindo para Rugo!
- Damne! (Maldição) – o capitão se irrita com a situação fora de controle.
- Kio okazas? (O que está acontecendo?)
- Temos um alinígena aqui na câmara! E pequeno e dos mais feios!
- Mi ne komprenas! (Eu não entendo!)
- É uma invasão silenciosa em Áxis! Nunca vi essas criaturas antes! Parece
com anfíbios! Deixe as gravações abertas e compartilhadas com os sinais
de transmissão! Venha para o deque! Rápido!
     Silêncio no rádio e som de disparos:
- Lido! Tenente na escuta! – o capitão insiste.
     A criatura confinada na câmara desperta e solta gritos horrendos.
     O Capitão pôem a mão nos ouvidos e cai no chão. O vidro da câmara estilhaça.  A criatura sai devagar e confusa, cheirando e identificando o ambiente.
- Mas o que é você? – disse o capitão.
     O alienígena vira a cabeça e olha para ele que retira as mãos sangrando dos ouvidos.
- É cego? – pensa o capitão, que põem a mão no coldre, mas não consegue retirar a arma. Sua mente e corpo estão dominados. Ele escuta os pensamentos da criatura em sua cabeça.
- Vi estas stultulo!(Você é um idiota!) – pensa o alienígena, enquanto balança os dedos e move a cabeça de uma lado para outro.
- Quem é você! – Fala alto o capitão.
- Mia nomo estas... (Meu nome é...)
     A criatura deixa sair lentamente dos seus dedos, garras longas e afiadas como agulhas.
- La morto! (A morte!)
     Salta em cima do Capitão Adani, que a única reação que pode ter é fechar os olhos.
     O capitão sente sua mão ser puxada.
- Adani! – chama o Tenente Lido.
      O capitão abre os olhos e ver o tenente. Ele não escuta bem, a sua audição foi comprometida pelo som da criatura. Mas fica feliz ao saber que recuperou os movimentos do corpo. Ele se levanta com a ajuda do tenente e olha para a criatura queimada com um tiro preciso do tenente,
- Tre bone! (Muito bem!)
- Adani! Temos que sair do asteróide!
- Não escuto bem!!! – grita o capitão.
- Temos que sair do asteróide! – grita o tenente no ouvido do capitão – O campo eletromagnético não dissipou por que outros alienígenas, diferente desse, estão se materializando na estação! Atirei em dois deles até chegar aqui! São grandes e feios!
- Sempre são feios! Vamos para nave!
     As luzes vermelhas de emergência agora piscam com um som de alarme. A estação identificou presença alienígena e travou as portas automaticamente. O capitão e o tenente por sorte, estavam no deque e próximo a sua nave. As portas se envergam com as fortes batidas e gritos. A plataforma de lançamento se ergue e uma escotilha no teto se abre. A nave deixa para trás o asteróide.
- O que vamos fazer! – grita o tenente.
- Não grite! Meu ouvido doi! Vamos explodir a estação!
- A estação não tem sistema de autodestruíção!
- Não tinha! Mas nos trouxemos as cargas extras para os mastros lembra? Posso acioná-las daqui em modo de autodestruição! Vai causar uma reação em cadeia e uma grande explosão nuclear!
- Entendi! Vai matar aqueles monstros e as estações de Rugo vão captar a explosão do asteróide!
- É essa a idéia tenente! Acelere! A coisa vai esquentar!
     O capitão aciona o controle remoto das cargas e uma explosão de luz em forma de bolha, lança uma onda de choque no espaço no exato momento em que a nave desaparece na hipervelocidade.

Capítulo 11

PLANEDO KOLONJO
(Planeta Kolonjo)

      Na Cidade de Cristal, a Embaixadora Suna Levigo é avisada que o General Anor Meadhas solicita uma audiência. Ela segue para um salão de recepção e observa o teletransporte do oficial.
- Saudações, Embaixadora Levigo.
- Seja bem-vindo, General Meadhas.
     Ambos fazem uma reverência abaixando levemente a cabeça.
- Vim conferir pessoalmente os preparativos para a troca de comando do Cruzador Sankta Spirito e também o treinamento dos templários que solicitaram instrução de pilotagem, acredito que minha experiência ajudará numa boa conversa.
- Certamente general. A sua presença já está entusiasmando os nossos futuros pilotos. Todo aprendizado aqui é muito valorizado.
- Sabemos disso. Faremos tudo ao nosso alcance para que esse aprendizado seja o mais proveitoso possível.
- O instrutor Dareh Borisav aceitou seu convite?
- Sim e com muito orgulho. Fique certa que ele formará excelentes pilotos.
- Fico feliz por isso.
- Em se tratando de felicidade... Seu filho Aturo deve está aos saltos.
- Imagino quanto, se bem que ele está atrasado nos testes finais para piloto, mas acredito que o seu instrutor será compreensivo.
- Testes finais? Aturo não lhe falou?
     A embaixadora muda a expressão do rosto.
- Do que está falando general.
- Estive com seu filho faz alguns dias em Urbo. Ele me garantiu que falaria com a senhora. Ele foi aceito para a escolta de cargueiros e já deve está atuando nesse momento. Foi um pedido do seu marido que eu não poderia negar.
     Um profundo silêncio se faz entre os dois.
- General. Meu marido me falaria sobre isso e eu aceitaria, apesar das minhas opiniões pessoais serem contra. Ver meu filho feliz é tudo o que me interessa.
- Sei como pensa senhora. Faço o mesmo por Mei.
- O que faz dessa sua comunicação algo sem sentido para mim. Aturo estava com Assis em um cargueiro. Certamente não haveria tempo de chegar para os testes e nem mesmo ter conversado com o senhor.
- Mas senhora, eu estive com ele. Mei e Dareh podem confirmar isso. Eu mesmo o convidei para a armada, com recomendações de que lhe comunicasse. Ele estava muito empolgado e agradecido. Seu filho não lhe comunicou nada?
- Não general. Assis havia me dito que ele partiu em uma nave militar com a intenção de chegar aqui um dia depois do teste que havia perdido.
- Isso tudo está muito confuso. Podemos acessar um terminal de consultas?
- Evidente, me acompanhe.
     Após consultar os protocolos e arquivos de vídeos, eles confirmam ambas as versões.
- Como pode ser? Ele de fato esteve no treino no dia em que fui com Mei. Ele se aproximou se apresentando.
- Aqui diz que ele embarcou numa nave militar na ida e na volta, com permanência de 12 horas no Cargueiro Apox – disse a embaixadora.
- A senhora está certa, não haveria tempo para chegar ao treino naquele dia.
     Uma imagem holográfica de um técnico de rastreamento de Nanorobs interrompe a conversa.
- Senhora embaixadora, lamento informar que recebemos uma comunicação NR do seu filho. Encontra-se no quadrante 86 em rota de colisão com a Estrela Naus.
- O que?
     O general põe a mão sobre o ombro da embaixadora.
- Calma senhora! Resgataremos o seu filho!
- Não pode ser! Sabemos que um NR só se manifesta quando...
     A expressão de angústia do técnico é visível diante do sofrimento da embaixadora.
- Qual é seu nome filho?
- Tarid, senhor.
- Tarid, qual é o cruzador mais próximo do quadrante 86?
- O Cruzador Eta.
- Abra um canal! Urgente. E envie as coordenadas.
     Imediatamente, outro holograma aparece.
- General.
- Comandante Paolo. Temos uma emergência!
- Recebendo as instruções senhor. Temos uma diferença das leituras de dados aqui na transmissão. Estamos acelerando os motores subluz em direção ao Q-86. Tempo de chegada em 12 minutos.
- 12 minutos? – a embaixadora tenta conter a emoção.
     Durante esse tempo, a Cidade de Cristal se ilumina de vermelho acionando um alerta silencioso. Uma equipe médica se aproxima da embaixadora e inicia a emanação de luzes que sai de um dispositivo na palma das mãos e de cores variadas.
     O Cruzador Eta volta a se comunicar.
- General! Localizamos o sinal e resgatamos uma cápsula de fuga. Não houve danos externos, o NR ativou os escudos de emergência. Usou todos os recursos para manter a vida no corpo do piloto Aturo e de preservar o casco da cápsula na radiação de entrada na coroa da estrela. O NR foi exaurido senhor.
- Sinais vitais do piloto?
- Muito fraco senhor, está morrendo. Sinto muito.
- Envie o holograma dele!
     A Embaixadora Suna Levigo teve uma rara oportunidade, nesses casos, de poder ver o filho dar o último suspiro e dizer poucas palavras.
- Meu filho!
     Com a voz fraca, olhos fundos e  pele esmaecida, Aturo se esforça para responder.
- Mãe...atur...atur...aturianos!
- O que houve com a tripulação! – insiste o general
- Cap..capturados!
- Mãe...nos ver..veremos na luz...
- Meu filho! – chora a embaixadora – Nos veremos na luz meu amor!
     Aturo morre com um leve sorriso nos lábios e um parco brilho molhado nos olhos.
- Sinto muito senhora – disse o general, emocionado e surpreso.
     A equipe médica consegue sedar a embaixadora e a teletransporta para uma câmara de repouso. O general recebe novas informações do Comandante Paolo.
- Não há dúvida senhor, foi um ataque aturiano! O NR ainda conseguiu fazer leitura de DNA arsênico. Não sabemos como e onde houve o contato e a contaminação. Os demais três tripulantes sumiram com a nave. Acredito que Aturo ainda teve tempo de escapar.
- Sinais dos NRs da tripulação.
- Negativo senhor. Devem está em regiões muito distantes para captar a frequência ou bloqueadas por escudos eletromagnéticos.
- Encontre o Cargueiro Apox e faça o alerta geral de quarentena! Quero scaneamento de DNA em toda frota.
- Já estamos emitindo senhor – o holograma desaparece.
- Tarid!
- Senhor general.
- Envie um sinal de análise química de vestígio aturiano para todos os NRs da Federação Áxis.
     Com o brilho da Cidade de Cristal, todas as forças de defesa da galáxia foram ativadas. Envolvido com o transtorno da embaixadora e de todas as ordens de comando a serem feitas, o general sente o coração palpitar ao lembrar-se da segurança da própria filha.
- Mei!
Capítulo 12

PLANEDO DECAN
(Planeta Decan)


     Em outra remota região do universo, dominado pelos aliados de Viga, dezenas de naves com formatos variados e bizarros surgem em sequência saindo da hipervelocidade. As naves seguem adiante e desaparecem na massa escura, reaparecendo em seguida na órbita de um planeta árido e de poucos recursos naturais. O motivo do súbito desaparecimento das naves é uma estratégia de camuflagem para que o planeta e a sua localização não sejam detectados pelos inimigos.
     As naves seguem voando próximas ao solo e atravessam as paredes de grandes montanhas. No interior do Planeta Decan, vive uma grande civilização formada de várias espécies alienígenas, muitas delas desconhecidas da Federação da Áxis, e que se preparam para executar um plano de invasão e destruição de mundos próximos as galáxias de Áxis e Rhisvi.
     A maior população do planeta é formada por aturianos, seres que possuem especiais características genéticas que permitem copiar formas de outros seres com um simples contato físico.
     A presença de vários grupos de alienígenas no planeta é uma formação de mentes excepcionalmente inteligentes a serviço de Viga, que ampliando e aprimorando o conhecimento de suas espécies, conseguem com sofisticadas tecnologias, desenvolver suas táticas para combater os humarantes e tryarianos, os seus principais inimigos.
     Uma ordem disciplinada de cinco líderes de várias raças e fiéis guerreiros chamados de Trois, muitos deles subjugados pelas forças e influências mentais de Viga, se reúnem em cerimônia para avaliar as recentes situações.
     Todos estão sob o comando de Sparis Orie, um ser dimensional escolhido por Viga para comandar os ataques aos seus inimigos.
     Os líderes da Ordem Trois, grupos anfíbios formado por chefes de três clãs de seres humanóides intraterrenos: Chaz Ato do Planeta Ficks. Um ser ardil, excelente estrategista e intolerante com os inimigos. Foi o principal responsável pela devastação de mundos na Galáxia de Rhisvi. Possui mais de 2 metros de altura, com pele úmida, enegrecida e com manchas amarelas, possui braços e dedos longos, seu suor é puro veneno. Ledorn Cinka do Planeta kers. Seres de estatura média, a raça possui pele esbranquiçada e enxergam pouco, não obstante, seu sentido de audição é extremamente sensível e o vocal é excepcional. Variando em decibéis, podem enlouquecer uma criatura incauta. Não tolera luz solar e como todos de sua raça, vivem e se movem com habilidade pelos caminhos subterrâneos e insalubres, são exclusivamente, poderosos telepatas. Hurt Isua do Planeta Tarta. São inteligentes e habilidosos em entender e copiar tecnologias, são migratórios e exploradores de mundos viáveis para produção de algas, seu único e indispensável alimento. Apesar de viverem em subterrâneos, ocasionalmente caminha na superfície e tolera a luz. São pequenos, em torno de 1 metro de altura, pele avermelhada, cabeça grande e alongada com protuberâncias na testa. São lentos e frágeis, possuem sacos aéreos no interior da garganta que expele gases inodoros, incolores e venenosos quando ameaçados. Os demais chefes são de clãs planetários: Juix tu, aturiano sem planeta natal definido. Seus genes são os mais puros que se aproximam do primeiro de sua raça, evitando conviver com outras raças aturianas “impuras”. São quase sagrados e admirados por suas habilidades de copiar seres, podendo fazê-lo com incrível perfeição. Nas reuniões. É sempre difícil descrever em que corpo escolhe se apresentar. Adaptam-se em qualquer ambiente natural e em situação de perigo podem se dividir, criando uma falsa cópia para distrair o inimigo, o que os enfraquece de sobremaneira. O último chefe de clã, não menos importante, é Rima Ad, uma raça que fisicamente mais se aproxima dos humarantes, possui a pele clara e desprovida de pelos e não usa nenhum tipo de vestimenta, possivelmente, devido a sua principal habilidade que é em se transformar em animais. Acredita-se que ela seja uma semideusa persuadida por Viga.   
     Todos os chefes de clãs estão reunidos em um platô no alto da montanha, aguardando a chegada do líder maior. O céu anoitecido e nublado, cujo único som é o zumbido do vento, é aquecido com aromas vindo do solo arenoso. Inquietações de aturianos impuros, que costumam gemer antes de adormecer, atestam um ambiente temeroso. Alguns grupos de gruns contaminados são vistos no horizonte, voando e dilacerando algo que não se consegue identificar.
     Ledorn Cinka demonstra sinais de inquietação, sua sensibilidade aguçada é um sinal de que todos devem respeitosamente se curvar.
     Após alguns minutos, um halo luminoso surgiu entre os chefes de clãs, materializando parcialmente um ser humanóide de pele azul, olhos negros e altura mediana: Sparis Orie acaba de chegar.
- Saudações, senhores dos clãs – Fala com um tom de voz suave e aveludada.
     Silêncio no ambiente.
- Venho em nome da Deusa Viga, renovar os votos de confiança e prosperidade para os trois. Desta vez, os nossos inimigos conhecerão o poder da nossa união. Os artifícios dos co-criadores já são conhecidos, não haverá benevolência desta vez para os seres por eles protegidos.
     O corpo etéreo de Sparis Orie circula no ambiente. O halo se desfaz e a materialização se torna mais densa.
     Chaz Ato responde:
- Estamos bem posicionados em nossos postos e já iniciamos o plano, não haverá falhas. O Planeta Gir foi atacado e conseguimos chamar a atenção da Estrela Navan.
     Sparis Orie caminha até o fim da plataforma, onde seus pés beira um precipício. De costas para os chefes de clãs, escuta pacientemente os comentários.
- Guerreiros aturianos se sacrificaram na batalha, não sabemos ao certo quantos sobreviveram – relata Juix tu, modificando seu corpo para a forma de Aturo Levigo, filho da Embaixadora Suna Levigo – Mas sabemos que a nossa recompensa será a nossa glória e sobrevivência.
     Sparis Orie observa que mais cinco auxiliares de Juix Tu também tem a forma humarante. Ele pergunta ao chefe do clã aturiano onde estão os originais.
- Procuramos não desperdiçar um bom alimento para nossos gruns, isso os deixa muito motivados – disse Juix Tu, com sarcasmo apontando para o horizonte.
- Um farto banquete – comenta Sparis Orie abrindo os braços – A recompensa é mais do que sobrevivência, será o início de uma nova vida.
- A Galáxia de Áxis entrará em alerta em breve. Ficarão confusos e temerosos, há séculos que não enfrentam um conflito de guerra – diz Chaz Ato.
     Sparie Ori se vira e se aproxima dos chefes trois:
- Confusos sim, temerosos nem tanto. Não subestime as habilidades e coragem do povo da Deusa Luna. Por enquanto estamos em vantagem e os planos estão perfeitos.


Capítulo 13

PLANEDO GIR
(Planeta Gir)


     O cruzador que partiu da Estação Sul encontra-se na órbita do Planeta Gir. Uma nave de transporte entra na sua atmosfera escoltada por duas naves de combate.
     Em poucos minutos, as naves voam baixo pelos continentes do planeta deixando Mei admirada com a bela paisagem.
- Estamos próximos do ponto de aterrissagem – avisa o piloto – Aguardando liberação.
     As naves de combate fazem uma rápida varredura de identificação no local, certificando-se de que é seguro. A nave de transporte, suspensa no ar, é liberada para pouso e desce suavemente ao solo.
- Esse planeta possui ar respirável, mas é necessário usar roupas especiais para o frio. A gravidade é pouco menor do que estamos acostumados e pode causar algumas reações – alerta o Comandante Sarte – Não se afastem do grupo.
     Aos poucos, todos estão do lado de fora da nave. Uma escolta de soldados observa o perímetro.
     Aveline olha para o céu e ver os efeitos luminosos de uma aurora boreal. Ela utiliza um aparelho portátil de leitura e balança a cabeça afirmando suas convicções:
- Vejam! Como eu pensei. Resíduos nucleares. Realmente houve um intenso combate aqui – disse Aveline em voz baixa, conferindo se o comandante não está ouvindo.
- Tem certeza? – pergunta Mei.
- Não há dúvida!
- O que faremos? Avisamos ao comandante?
- Não temos alternativa, dependemos dele para realizamos uma busca por destroços o algo que confirme a nossa teoria.
     Dareh e Yusuke se aproximam:
- Então? – pergunta Dareh.
- Ela confirmou a teoria de Lunn – responde Mei – Mas precisamos explorar melhor a região em busca de pistas.
     Dareh não gosta da idéia:
- Nem pensar! O comandante não permitiria se soubesse disso.
- Interessante! – comenta Yusuke – Quer dizer que algo ou alguém comemorou algum evento festivo usando ogivas nucleares!
- Mas do que isso Doutor! – explica Aveline – Foi um combate e pelos meus cálculos aconteceu há poucas semanas. A exosfera do planeta ainda está saturada gerando essa luminosidade no céu, o que prova que foi bem intenso.
     Dareh fica confuso:
- Um combate de quem? Não há seres conscientes aqui. É apenas uma reserva.
     O Comandante Sarte se aproxima do desconfiado grupo:
- Tenente! Poderia me confirmar esse espetáculo de luzes no céu?
- Tempestade eletromagnética senhor!
- Já vi algumas tempestades eletromagnéticas em outros planetas, mas sempre próximo aos pólos. O sol desse sistema não parece tão próximo e tão intenso a julgar pelo frio congelante do planeta – disse o comandante.
- Cada planeta e sistemas têm suas particularidades, senhor – Aveline tenta disfarçar.
- Uma vez – fala o comandante – Vi uma particularidade destas num teste nuclear, realizado num planeta de povos não aliados da federação. É exatamente igual.
     Yusuke tenta dissuadir teatralmente:
- Será que alguém fez um teste nuclear não autorizado por aqui comandante? A natureza do lugar parece equilibrada e esse frio está longe de ser um inverno nuclear. Pelo menos, é a minha teoria?
     Mei aproveita a situação:
- Já que viemos aqui explorar um pouco o planeta, por que não observamos mais por aí? A Tenente Aveline se incomodaria de ser minha professora por algumas horas?
- Seria um prazer.
- Eu ficaria muito satisfeito em coletar algumas plantas – disse Yusuke.
     O comandante olha para Dareh que abre as mãos e sacode os ombros:
- Bom. Foi para isso que viemos aqui não é comandante? Um passeio didático?
- Muito bem! Estão autorizados. Levantaremos as barracas térmicas e um domo de aquecimento. Podem usar um veículo de solo, o Sargento Kais conduzirá vocês.
- Dankon! – agradece Mei.
- Tenente! Leve isso – O comandante entrega uma arma para Aveline – Quero vocês aqui em duas horas! Não lembro há quanto tempo alguém da federação esteve por aqui. Algo pode ter mudado.
- Não se preocupe, estaremos bem – diz Mei com um sorriso, acenando para o Sargento Kais que ao se aproximar, recebe a ordem do comandante para acompanhar o grupo.
     A versatilidade do veículo permite se descolar facilmente pelos campos abertos da região. Ao longe, eles observam uma gigantesca cadeia de montanhas com o pico coberto por gelo.
- Que beleza de cordilheira!
- Sim Dareh! Devem ter de 8 a 15 mil metros de altitude – calcula Aveline.
- Deve ser difícil existir formas de vida naquele lugar.
- Estive com Lunn olhando a biodiversidade daqui – comenta Mei – Existem alguns animais e plantas interessantes, inclusive espécies raras encontradas na montanha. Alguns registros rápidos foram feitos há muito tempo por uma equipe da Cidade de Cristal. Nunca instalaram uma base de pesquisa aqui.
- Alguns predadores? – pergunta Dareh.
- Não há registros de predadores, mas acredito que esse mundo não foi completamente explorado, e isso é fascinante.
     Aveline faz comparações:
- Esse planeta possui melhores condições de vida que Rugo, mas não acho estranho que a federação não o tenha colonizado. Existem muitos planetas em Áxis que oferecem condições habitáveis.
- A maioria dos planetas da federação são relativamente próximos tenente, com exceção de Rugo e Oceano – comenta o Sargento Kais enquanto dirige o veículo.
- Rugo é mundo com atmosfera controlada sargento, também é muito frio, mas muito bonito e agradável de viver. Aceitamos no passado em participar dos projetos e experiências de terra-formação e decidimos ficar.
- É verdade tenente! É incrível o trabalho que foi realizado. Admiro muito a história do seu povo.
     O veículo percorre vários locais, mas algo especial chama atenção. Um grande espelho d’água que refletia ao longe, com rios e lagos. O sargento para o veículo e todos sai para observar com potentes binóculos.
- Muito bonito! – comenta Mei – Parece ser perfeito para viver.
- Está longe! Não teremos tempo de ir lá com esse veículo – observa Yusuke.
- Pelo menos uns 15 km – afirma o sargento consultando o relógio – Infelizmente temos que retornar.
- Sargento! Observei a topografia da região, acho que não haverá problemas se retornarmos em círculo. Passaremos próximos de um curso de rio que chegará ao acampamento – sugere Aveline.
- Sim senhora! – O sargento segue para a direita, retornando pelo caminho indicado.
     O passeio exploratório não deu os resultados esperados. Nenhum fragmento de batalha era visto no solo. Aveline acredita que se houve destroços, eles foram queimados ao entrar na atmosfera. O veículo passa perto do rio e outra surpresa aparece. Um grupo de mescas pastando tranquilamente.
- Olhem! Que animais interessantes! – aponta Dareh.
     Mei se admira:
- Parecem cavalos! São muito bonitos!
- Cavalos grandes e peludos – completa Yusuke.
     Aveline pesquisa o arquivo no equipamento portátil.
- Aqui diz que é o Caballu girenses, um endemismo interessante do planeta, são dóceis e vivem em pequenos grupos. Existem algumas raças.
     O veículo se aproxima do acampamento. O horizonte começa a ficar crepuscular e o frio já se faz sentir, quando um bando de centenas de anilos cruzam o céu vocalizando.
- São aves? – pergunta Dareh.
     Aveline encontra no arquivo:
- Ainda não. Aqui diz que é o Girnopterus minor, uma transição evolutiva, algo semelhante a um réptil e uma ave. Também são inofensivos.
     Dareh observa outros bandos distantes. Todos estão seguindo para a mesma cordilheira.
- Eles devem está se recolhendo.
- Deve ser o abrigo deles – disse Mei.
- Devemos fazer o mesmo – alerta Yusuke – A temperatura aqui baixou muito. Não simpatizo muito com o frio.
- Estaremos protegidos na cúpula de aquecimento – explica Aveline – Na segunda noite esses campos atingem 45 graus negativos.
- Perfeito para uma sopa quente e revigorante.
- Temos um bom suprimento de sopas Dr. Yusuke – disse o sargento com humor.
- Ração militar? Obrigado sargento! O senhor é muito gentil, mas não se for incômodo gostaria de cuidar do nosso jantar.
- Seria maravilhoso doutor, sua fama de cozinheiro o precede.
- Sério! Que ótima notícia! Tenho certeza que eu nasci para fazer isto!
- Tenho um primo que o conheceu no Sankta Spirito, ele trabalha com alimentos. É uma honra tê-lo entre nós.
     Yusuke olha para os demais:
- Este é o segredo! Sempre alimente as boas amizades.
     Sorrisos.
     O sargento atende o chamado do rádio comunicador:
- Estamos próximos do acampamento senhor! Chegaremos no horário previsto. Positivo senhor! Repassarei a mensagem – o sargento desliga.
- Algum problema sargento? – pergunta Aveline.
- Estamos sem comunicação com o cruzador da órbita. O comandante precisa que a senhora retorne. É bom ter uma especialista por perto.
- Agradeço o elogio sargento! Pode acelerar!
     Na Estação Sul, o alarme do sistema de segurança é ativado. Lunn descobre que as comunicações das outras estações estão interrompidas. Quando isso acontece, todas as transmissões são direcionadas para a única estação que está em funcionamento. Ele recebe várias transmissões automáticas e imediatamente, retransmite o sinal aberto com toda a potência para os principais comandos da Federação Áxis: A Cidade de Cristal, o Cruzador Sankta Spirito e para a embaixada no Planeta Urbo. Nas transmissões também constam as coordenadas enviadas pelo Capitão Adani, das regiões onde as partículas de migração alienígenas estão se deslocando.
- Estão vindo para cá! – Pensa Lunn.
     Ele retira o cristal de dados do bolso e conecta ao computador da estação para compilar todos os dados recentes e começa a preparar a ativação do modo de transmissão automática. Durante a atualização de dados, um sinal do sistema chama a atenção para indicar uma complementação. Às pressas, Lunn conclui o que estava fazendo e retorna para a célula de observação e fica muito surpreso.
- Damne! – (Maldição!) – Tenho pouco tempo!
     Lunn pega novamente o cristal e mais uma vez, dezenas de mensagens rebatidas das outras estações começam a chegar. Ele consegue acessar uma delas mas não pode mais gravar. Ele corre para o deque de desembarque e se prepara para abandonar a estação, mas antes, liga a contagem regressiva e alinha os propulsores de órbita para lançar o asteróide para bem longe daquele ponto.  Ele tem poucos minutos para decolar.
     Durante o voo em direção aos cruzadores de apoio, que estão próximos da órbita do asteróide, Lunn avisa e explica aos outros três comandantes, o que está acontecendo e que se preparem para um ataque alienígena.
- Dr. Lunn! Não temos nada acusando em nossos monitores! – disse o 2º Comandante – O objeto mais próximo é o cruzador que se encontra no Planeta Gir.
- Os monitores não conseguem detectar comandante! Será que não estamos diante de mais um caso de miragens? O senhor está bem?
- Não são miragens! São partículas que se movimentam na subluz! – insiste o Lunn. Veja as transmissões da Estação Norte!
     Lunn conecta o cristal de dados no computador da nave de transporte e envia para o 2º Comandante. Após alguns segundos sem respostas, ele acessa os dados de um programa específico criado por ele para localizar as partículas alienígenas.
- Comandante está me ouvindo! Comandante responda!
     O monitor faz o rastreamento e indica que os três cruzadores estão mergulhados numa massa de partículas. Lunn para a nave e observa de longe um luminoso campo eletromagnético nos cruzadores, que estão com todas as luzes internas e externas apagadas.
- Comandante está me ouvindo! Comandante responda!
     Lunn escuta apenas estática. Ele utiliza o zoom da nave de transporte para melhorar a visualização dos cruzadores e percebe que alguns compartimentos internos das naves apagam e acedem.
- Pelos Deuses! Estão atirando!
     Os soldados dos cruzadores tentam reagir com bravura o ataque dos alienígenas que se materializaram em várias seções. Lunn desliga o sinal de rádio por precaução. Os cruzadores se movimentam para os lados e parecem tentar realizar manobras evasivas, mas na verdade estão se aproximando em rota de colisão. O monitor da nave de transporte avisa a Lunn que o sistema de autodestruição dos cruzadores foi ativado, iniciando uma contagem regressiva rápida. Ele entende que foi a única atitude possível e desesperada dos comandantes em destruir os inimigos, morrendo com eles.
- Sinmortigo! (Suicídio) 
     Lunn fica imobilizado e sem ação, parece não acreditar na ameaça maléfica que o povo humarante está para conhecer. Seus olhos ficam imóveis e seus pensamentos se voltam para os familiares, amigos e os pacatos mundos da Galáxia de Áxis.
     A nave de transporte por segurança, não espera a decisão de Lunn  de se afastar da zona de impacto da explosão e, automaticamente acelera o propulsores que carregam os motores luz. A nave inicia o salto.
     Nesse momento, os cruzadores se chocam e explodem, gerando uma forte onda de energia.
     Os amortecedores de inércia da nave de transporte sentem o impacto e ajuda despertar Lunn do transe. A nave orientou a sua rota para o Planeta Gir, seguindo o sinal do outro cruzador.
     No acampamento no Planeta Gir, o grupo desce do veículo e segue rapidamente para o domo de aquecimento. Yusuke e Dareh aquecem as mãos nos vapores que são expelidos de dezenas de cilindros que capta o ar frio e transforma em quente. Mei acompanha Aveline até a barraca do comandante. Eles decidiram revelar as suas conclusões.
- Então senhor? O que houve com as comunicações? – pergunta Aveline.
- Não conseguimos fazer contato com o cruzador! Estamos nos comunicando por sinais lazer. Aparentemente os equipamentos estão em ordem.
     Aveline testa os aparelhos.
- Não são os equipamentos senhor. É uma forte estática. A quantidade de resíduos nucleares na exosfera do planeta está causando esse efeito.
- O que faremos?
- Não temos como evitar até ser dissipado no espaço. Pelo que observamos em nossa curta exploração, não houve danos aparentes a biosfera de Gir.
- Comandante, o cruzador sabe da nossa situação? – pergunta Mei.
- Sim. Usamos uma linguagem com códigos luminosos, eles também estão com dificuldades. Receberam mensagens do Dr. Lunn, mas ainda não retransmitiram para nós.
     O coração de Mei acelera quando ouve o nome de Lunn. Um sentimento estranho lhe diz que algo não vai bem.
- Temos que retornar ao cruzador imediatamente! – disse o comandante – Ainda estamos no crepúsculo, não podemos ficar duas noites nessa situação.
     Aveline se adianta e resolve comunicar os fatos ao comandante:
- Senhor! Temos que lhe falar o motivo da nossa vinda a este planeta!
- Conheço os motivos tenente. No entanto acredito que nestas circunstâncias, Mei compreenderá minha decisão. Podemos retornar a Gir em melhores situações.
- Não se trata de mim comandante. É muito mais sério.
     O comandante olha desconfiado para Aveline e Mei no exato momento em que Dareh e Yusuke entram na barraca.
- Chegamos bem na hora! – Yusuke esconde as mãos embaixo dos braços cruzados para aquecê-las.
- Seja o que for que está acontecendo tenente é melhor dizer logo!

- Comandante. As suas observações relacionadas à exosfera do planeta estão corretas. Com a diferença que não foi um teste, e sim, uma batalha. Desde a nossa permanência na estação que estamos tentando reunir provas concretas.
- O Dr. Lunn descobriu quase por acaso. Foi necessário vir ao planeta e conferir pessoalmente – completa Mei.
- Desde que resolveram pedir para vir aqui, eu desconfiei que vocês estivessem escondendo algo. Nunca estive nesse planeta antes, então achei que seria uma boa oportunidade para eu também conhecê-lo um pouco. Notei que a sua exosfera estava estranha, mas estava seguro por que tinha uma especialista confiável na equipe. Quer dizer, não sei agora se é tão confiável.
- Comandante...Sei que parece estranho o meu comportamento e assumo toda a responsabilidade. Mas não arriscaria deixar de vir aqui para confirmar fatos importantes e de segurança militar. Precisava de provas e com todo respeito, isto sim é atitude confiável. Sou militar, mas também sou cientista.
     Dareh se aproxima
- Não queremos que você assuma toda a responsabilidade Aveline. Todos nós concordamos em vir aqui, conhecíamos os riscos.
     Yusuke tenta aconselhar:
- Comandante seja razoável. O senhor sabe que alguns médicos da federação não têm deixado a situação dos observadores muito confortáveis ultimamente. Ter seu trabalho desacreditado por supostos esgotamentos mentais é inaceitável.
     O comandante anda na direção de Yusuke:
- Supostos? –– O senhor acha que os médicos estão errados? Que essas ditas miragens espaciais são reais?
     Yusuke se defende:
- Pesquisei os arquivos comandante e, posso lhe garantir que arriscaria a minha reputação e meu trabalho como médico de que aqueles diagnósticos não fazem o menor sentido. Se para o senhor as miragens são frutos da imaginação de treinados e experientes cientistas,  até respeito o seu ponto de vista. Mas o que me diz como militar, em reconhecer provas concretas que houve uma batalha nos céus deste planeta bem debaixo dos nossos queixos?
     Aveline tenta convencer o comandante:
- Não sabemos precisar ao certo, senhor! Mas acredito que tenha algumas semanas. Essa é uma região remota na periferia da galáxia e pouco monitorada.
- Esse é um dos trabalhos dos observadores tenente!
- Senhor! Os rastros dessa batalha só foram visto devido ao empenho do Dr. Lunn, que seguindo um planejamento de trabalho de rotina, percebeu o fenômeno. Os telescópios de órbita não estavam programados para registrar esses fenômenos. Suas coordenadas se posicionam para detectar e rastrear a aproximação e trânsito de naves.
     Yusuke provoca questionamentos:
- Isso é bem estranho! Então um grupo de naves, ou seja lá o que for, aparecem por aqui e brincam de guerra sem deixar pistas?
- Muito incomum Yusuke – responde Aveline, poupando o oficial superior.
     O Comandante Sarte da meia volta e olha para os monitores de comunicação.
- Muito bem! Fizeram um excelente trabalho. Mas agora, diante da falta de contato, precisamos retornar para a segurança do cruzador. Poderíamos vasculhar outras regiões do planeta procurando algum vestígio, mas não será possível. Acredito que isso seria a sua sugestão tenente.
- Não sabemos o que está acontecendo senhor! Precisamos comunicar a federação.
- Partiremos agora! Levem apenas o necessário, enviaremos depois outro grupo para recolher o acampamento – disse o comandante já apanhando objetos em sua mesa e passando as ordens pelo rádio para retirada de emergência.
- Lá se vai o jantar – resmunga Yusuke, que retorna a sua barraca com Dareh.
     Aveline se aproxima de Mei que está solitária e pensativa:
- Conheço você o suficiente para saber que não está bem. O que houve? Outra visão?
     Mei olha para Aveline com uma expressão que ela nunca tinha visto. Sua face perdeu os traços de menina e agora parecem sério e adulto.
- Não foi uma visão. É como se escutasse o pensamento de Lunn. Posso sentir a sua angústia. Ele gritava dizendo para ficar aqui no planeta.
- Mas Mei, não podemos ficar. Precisamos informar a federação, o comandante está visivelmente preocupado com a sua segurança, na verdade todos nós estamos. Sabemos que Lunn enviou uma mensagem para o cruzador, se aqui for mais seguro retornaremos.
     Aveline abraça Mei reconfortando-a.
     Subitamente o Sargento Kais entra eufórico na barraca:
- Comandante!
- O que houve sargento?
- Aqui fora senhor! No céu!
     Todos correm para fora e ficam parados e impotentes diante da trágica visão que se apresenta. Uma forte luz é vista no céu e destroços do cruzador em chamas e milhares de detritos caindo na atmosfera como estrelas cadentes.
- Pelos deuses! – Grita Yusuke.
     O Sargento Kais põe as mãos na cabeça num impulso de desespero. Outros soldados ainda com algumas caixas nas mãos parecem estátuas olhando incrédulos a desoladora cena.
     Em outro ponto do céu, eles observam um objeto incendiando e explodindo na entrada da atmosfera. Um ruído crepitante do fogo consumindo os destroços alcança o grupo, fazendo até os mais fortes se emocionarem.
- É outra nave! – grita Dareh.
     O comandante usa um potente binóculo e percebe que algo foi lançado antes de explodir e vai em direção ao solo.
- Uma cápsula de fuga! Sargento! Organize um grupo de resgate!
     Sem perder tempo, Mei toca em seu bracelete e ver o desenho losango de. Lunn na cor amarela.
- É Lunn! Ele está na cápsula!
     Os outros conferem a informação em seus braceletes.
- Comandante, por favor! Deixe-me ir com o grupo! – implora Mei.
- Não sabemos o que vamos encontrar! Pode ser perigoso! Você e Aveline fiquem aqui! O Dr. Yusuke e Dareh acompanharão o grupo – ordena o comandante.
- Senhor! A nave está pronta! – comunica o Sargento Kais.
- Rápido! Leve os dois com vocês e cuidado!
     A nave de resgate levanta vôo e segue em direção ao sinal da cápsula. Dareh e Yusuke observam as pulseiras.
- Estamos encrencados não é Dareh? – pergunta Yusuke.
- Não sabemos o que está acontecendo, não vemos outras naves no céu. O cruzador explodiu e Lunn aparece aqui no planeta?
- Ele deve ter abandonado a estação por algum motivo.
- Não podemos sair do planeta! Não é seguro, precisamos depois encontrar o núcleo de dados do cruzador.
- O que ele está dizendo? – pergunta Yusuke.
- O núcleo de dados é uma placa de diamante revestido de baquelite e carbono. É resistente e suporta impacto e o calor. Podemos descobrir informações preciosas do que aconteceu com o cruzador – explica Dareh.
- Temos visualização da cápsula sargento! – avisa o piloto.
     A nave desce lentamente próximo da cápsula. Dois soldados descem correndo e se aproximam do visor fazendo um sinal positivo.
- Ele está vivo sargento! Inconsciente, mas vivo!Vamos removê-lo agora.
     Os soldados retiram Lunn da cápsula, põem um tipo de máscara de oxigênio e o carrega numa maca metálica flutuante para dentro da nave.
     No acampamento, Mei resiste em não entrar para a área aquecida.
- Está frio Mei! Vamos nos abrigar! Podemos vê-los chegarem!
     Mei olha para Aveline com as faces trêmulas de frio e aceita o convite da amiga. Um soldado se aproxima com uma xícara quente de chá energético e dar a boa notícia:
- Acabei de falar com o comandante. Já resgataram o Dr. Lunn. Ele está vivo.
     Mei abre um sorriso de alívio.
- Vamos! Ele vai ser levado para barraca médica – avisa Aveline – Acho que ficará animado em ver seu rosto quando chegar.
     A nave surge no horizonte. A noite e o frio se fazem cada vez mais presentes. Um grupo de apoio está apostos para conduzir Lunn para enfermaria. Na tenda médica, Mei observa a maca flutuante. Ela corre para perto dele. Yusuke a conforta:
- Ele está inconsciente, mas vai ficar bem. Fique com Aveline, assim que ele acordar lhe aviso. Ele precisa de repouso.
    Mei segue a maca com os olhos. Aveline se aproxima:
- Vamos Mei, Yusuke está com ele. Precisa comer e descansar um pouco.
- O que será que está havendo? De repente tudo acontece ao mesmo tempo.
     Aveline mostra o cristal de dados para Mei e faz um sinal discreto com as mãos chamando Dareh:
- O cristal de Lunn?
- Vamos para a nossa barraca e olhar o que tem aqui. Talvez possamos antecipar algumas respostas.
     Na barraca, Aveline encaixa a pequena placa de cristal num equipamento de leitura e procura as informações mais recentes na tela.
- Vamos ver, vamos ver... Aqui!
- Então? - pergunta Mei.
- Lunn conseguiu captar e grava muitas informações!
     Aveline muda o semblante ao ver as imagens da Estação Sul, enviadas pelo Capitão Adani:
- O que isto?
- Não sei Mei! Nunca vimos! São alienígenas desconhecidos. Atacaram a estação norte. Adani enviou as coordenadas de aproximação para Lunn.
- Atacaram a Estação Sul?
- Sim! E destruíram os cruzadores. Lunn escapou do asteróide na nave de transporte um pouco depois de chegarmos aqui no planeta. Tivemos sorte em estar aqui.
- É o que parece? – disse Mei, com tristeza – Mas como eles invadiram e destruíram os cruzadores?
     Aveline passa os arquivos:
- Aqui está tudo explicado. As partículas migrantes viajam na subluz e se materializam atacando a tripulação. São milhares deles.
- Então foram os mesmos que atacaram o cruzador aqui?
- Sim Mei. Tudo indica que sim.
- Vamos ser atacados?
     Aveline se concentra nos dados enviados por Lunn e fica eufórica.
- É isso! Claro!
     Dareh entra na barraca:
- Posso saber? Desculpe a demora.
     Aveline se vira para Mei.
- Lembra que você havia me dito que escutava os pensamentos de Lunn que dizia para ficarmos no planeta?
- Sim. E ainda confio neles.
- Por enquanto temos alguma vantagem em ficar aqui.
     Dareh fica olhando com curiosidade e Aveline explica para ele o que encontrou no cristal de dados.
- Alienígenas? Estamos realmente com problemas! – Dareh passa a mão atrás da nuca.
- É muito séria a nossa situação! Mas temos algum tempo para pensar em algo – continua Aveline.
- Precisamos avisar a federação! Estamos desprotegidos aqui!
- Acredite em mim Dareh! Este planeta agora pode ser o lugar mais seguro em Áxis.
- Não estou entendendo Aveline!
- Escute com atenção! A saturação da exosfera do planeta, provocada pelos misteriosos ataques atômicos, criou uma fina proteção que além de não permitir transmissões de rádio impede a passagem dos alienígenas.
- Nesse caso, enquanto essa saturação existir estaremos a salvo? – pergunta Mei.
- Não podemos dizer ao certo. Preciso gerar simulações, mas acredito que temos alguns dias antes que alguns buracos na exosfera comecem a surgir. Vamos! Temos que explicar ao comandante.
     Aveline, Mei e Dareh se dirigem para a barraca do comandante e explicam a situação.
- Somos alvos fáceis aqui – responde o Comandante Sarte – Precisamos nos esconder e nos abrigar do frio. A nossa localização é conhecida, estamos expostos.
- Ele está certo Aveline – confirma Dareh – Não podemos ficar esperando, temos que achar uma saída.
     Mei escuta um leve bip na pulseira.
- Veja! O losango está azul! Lunn está melhor!
     Mei se alegra e olha para o comandante esperando a autorização dele para ir a enfermaria.
     O comandante balança a cabeça confirmando e deixa escapar um leve sorriso.   
     Mei corre para a enfermaria.
- Temos muito que salvar – fala o comandante se referindo aos sentimentos que Mei sente por Lunn.
- Senhor! Pelos meus cálculos o Cruzador Sankta Spirito será o primeiro a captar as mensagens – informa Aveline.
- Mas tenente como faremos? Como avisar do perigo! Esses alienígenas simplesmente aparecem dentro das naves.
- Mas pelo menos eles saberão disto. O Dr. Lunn passou todas as informações de segurança. Eles encontraram uma saída para evitar o ataque.
     Na barraca da enfermaria, Mei encontra Lunn seminu vestindo uma roupa de frio.
- Mei!
- Desculpa! Eu... – Mei vence a timidez e salta nos braços de Lunn beijando-o, sem ele dar tempo de dizer mais nada.
- Mei! Estava tão preocupado.
- Escutei os seus pensamentos e senti seu coração – responde Mei beijando-o mais uma vez – Como você se sente?
     Lunn sorrir:
- Foi o melhor beijo que já tive na vida. Estou bem. Apenas com muito frio – ele termina de fechar o zíper do casaco.
     Mei olha para Lunn esperando dele alguma informação dos ataques:
- Sei o que deseja saber. Mas não tenho confirmação de que as mensagens foram captadas. Há muito mistério e confusão lá por cima.
- Quero saber dos meus pais. Eles devem está preocupados comigo e não temos como responder.
     Mei baixa a cabeça triste.
- Calma. Não fique assim.
     Lunn toca com carinho no queixo de Mei fazendo-a olhar para ele:
- Alguém da federação ou de mundos aliados vai captar as mensagens e vão saber que você está aqui. Tomei todas as precauções, o asteróide e a estação não foram destruídos e ainda está retransmitindo continuamente o pacote de informações para toda a galáxia e fora dela.
- Aveline me explicou o que você me pediu. Ficar aqui no planeta?
- Você escutou? É incrível! Usei toda a força do meu coração.
     Ele beija as mãos de Mei:
- É mais seguro agora. Mas temos que sair daqui assim que o dia voltar.
     O Comandante Sarte entra na barraca, acompanhado de Dareh e Aveline.
- Dr. Lunn! Seja bem-vindo.
- Obrigado comandante. Tive muita sorte.
- Sorte é o que vamos precisar para conseguir sobreviver nesse planeta – disse Yusuke que entra na barraca trazendo uma sopa quente e pondo na frente de Lunn.
- Sopa? Yusuke foi você que fez?
- Aqui está amigo. Já que seu coração já está aquecido, acho melhor fazer o mesmo com o estômago.
     Mei sorrir com timidez.
- Eu estava pensando – continua Yusuke – Não haveria uma maneira de explodirmos alguma coisa nuclear na atmosfera? Assim ganharíamos mais tempo com aquelas criaturas.
- Não teríamos carga nuclear suficiente para cobrir todo o planeta – responde o comandante.
- Na teoria a idéia é boa, Yusuke – Fala Lunn enquanto toma a sopa – Mas teria que ser feito de cima, mais precisamente do espaço para baixo e não ao contrário. Mas infelizmente isso já foi feito com explosão do cruzador.
     Aveline confirma:
- Ele está certo. Não podemos comprometer a estratosfera. Poderíamos arruinar a vida nesse planeta, inclusive nós.
     Yusuke balança a cabeça afirmando:
- Foi o que pensei. Agora, por favor! Alguém poderia sugerir outras idéias?
     O comandante se aproxima de Lunn.
- Diga-me doutor! O que está acontecendo?
- Perdemos muito tempo para entender comandante. As estações de fronteiras já haviam detectado o fenômeno e os observadores foram considerados incapazes. Milhares de seres alienígenas de espécies desconhecidas se infiltraram nos mundos de Áxis. Não sabemos há quanto tempo isso já acontecia, mas com certeza foi uma ação inteligente e muito bem planejada.
- Monitorávamos o acesso à nossa galáxia identificando naves. Isso é algo nunca imaginado – revela o comandante.

- Existe a possibilidade de eles estarem aqui? – pergunta Yusuke.

- Nas rotas que registramos não havia direcionamento para esse planeta. Mas eles não esperavam que o Capitão Adani fizesse a descoberta, capturando um dos seus e alertado a federação. Todos os sinais das outras estações foram bloqueados e retransmitidos para a Estação Sul.
- Isso só aconteceu em simulações – lembra Aveline – As estações Leste e Oeste foram atacados?
- Tudo indica que foi uma ação sincronizada – responde Lunn – Mas não tivemos registros de alertas destas estações, elas simplesmente pararam de transmitir. A Estação Sul foi a única a transmitir e por isso foi atacada.
- Ela também explodiu? – pergunta Mei.
- Não. Foi lançada para uma rota que não interessa aos alienígenas. A estação norte acionou a autodestruição, assim como todos os cruzadores.
- É uma ação extrema para conter uma ameaça, não tiveram escolha – disse o comandante, com uma expressão triste no olhar.
- Conseguir escapar a tempo e ao chegar à órbita de Gir, entendi que o mesmo acontecia com o cruzador. Segui direto para o planeta, mais duas daquelas criaturas se materializaram na minha nave.
     Mei se aproxima por trás de Lunn e põem as duas mãos em seus ombros.
- Estava prevenido quanto a isso. Só tive tempo de acionar a cápsula de fuga e os deixar queimarem na entrada da atmosfera.
- Assistimos essa tragédia! Uma a imagem que jamais esqueceremos – disse Dareh.
     Yusuke senta à mesa e olha para o comandante:
- Ainda acho muito estranho que alguns médicos fizeram com os observadores. Acho que temos algumas infiltrações que colaboraram com isso.
- Também desconfio – diz Aveline – Os observadores substitutos são pessoas que nunca conhecemos, apesar de sabermos da existência deles. São novatos nesse trabalho.
     Dareh fica curioso:
- E não conseguiram convencer a federação de substituir as estações norte e sul?
- Em parte sim. Lunn ficou sozinho por um bom tempo e nunca informou miragens em seus relatórios. O mesmo aconteceu com a Estação Norte.
- Nós observamos os registros, mas tivemos que tomar precauções e violar muitos protocolos. Aquilo tinha que ter uma explicação! – comenta Lunn.
     Dareh anda pelo ambiente:
- E agora? O que faremos?
     Ainda sem muita certeza, Aveline arrisca sugestões:
- Imagino que a explosão do cruzador na exosfera desse planeta tenha colaborado um pouco para a nossa proteção. Temos duas naves de combate e uma de transporte, mas com esse tempo seria impossível descobrir algum local seguro para nós.
     Lunn completa as informações e procura algo nos bolsos e na cama:
- Se atravessarmos a exosfera seremos alvos fáceis. Essas criaturas são hostis e determinadas em matar. Tenho arquivos deste planeta. Aproveitaremos o tempo de confinamento aqui para pesquisar a sua geologia e encontrar uma solução antes da ajuda chegar.
     O comandante fica atento:
- Ajuda? Parece bem confiante nisso. O que procura Doutor?
- Sim comandante, Estou confiante. No momento é a nossa primeira esperança.
- Espero que seja uma boa notícia, estamos sem muitas opções – comenta Dareh.
- Antes de deixar o asteróide, recebemos dezenas de transmissões rebatidas para a estação. Não havia tempo de gravar e identificar todas elas, mas uma em especial chamou atenção. Uma mensagem de Tryari, sede da Galáxia de Rhisvi.
- O que diz a mensagem doutor? – pergunta o comandante. Um soldado entra na barraca e entrega um equipamento a Lunn.
- Estava na cápsula senhor!
- Há! Obrigado! É o meu consulte!
     Lunn aciona o equipamento:
- Aqui está comandante! O Regente Gruner Ar informou que houve um ataque de aturianos disfarçados de gruns. Esses animais foram resgatados em uma nave desconhecida que partiu da órbita do Planeta Gir.
- Mas o que faz crer que ele viria até aqui? – insiste o comandante.
- A mensagem não será transmitida a tempo para a federação.
- Devido o que aconteceu com as estações? – interrompe Dareh.
- Exatamente. Em algum momento a federação vai captar todas as mensagens, poderá entender o que está acontecendo na galáxia e planejar uma reação. Eles são os maiores aliados da federação, tem trânsito livre. O fato de não receberem respostas da federação, certamente vão querer investigar esse planeta e com sorte nos resgatar.
- Eles estarão vulneráveis também Lunn – disse o comandante – Sabemos que a tecnologia dos tryarianos é inferior a nossa. Como vão conseguir vencer os alienígenas?
- Tenho esperanças que captem nossos sinais de alerta.
     Yusuke esfrega as mãos e sopra um hálito quente:
- Acho que os alienígenas não teriam interesse de enfrentar esse frio congelante.
     Lunn concorda:
- Bem lembrado Yusuke. Estava pensando na fisiologia deles, algo muito semelhante a anfíbios. Durante a viagem até aqui, revisei alguns vídeos enviados pela Estação Norte e percebi alguma intolerância de um deles a luz artificial, ficou confuso e seus olhos eram cegos.
- O que indica que não toleram luz do dia?
- Sim. É muito provável.
- Passaremos duas noites aqui Lunn! Sem luz do dia, perfeito para um ataque não acha?
- Concordo em parte Yusuke. Mas se existir alguma característica anfíbia nesse ser em especial, ele evitará o frio intenso.
     Aveline consulta a lista de animais do planeta.
- Bom! Pelo menos aqui em Gir não há relato de nada parecido com anfíbios.
     Lunn anda até a entrada da barraca e pelo domo, observa a noite fria:
- O que me preocupa é o outro ser que também estava na estação, de característica semelhante e muito maior. Parecia mais ágil e inteligente, infelizmente não observei nenhuma fraqueza.
- Mas o que atacou o capitão foi morto com facilidade com um tiro certeiro do Tenente Lido e isso também é uma fraqueza – disse Aveline.
     O comandante dá alguns passos em direção a uma caixa e retira uma arma:
- Não toleram frio, luz e tem corpos frágeis como os nossos. Podem ser mortos! Para mim é suficiente! Muito bem doutor! Ajudou bastante, agora sabemos algumas fraquezas dos nossos inimigos.
- Uma pequena vantagem comandante.
     O oficial entrega a arma a Lunn.
- Aqui está a sua vantagem! Sabe atirar doutor?
- Nunca usei comandante.
- Temos poucos soldados aqui, por isso estou recrutando vocês! Tenente Aveline! Ensine seus amigos como usá-las!
     O comandante vai se retirando da barraca, mas antes para e olha friamente para o grupo:
- E lembrem-se! Nunca hesitem em atirar se querem ficar vivos!
- Ensinarei a eles senhor! – responde Aveline com firmeza.
     Yusuke balança a cabeça negativamente.
- Algum problema Yusuke? – pergunta Dareh.
- Sabe que não gosto de armas! Sou médico, salvo vidas não as mato.
     Aveline se aproxima do médico:
- O comandante está certo Yusuke. Para que você possa salvar vidas é preciso que fique vivo. Não é para matar é auto-defesa!
- Sinto muito Aveline! Não teria coragem de fazer isso.
- Diga-me uma coisa Yusuke! – pergunta Dareh - O que você mais gostaria de ter nas mãos quando um alienígena perigoso estiver há poucos metros de lhe atacar mortalmente? O convidaria para jantar?
- Provavelmente! Se eu soubesse o que ele gosta de comer.
- Ótimo!Agora temos uma tática perfeita! “Alimente seus inimigos” – disse Dareh, preocupado com a recusa do amigo em não usar armas para se defender.
     Mei se aproxima de Yusuke.
- Sei como se sente, também não quero armas. Descobriremos outras maneiras de nos mantermos vivos.
     Aveline olha para Dareh e Lunn esperando respostas.
- Não precisa Mei! Já descobri uma maneira! Aveline temos armas maiores?
     A tenente abre uma caixa:
- Temos sim Dareh. São as melhores! Temos esse com mira lazer e projéteis de nêutrons que perseguem o alvo!
- Já usei essa arma em simulação! Muito eficiente! Quero um desse e muita munição!
     Lunn levanta a mão:
- Consiga duas!
     Aveline se aproxima de Mei e Yusuke.
- Tenho armas boas para vocês! Não são letais, mas podem atrasar bastante o inimigo.
- Começamos a nos entender! – Disse Yusuke, que olha para Dareh.
- Como são essas armas? – pergunta Mei.
- São armas paralisantes. Se as criaturas tiverem pelo menos um sistema nervoso em seus corpos, vão cair fáceis com os disparos. Você pode ajustar para projetar cinco disparos ao mesmo tempo.
- São perfurantes?
- Não Yusuke. São projeteis plásmicos com cargas elétricas.
- E também perseguem os alvos?
- Até o inferno! – disse Aveline com determinação, levando a mão para o alto e destravando a arma.
- Hum. Isso vai ser divertido.
- Mei poderá usar algo mais leve. Essa pistola sônica de longo alcance. Vai atordoar seus inimigos. Seu raio é de 30 graus. Quando a luz do dia retornar faremos alguns testes.
     Enquanto Aveline falava, Lunn digitava em seu consulte no pulso:
- Temos uma geologia interessante nesse ponto do planeta. Aquela cadeia de montanhas pode ser responsável pelo mau funcionamento de alguns equipamentos da cápsula de fuga.
- Como assim? – pergunta Mei.
- Não tenho certeza. Temos que chegar mais próximo para fazer leituras corretas. Mas se eu estiver certo, podemos nos abrigar em alguma caverna com a vantagem das criaturas não se materializarem lá.
     Yusuke respira profundamente:
- Boas notícias sempre são bem-vindas!
Capítulo 14

KREITAJXO SENBRUA
(Criatura Silenciosa)


     O Cruzador Sankta Spirito estava seguindo para o Planeta Kolonjo quando subitamente saiu da hipervelocidade. O casco da nave mudou sua cor e brilho, passou de branco para um vermelho vivo. As luzes internas também ficaram vermelhas por alguns segundos, sinalizando alguma emergência.
     Foi um alerta atípico e extremamente preocupante. O Comandante Akash estava em seus aposentos, envolvido com pensamentos distantes e recordando o passado. Ele recolhia e acondicionava alguns objetos pessoais numa caixa, pois em breve deixaria seu posto militar e a liderança do cruzador.
- Isso não é bom! – pensa o comandante, achando estranho a ponte demorar em fazer contato e relatar o motivo da nave parar.
     O sinal sonoro avisa que alguém está na porta. O comandante autoriza a entrada e ver o Soldado Lear parado com a cabeça baixa.
- O que houve Lear?
     O soldado sem levantar a cabeça e extremamente constrangido vai direto ao assunto.
- O Planeta Coroni foi atacado por alienígenas desconhecidos. Há mortos e desaparecidos na Cidade de Estania. Foi um ataque silencioso e rápido. Recebemos agora a mensagem de um grupo de comunicadores de montanha que fica próximo ao Lago Lujik. Existem sinais de resistência militar e proteção de sobreviventes em outras cidades do planeta, eles pedem socorro imediato.
     Um silêncio sepulcral envolve o comandante. O soldado levanta a cabeça com os olhos visivelmente emocionados. Seu rosto ainda estava úmido das lágrimas que em vão tentava esconder e enxugar com a ponta dos dedos. Os oficiais da ponte o escolheram para dar a triste notícia.
- Nós sentimos muito, Senhor – disse o soldado com a voz embargada.
     O Comandante Akash respira profundamente, se aproxima do soldado pondo a mão em seu ombro.
- Ponte! Transfira!
      A ponte de comando obedece e teletransporta os dois.
     Os oficiais e técnicos observam em silêncio a chegada do comandante e aguardam instruções.
     O comandante com um tom de voz frio e olhar penetrante olha para outro oficial:
- Capitão! Relatório.
     O Capitão Galen Menon, oficial humarante aumarino, inicia o resumo dos fatos exibindo projeções holográficas.
- Durante a hipervelocidade, o cruzador acumulou centenas de mensagens na galáxia, provocando uma parada de segurança. A grande maioria das mensagens são rebatimentos das estações de fronteiras e do Planeta Kolonjo. Temos registros de presença alienígena hostil não autorizada em Áxis, com informes de ataques no Planeta Coroni, nas estações de fronteiras, em especial nos cruzadores de apoio da Estação Sul e uma nave de escolta do Cargueiro Apox.
- Quantos mortos?
- Existem desaparecidos, mas nossa estimativa é entorno de um milhão, duzentos e vinte mortos.
- Qual a situação no Planeta Coroni?
- Segundo o rastreamento remoto realizado pelos comunicadores de montanha, a população de Estania foi impiedosamente atacada senhor. A ação foi rápida, não houve tempo de reação militar. Em outras cidades tivemos resistência com muitas baixas. Temos seis técnicos em confinamento na montanha solicitando resgate.
- Capitão! Classifique as informações. Complete as de Coroni.
- Não sabemos ao certo como os comunicadores de montanha sobreviveram. Talvez esteja relacionado com o campo eletromagnético da central, mas nada conclusivo. No momento não há sinais de sobreviventes em Estania, mas existe a possibilidade de encontrarmos devido aos abrigos subterrâneos. Temos algumas imagens do ataque que comprova que foi expressiva a presença inimiga no planeta.
     O Comandante Akash observa as cenas, ele cerra o punho com tanta força que parece que vai quebrar os dedos.
- Quem são eles?
- Nenhum registro destes seres, comandante. Temos ataques sincronizados de duas espécies aparentemente anfíbias. Uma atacou do lado dia do planeta, a outra iniciou no crepúsculo do anoitecer. A primeira parece se materializar no solo e a segunda surgiu das águas. Acrescenta ao ataque, um tipo desconhecido de vespas venenosas com mais de um metro de comprimento que surgiram em nuvens aos milhares.
     O capitão continua falando e o comandante sem piscar os olhos procurava em vão achar Aurora nas imagens.
- Comandante! Comandante o senhor está bem? – chama atenção o capitão.
- Informe sobre Kolonjo! 
     Outro holograma com um mapa estelar aparece na apresentação do capitão evidenciando a região Q-86. O capitão continua o relato:
- Uma tripulação de escolta do cargueiro foi invadida por aturianos. Dos quatros tripulantes, três estão desaparecidos e outro foi encontrado numa cápsula de fuga. Um piloto chamado Aturo, filho da Embaixadora Suna Levigo, que morreu minutos depois de ser resgatado pelo Cruzador Eta. Um alerta geral de quarentena foi ordenado pelo General Anor Meadhas para scaneamento de DNA em toda frota, com foco de análise química de vestígio aturiano para todos os NRs da Federação Áxis.
- Onde está o Cruzador Eta?
- Seguiu para interceptar e dar apoio ao Cargueiro Apox.
- De onde partiram os primeiros alertas?
- Surgiu da Estação de Fronteira Norte e retransmitido pela Estação Sul. Recebemos informes de ataques em todas as estações e curiosamente a Estação de Fronteira Sul é a única que está transmitindo sinais apesar de se encontrar em órbita aleatória.
- Estação Sul?
- Positivo senhor.
- Mortos?
- Temos mortos confirmados nas estações leste e oeste. O comando de Rugo informou que o Capitão Adani e o Tenente Lido foram resgatados pelo Cruzador Marte. Eles escaparam da Estação Norte antes de uma grande explosão.
- Algum contato com os cruzadores próximo a Estação Sul?
- Não temos sinais dos cruzadores senhor, mas recentes imagens dos telescópios de órbita confirmam explosões em suas antigas posições próximas ao asteróide da Estação Sul. 
- Ataques externos?
- Não senhor, não havia naves. Foram surpreendidos por materializações de milhares de alienígenas em todas as instalações das naves. Houve reação militar mal sucedida, não tiveram tempo para entender o que estava acontecendo. Os comandantes ativaram o sistema automático de autodestruição. Uma tragédia senhor – O capitão baixa a cabeça em sinal de respeito.
- Existe sobreviventes no asteróide da Estação Sul?
- As leituras termais indicam que se encontra vazio. Temos confirmação de que a equipe da estação, acompanhada pelo Comandante Sarte seguiram para visita exploratória no Planeta Gir antes dos cruzadores serem atacados. Infelizmente não sabemos a suas posições e se estão vivos.
- O mal retorna para aterrorizar nossas vidas!
- Não tenho dúvidas disso senhor! Aqui tem outra mensagem que confirma isto! Vem de Tryari, sede da Galáxia de Rhisvi. Houve ataque de aturianos disfarçados em falsas cópias de gruns que estavam em nave de origem desconhecida. Aqui diz que a última procedência de rota foi calculada numa região próxima ao Planeta Gir.
- Houve vítimas?
- A situação foi controlada a tempo. Felizmente não houve vítimas. Toda a Galáxia de Rhisvi está em alerta.
- O que sabemos sobre esses seres?
- Desconhecidos, senhor. O pouco que sabemos de sua natureza foi enviado pela Estação Norte. Sua presença em Áxis tem relação comprovada com as miragens identificadas pelos observadores de estação. O mais incrível disso senhor, é que eles viajam aos milhões pelo espaço, desfragmentados em partículas subatômicas. O Capitão Adani marcou suas rotas migratórias e neste momento eles estão seguindo para os Planetas Urbo, Kolonjo, Rugo e Oceano.
- Alguma presença em Gir?
- Não sabemos senhor! Perdemos todas as comunicações de fronteiras e os telescópios de orbita não captam. Mas de acordo com os cálculos do Capitão Adani, os demais planetas habitados em Áxis por enquanto estão salvos. O alerta chegou a todos os mundos da federação, o efetivo militar foi reforçado e a população foi recolhida em abrigos.
- Um ataque estratégico! Coroni é um dos principais planetas que fornecem alimentos para a federação. Agora estão direcionados para planetas sedes. Eles não temem a morte, são suicidas com a única intenção de chamar atenção utilizando o medo, o pânico e a dor.
- Faz sentindo senhor. E estas forças têm poderosos aliados totalmente desconhecidos para nós.
     Um oficial de comunicação se aproxima.
- Senhor! O General Meadhas está no canal privado. Solicita a sua presença no Ponto Lumo.
     A mensagem causa uma ansiedade na tripulação da ponte de comando.
     O Comandante Akash se dirige para uma pequena plataforma, olha para todos ao seu redor e sinaliza com a cabeça para o capitão, ordenando que seja teletransportado para o Ponto Lumo (Ponte Luz).
     Esse compartimento só foi utilizado pelos últimos quatro comandantes do Cruzador Sankta Spirito, todos eles já haviam falecidos em avançada idade.
     O seu segredo só é conhecido pela alta cúpula da federação. O Comandante do cruzador é o único oficial autorizado para isso, mas até entrar no Ponto Lumo, desconhece a função desse lugar especial.
     Ao ser transportado, o comandante encontra-se em ambiente escuro. Em seguida uma grande fresta vertical de luz branca se abre como uma cortina, circulando todo o recinto, tornando-o agora totalmente branco e brilhante. Ele escuta uma voz masculina e conhecida.
- Seja bem-vindo a Ponto Lumo, Comandante Akash!
- Dankon (Obrigado)
     O comandante procura a origem da voz.
     Um ser transparente, trajando uma túnica branca, surge poucos metros a sua frente.
- Sua presença nos honra meu amigo.
- Comandante Prismo!
- Apenas Prismo. Ainda estamos no Sankta Spirito lembra? E você é o comandante. Fico feliz em revê-lo. Este é um momento especial Akash. Estou aqui para lhe orientar sobre o uso do Ponto Lumo. Esse conhecimento só pode ser repassado de um ex-comandante para outro.
- Também estou surpreso e emocionado em revê-lo. O que devo fazer?
- O Sankta Spirito é uma nave poderosa. Existem muitos mistérios ainda não revelados aqui. Mas o que você deve fazer é relativamente simples.
     O ambiente fica novamente escuro e um caminho iluminado aparece, guiando até uma cadeira reclinável. Prisma ergue o abraço, convidando o comandante ir até ela.
- Daqui comandarás o Sankta Spirito, ou melhor, todos eles.
- Eu não entendo.
- Você entenderá quando sentar na cadeira Akash. Sua mente será sincronizada com o conhecimento da sua operação e ativada de acordo com as necessidades. Não tema, feche os olhos, relaxe e respire fundo. Sinta o poder que deverá ser sabiamente conduzido. Até breve.
     A imagem de Prismo desaparece.
     O Comandante Akash senta na cadeira e reclina o corpo. Fecha os olhos e segue as orientações projetadas em sua mente. Ao abrir novamente os olhos, o comandante vislumbra todo o espaço sideral ao seu redor. Consegue deslizar na parte externa e interna do Cruzador Sankta Spirito. Consegue ouvir as vozes de toda a tripulação e também seus pensamentos. O Comandante Akash tem todos os seus sentidos do corpo harmonizados e ampliados. O Ponto Lumo completou sua sincronia.
     Uma imagem facial do General Meadhas aparece.
- Comandante!
- General.
- Comandante, sei que não há muito que dizer nesse momento de profunda tristeza. Estamos sendo mais uma vez, vítimas de inimigos implacáveis e desconhecidos. Tomamos todas as providências possíveis para proteger nosso povo e o Sankta Spirito é um legado poderoso contra os nossos inimigos.
- O que devo fazer general?
- Interceptar o inimigo e neutralizá-los, utilizando todos os recursos do Ponto Lumo. Estamos desenvolvendo táticas de proteção na atmosfera, mas não sabemos há quanto tempo estes seres já estão entre nós. Já temos relatos de aparições em algumas regiões em Urbo. As estações de fronteiras foram destruídas, mas o Sankta Spirito possui uma capacidade tecnológica superior para provisoriamente substituir essas funções de transmissões.
- Estamos prontos general! Manteremos informado.
- Faça isso! E amigo, falando extra oficialmente, encontre a minha filha.
- Mei e os demais estão desaparecidos, mas acredito que ainda estão vivos. Vamos encontrá-la general! É uma promessa!
     A imagem do general se desfaz.
     Sempre na cadeira, o comandante concentra o pensamento e se desdobra mentalmente para a ponte tradicional. Ele ver os técnicos e oficiais de comando e se aproxima do Capitão Menon que não percebe a sua presença. O comandante envia uma mensagem que é escutada em toda a nave.
- Tripulação do Sankta Spirito! Aqui é o Comandante Akash. Informo que o Ponto Lumo foi mais uma vez ativado. Agradecemos aos deuses e os nossos ancestrais por esta feliz oportunidade. A federação está sendo mais vez ameaçada por forças aliadas desconhecidas estão causando dor e sofrimento ao nosso povo.
     A tripulação fica imóvel, olhando para cima, sem acreditar no que está acontecendo.
- Estamos seguros aqui e não tememos a morte! O que é verdadeiro vence o tempo, a imaginação e a realidade. Nesse momento! Cada átomo, cada ar respirado, cada emoção e pensamento são compartilhados entre nós, faz parte da estrutura e da alma desta nave. Por que somos agora, o Sankta Spirito!
     A tripulação aclama emocionada e sente na pele a emoção de está ali, apesar das tristes circunstâncias.
     O Cruzador tem sua energia desligada. Tudo fica escuro. A tripulação se acalma aguardando o som de aviso, e quando acontece, o Cruzador Sankta Spirito se torna mil vezes mais radiante do que era. Em outros povos, esse momento raro da nave o fez conhecido com o nome de Estrela brilhante.
     A luminosidade interna da nave se torna extremamente nítida, o ar tem a pureza e o frescor das montanhas. Enquanto o Ponto Lumo estiver ativo, a tripulação não precisará falar para serem compreendidos, pois todos agora se comunicam mentalmente. Não haverá sono, fadiga, fome ou sede. Seus corpos se mantêm constantemente revitalizados e um sentimento de plenitude e de conhecimento é compartilhado com o Ponto Lumo.
     No painel de controle da ponte tradicional, surgem novas funções e novas ordens do comandante:
- Capitão! Vamos desmembrar o cruzador! Transmutação de Projeção do Sankta Spirito 2.
- Desmembramento iniciado senhor!
     Lentamente, desprendendo-se como um espírito que deixa o corpo físico, surge outro cruzador, etéreo e de cor violeta, tão brilhante quanto o primeiro. Miríades brilhantes cintilam ao seu redor.
- Sankta Spirito 2 desmembrado senhor! Aguardando destino!
- Planeta Gir! – ordena o comandante.
     O cruzador violeta faz uma rápida manobra, intensifica mais ainda o seu brilho e desaparece.
- Capitão! Nova rota para o Sankta Spirito! Siga para o Planeta Coroni!
- Planeta Coroni, rota estabelecida senhor!
- 100 % de velocidade e organize as tropas de reconhecimento! Estamos em alerta máximo!
     O som avisa a tripulação. O cruzador salta na hipervelocidade.
     No Planeta Kolonjo, Solaris Meadhas chega à Cidade de Cristal. Ela se encontra com o general em um dos terraços. Solaris o abraça:
- Anor! Finalmente!
- Que bom que está aqui! Estou muito aflito com desaparecimento de Mei, não temos notícias dela.
     Solaris acaricia o rosto do general:
- Acalme-se meu querido, sinto que ela está bem.
- Como você pode garantir isso?
- Não sei explicar, mas é uma certeza forte dentro de mim. Sim, ela corre riscos como todos nós, mas temos que confiar naqueles que a protegem. Ela é especial e tem um poderoso instinto de preservação.
     O general lembra quando Prismo Enar, o antigo comandante do Cruzador Sankta Spirito entregou Mei para eles. Na ocasião, havia dito que a criança foi teletransportada para a nave em circunstâncias não reveladas, e que havia recomendações para que fosse adotada por eles. Curiosamente, a própria Solaris também havia sido adotada. O nome Mei foi sugerido por Flavius Fídio, padrinho, instrutor e grande amigo do General Meadhas, quando ele ainda morava no Planeta Coroni, sua terra natal.
     Solaris não engravidava e também se recusava a submeter-se a métodos artificiais para conseguir. Quando Mei entrou em suas vidas, parece que tudo no mundo começava a fazer sentido.
- Tenho confiança que eles estejam no Planeta Gir.
- Alguma nova informação dos nossos irmãos de Coroni?
- O Comandante Akash está a caminho com uma tropa de reconhecimento. Acharemos os sobreviventes.
     Os dois se abraçam. O general recebe uma mensagem. Uma minúscula esfera de luz se aproxima flutuando e gerando uma imagem holográfica.
- Sim!
- General! Temos dois médicos da federação em confinamento. O rastreamento químico encontrou vestígio aturiano! – informa Tarid.
- Mais alguém?
- Não senhor! Esses médicos trabalham em Urbo, exclusivamente com os diagnósticos dos observadores das estações de fronteiras.
- Minhas ordens são para que coloque os dois nas câmaras de hibernação! Transfira-os para um cruzador e siga na rota de encontro do Sankta Spirito imediatamente.
- Entendido senhor! – a bola de luz se dissipa.
     O general volta a falar com Solaris.
- A Embaixadora Suna Levigo está se recuperando na câmara e em algumas horas estará em seus aposentos. Você poderia fazer-lhe companhia? Ela está muito abalada.
- Sim. Vim para ficar ao seu lado e ajudar no que for possível. Em Urbo a população está apreensiva e assustada.
- São tempos difíceis, vamos reagir, eu prometo!
     Mais uma vez a esfera de luz se aproxima.
- General! As sondas de órbita indicam que temos alterações negativas de visualizações de brilho em 80 % das estrelas de várias constelações! As partículas migratórias já envolvem Kolonjo! Estamos com distúrbios eletromagnéticos e perdendo comunicação com Rugo, Urbo e Oceano! Estão atravessando a exosfera senhor!
- Acione o alerta! A Cidade de Cristal vai submergir!
     O general olha para Solaris:
- Preciso ir! Fique com a embaixadora!
     Eles se abraçam mais uma vez. O general ordena que sejam tele-transportados.
     Uma gigantesca cúpula de energia envolve a cidade que aos poucos desce sob as brancas areias para o núcleo do planeta. Portas e janelas de todos os prédios são fechadas automaticamente. Uma nuvem com bilhões de vespas acompanhadas de guerreiros trois começam a se materializar no solo. O Planeta Kolonjo se prepara para o ataque.
     O General Meadhas está de pé numa ponte de comando, olhando as imagens da invasão e aparentando muita tranqüilidade. Ele orienta um oficial nos procedimentos e pede para que aguarde o sinal.
- Quero que todos eles desçam!
     Em solo, o inimigo fica confuso, pois não ver o que atacar. Só areia e vento.
- Temos confirmação senhor! Estão todos abaixo da atmosfera e em solo!
- Oficial! Faça as honras da casa!
- Será um prazer senhor!
     A ventania se intensifica em todo o Planeta Kolonjo. Intensas rajadas de vento e areia espalham as vespas e imobiliza os trois que perdem o equilíbrio e tentam em vão ficarem de pé, vocalizando como loucos.
     Descargas elétricas intensificam o início de fenômenos atmosféricos violentos e centenas de colunas de ar tocam o solo formando gigantescos tornados com quilômetros de altura e velocidades superiores 800 km/h sugando todo o oxigênio para o interior do planeta.
     Aos poucos, os trois agonizam pela falta de ar, perdendo a consciência e sendo despedaçados pela força dos tornados. O céu azul do planeta não mais existe, não há mais atmosfera, apenas o perigoso vácuo do espaço e partes de corpos flutuando. O Planeta Kolonjo retorna a sua forma original: A Arca-lua.
- Arca-lua em ativação senhor!
- Perfeito! Conseguimos capturar alguns?
- Temos uma espécie de cada senhor! Estão inconscientes seguindo para a quarentena.
- Quando despertarem, vamos finalmente descobrir muito sobre eles! Transfira-me para as câmaras de hibernação, estarei com a Embaixadora Suna.
     No Ponto Lumo do Cruzador Sankta Spirito, o Comandante Akash altera sua freqüência cerebral e entra em estado alfa. Sua consciência e estado emocional são transferidos para o Sankta Spirito 2.
     O comandante percebe que não está no Ponto Lumo. Encontra-se de pé, numa espaçosa sala de observação panorâmica. Ele caminha e ver uma mulher de costas, contemplando a velocidade com que a nave se desloca por entre as estrelas. Trata-se da Embaixadora Suna Levigo.
- Embaixadora?
- Comandante Akash! Estava lhe aguardando.
- Senhora, soube o que aconteceu ao seu filho, lamento profundamente.
- Houve mortes de muitos filhos, todos nós lamentamos. Felizmente, Gardeno ainda está seguro.

- Existe algo que eu possa fazer para apaziguar tamanha tristeza? 
- O senhor já está fazendo comandante. Terá a oportunidade de conduzir o destino do nosso povo.
- Sem dúvida, uma grande honra senhora. Mas antes tenho contas a acertar com recentes inimigos.
- Poderia haver alguma nobreza e respeito em chamá-los de inimigos? Um grupo de seres covardes que nos deseja a extinção?
-Teremos que enfrentá-los com nossas próprias forças, minha senhora. Os deuses não nos abandonaram, apesar do inimigo já bater em nossa porta.
- Na verdade comandante, eles já entraram. Apesar de hostis, alguns deles são aliados fracos e desarmados, suicidas em potencial. Foram derrotados pelo General Meadhas. A Arca-lua ressurgiu e estamos seguindo para ajudar Urbo.
- Fico feliz por isso, senhora.
     A embaixadora segura às duas mãos do comandante.
- Sei que está fazendo um grande esforço para controlar a sua fúria e tristeza, mas tenha fé comandante. Precisamos da sua força e do seu equilíbrio.
- Farei o melhor possível. Sou grato pelas palavras.
     A embaixadora olha para a janela panorâmica.
- O espaço visto dessa dimensão é maravilho!
- Hipnotiza a alma. Para mim está sendo uma experiência inexplicável.
- Esta se saindo bem comandante. Espero que tenhamos outra oportunidade de nos encontrar-mos.
- Será um momento feliz, senhora.
- Agora preciso ir comandante. Já escuto a voz do general ordenando meu despertar da câmara.
     A embaixadora se despede com as mãos postadas e uma expressão serena. Sua imagem desaparece.
     O comandante caminha um pouco pela nave para se familiarizar e depois retorna a sua consciência para o Ponto Lumo, comunicando a tripulação sobre o triunfo do General Meadhas em Kolonjo. A notícia é comemorada.
     Dos inimigos que não se materializaram e sobreviveram à explosão nuclear da Estação Norte, uma parte de dividiu e seguiu em direção ao Planeta Gir. A outra parte chegou ao Planeta Rugo, onde aos poucos vão se materializando e procurando desconfiados por suas vítimas, mas nada encontram. O Planeta Rugo, que tem uma população pequena e basicamente militar parece está desabitado.
     Um alienígena encontra um dos seus, morto no chão. E antes mesmo de vocalizar um alerta, tomba misteriosamente. Um som metálico e giratório perturba os inimigos que vão caindo feridos e lacerados um a um, assim como, as grandes vespas. Eles percebem a emboscada e se deslocam para se protegerem subindo em colinas e procurando fendas nas rochas e no chão. Ouvem-se disparos e explosões, e mais criaturas são mortas.
     Uma centena deles que surgem em outros pontos do planeta enfrentam as mesmas situações. Não conseguem ver nada, e os únicos sons percebidos são do vento e dos grunhidos de dor e da voz aguda de alguns.
     Próximo a Cidade Rugo, sede do planeta, um pequeno grupo de alienígenas feridos não conseguem atravessar uma barreira de força, estão encurralados. Sentem a presença dos seus agressores, mas não conseguem se defender.
     Numa tentativa desesperada, eles emitem sons de alta freqüência que não causa os efeitos esperados.
- Capitão Adani! Estamos concluindo o vôo de reconhecimento. O inimigo foi destruído em toda a superfície!
- Muito bem tenente! Tenho alguns rapazes encurralados aqui, vamos prendê-los.
     Toda a população civil de Rugo estava no interior da cidade, protegida por um campo de força, cuja vibração não permitia a passagem das partículas inimigas, esmagando-as com o impacto.
     O restante militar estava fora, no ar e no solo, espalhados pelo planeta. Para ter vantagens sobre o inimigo, eles utilizaram um disfarce plasmônico, avançada tecnologia que permite envolver qualquer material tridimensional e fazê-lo invisível no ambiente natural em qualquer direção ou ângulo. Outra arma letal também usada no combate foi às milhares de lâminas dos discos giratórios, que também invisíveis, causaram grandes estragos no corpo dos inimigos.
     O Capitão Adani ordena para todos desligarem os dispositivos de invisibilidade. Os alienígenas observam os militares e ficam atentos, vocalizam novamente, na tentativa de afastá-los. O perigo som não causa efeitos, pois todos os soldados estão usando protetores auditivos, esse ataque nefasto do não podem feri-los.
- Vamos acalmar nossos visitantes! Congele-os!
     As criaturas recuperam as forças e se reorganizam. Numa última tentativa desesperada avançam para cima dos soldados aos saltos longos. Mas antes que consigam, caem completamente imóveis com os jatos de gás congelante.
- Sempre soube que eles não gostam de frio! Ficam lentos - disse o capitão, tocando em um dos alienígenas no chão com a ponta da bota.
- Foi um combate fácil, capitão!
- Não subestime o inimigo soldado! Isso não foi um combate foi uma carnificina. Veja! Eles não usam armas tecnológicas, apenas a natural, garras venenosas, força e agilidade, uma voz mortal que faz estourar a sua cabeça e sabe os deuses o que mais!
- Espero que esses sejam os últimos, senhor! – fala outro soldado aliviado.
- Não conte com isso! A festa só está começando! Eles estão nos testando por alguma razão e não gosto disso!
- Senhor! Temos transmissões do Sankta Spirito! Kolonjo venceu o inimigo! A Cidade de Cristal está salva!
     A tropa comemora.
- Avise ao Comandante Akash que Rugo também fez a sua parte!
- Com prazer senhor! – anima-se o soldado de comunicação.
     No Planeta Oceano, todas as cidades flutuantes submergiram nas águas, enquanto outros milhares de esferas de combate saem dela, ficando estacionadas no céu. As cidades-torres se retraíram e centenas de mastros surgem do solo laçando raios para o céu e alterando o clima na alta atmosfera para temperaturas abaixo de zero.
     Na cidade flutuante de Sireno, o Embaixador Nuada Nin observa tranquilamente as imagens da concentração das partículas em um ponto da galáxia.
     Um oficial se aproxima:
- Embaixador. Todas as formas de destruição destes seres já foram testadas com êxito. Sabemos que o frio não os mata, mas os tornam lentos e vulneráveis. Mesmo assim eles insistem em atacar.
- Desconfio que não seja um suicídio sem propósitos. Eles sabem que correm riscos de morte e mesmo assim avançam como se disso dependessem as suas vidas.
- Não há possibilidade de sobreviverem. Não chegarão vivos.
     As primeiras criaturas iniciam as materializações e atravessam a atmosfera sendo incinerados antes de chegarem ao solo. Uma intervenção eletromagnética impossibilitou de localizar o solo e as camadas de gelo na atmosfera os confundiram.
     Uma cena jamais imaginada acontece, onde milhares de corpos das criaturas materializadas que conseguiram entrar na atmosfera, literalmente caindo mortas do céu. Algumas mais resistentes começam a sufocar por não ter sido vacinadas contra um poderoso vírus, desenvolvido e controlando pelos cientistas de Oceano.
     Para proteger o seu frágil e preservado ecossistema, nenhum ser do universo sobrevive nesse planeta se não for vacinado, até mesmo os aturianos. Todos os humarantes já nascem com imunidade ao vírus e tem trânsito livre. Outros seres, uma vez respirando ou tendo contato com o ar, o sistema orgânico entra em colapso em poucos segundos.
     Uma nave inicia a coleta de alguns corpos, enquanto as esferas de ataque disparam nos demais, desintegrando-os no ar. O inimigo foi totalmente neutralizado.
     Algumas horas depois a bordo do Cruzador Sankta Spirito, o Comandante Akash recebe uma comunicação.
- Senhor! Os inimigos foram destruídos em Oceano! Não chegaram a tocar o solo.
- Boas notícias. Mas não esperava outro resultado, seria um insulto aquele lixo anfíbio sujar um belo planeta.
- Senhor! O embaixador Nuada está em canal privado.
     Uma imagem holográfica se projeta a frente da cadeira do comandante.
- Embaixador, é uma honra revê-lo.
- Sinto a mesma alegria comandante. Tomamos as providências para que a sua promessa de passar uma temporada com nosso povo esteja garantida.
- Parabenizo a todos, embaixador.
- Agradecemos comandante. Temos novas informações sobre o inimigo. Analisamos alguns corpos no laboratório e constatamos que as criaturas são hermafroditas e possuem um mecanismo de auto-reprodução por esporos.
- Impressionante! Penso no efeito que isso causa.
- Sem dúvida. Infelizmente esse conhecimento chegou atrasado. Todos os planetas que foram atacados por eles, com exceção de Oceano, correm perigo. Mesmo mortos, o contato dos esporos com a água acelera o desenvolvimento embrionário, induzindo um crescimento de curtas fases de metamorfose.
- Isso é inesperado embaixador.
- Digo que bem planejado comandante, sabia que ficaria surpreso. São criaturas silenciosas e obscuras. Identificamos duas espécies anfibinóides e suas anatomias indicam que podem sobreviver em qualquer ambiente aquático ou terrestre que possuam condições análogas a nossa espécie. Existem indícios que vivam em regiões subterrâneas. Os nossos cientistas comentam que essa espécie poderia num processo evolutivo diferente, se tornarem uma raça semelhante a nossa.
- Embaixador. Não podemos produzir o mesmo vírus utilizado em Oceano em grande escala. Temos alguma vantagem?
- A vantagem existe para os planetas e regiões com baixas temperaturas e com uma fauna que possa atacar essas criaturas na fase larval, apesar de não sabermos as conseqüências disto. O vírus foi desenvolvido para proteger o Planeta Oceano de alienígenas, além de não oferecer risco para o povo humarante, também não oferece riscos para a nossa biodiversidade. Nunca foi nossa intenção em fazer o mesmo em outros mundos, a sobrevivência de nossa raça está ligada a pureza das águas.
- O que faremos então?
- Sugiro uma migração em massa das populações para as regiões mais frias de seus planetas.
- Os esporos sobreviventes ainda é uma ameaça.
- Comandante. É preciso que sejam capturados vivos, enquanto um vírus específico que possam detê-los seja pesquisado e produzido. Mas para isso, precisamos de espécimes para realizar os testes, todos que atacaram Oceano estão mortos.
- Tivemos confirmação de algumas capturas em Rugo, ordenarei para que os envie para Oceano.
- Faça isso, comandante. Temos uma biosfera no laboratório, estarão protegidos do vírus e poderemos estudá-los melhor.
     A imagem se desfaz. O comandante transmite para todos os mundos que se desloquem para as regiões frias e que as criaturas, se possível, sejam capturadas vivas. Em Rugo, o Capitão Adani recebe instruções para participar da condução dos corpos dos inimigos para o Planeta Oceano.
Capítulo 15

INVADO
(Invasão)


     O General Anor Meadhas ordenou a transferência da população, cujos planetas foram atacados pelos anfibinóides, para que permaneçam nas regiões geográficas mais frias. Essa operação gerou uma grande mobilização de naves militares, civis, de transportes comerciais e cargueiros. Tudo foi deixado para trás por milhares de famílias que agora se abrigam em cidades subterrâneas.
     No Planeta Urbo, apenas os embaixadores e seus auxiliares permanecem na sede da Embaixada Unida. Toda a região de Sudaj Ventoj está fortemente protegida, aguardando o ataque inimigo que já cruza a exosfera se dirigindo para a superfície do planeta.
     As primeiras centenas de criaturas iniciam as materializações. Surgem no solo e nas águas, no alto das torres, em ruas desertas e dentro de instalações e residências. Eles gritam, quebram o que está pela frente, se irritam. Um dos líderes vocaliza chamando seu grupo e se reúnem num grande pátio da cidade.
     O silêncio já indicava que não havia ninguém para atacar, mas eles estão inquietos, percebem um som de baixa freqüência que se desloca em alguns quilômetros do entorno.
     O vento se intensifica cada vez mais, sendo substituído por uma forte neblina que cobre a cidade.
     Outros grupos inimigos se reúnem no pátio e dessa vez com a chegada de um enxame de vespas que rodopiam nos ares. Aos poucos a neblina vai dissipando, fazendo surgir uma dezena de soldados humarantes, curiosamente desarmados e exibindo indumentárias que representam várias culturas da federação.
     Sem perder tempo, os inimigos correm furiosamente para atacar os soldados que continuam imóveis, apenas observando. Faltando alguns metros para serem atingidos, os soldados se desfragmentam numa fina poeira contendo bilhões de cepas nanorobs que os envolvem. As microscópicas máquinas penetram nos olhos e bocas dos anfibinóides e vespas, dilacerando-os por dentro e posteriormente fazendo-os acender e queimar com intensa luz radioativa. Nenhum esporo-ovo ou traço de DNA sobrevive a esta exposição, que acontece simultaneamente na Embaixada Unida e em todas as regiões ameaçadas do planeta.
     Algumas horas depois, na Embaixada Unida, uma nuvem de nanorobs entra por uma janela e se compacta perante os embaixadores. Assumindo a forma de um jovem humarante aumarino e com uma voz eletrônica, ele informa que o inimigo foi neutralizado e que o planeta está desinfetado, não correndo riscos de desenvolvimento de vida alienígena.
     Um sentimento de alívio é experimentado e compartilhado entre os embaixadores, auxiliares e militares. A forma humarante se desfragmenta, deixa a sala e se uni em nuvens, as demais espalhadas pelo planeta, dirigindo-se para local desconhecido.
     O Cruzador Sankta Spirito chega a orbita do Planeta Coroni, mas não se limita a ela. Penetrando na atmosfera, o cruzador se aproxima alguns quilômetros do solo, acima da Cidade de Estania, produzindo uma grande sombra sobre ela.
     O Comandante Akash ordena a saída das naves de reconhecimento e ataque. Uma nuvem de nanorobs, semelhante a que defendeu o Planeta Urbo, são lançadas do cruzador a procura de sinais alienígenas em todo o planeta. O processo de desenvolvimento dos esporos-ovo é rápido, já havendo metamorfoses de anfibinóides completando o estado adulto em algumas regiões.  
     Os nanorobs interferem e finalizam os ataques e desenvolvimento do inimigo e durante horas localizam humarantes feridos e escondidos em abrigos.
- O Planeta Coroni está desinfetado, senhor – avisa o oficial.
- Reúna todos os irmãos que não estão feridos e que podem ajudar no trabalho de recolher os corpos. Estou descendo ao planeta!
     O Comandante levanta da cadeira e segue para uma plataforma.
     Próximo ao Lago Lujik, Akash se materializa. Ele está diante do que sobrou da cerimônia de casamento de Smarvi Novik e Nida Mi. Ele caminha apressado, procurando localizar o corpo de Aurora. Outros soldados e voluntários se apresentam para ajudar.
     Quase uma hora depois, um soldado se aproxima do comandante e informa que o corpo de Aurora Mi não foi localizado em nenhum lugar do planeta.
     Akash olha silencioso para o soldado e imagina onde estaria Aurora. Ele tinha certeza de que ela participava da cerimônia. E caso tivesse oportunidade de se esconder, os nanorobs já teriam encontrado.
- Senhor! Está me ouvindo? – disse o soldado, chamando a atenção do comandante que está absorvido em pensamentos.
- O que disse?
- O que faremos com os corpos senhor?
- Leve-os para as câmaras de criogenia! Quando isso acabar, prestaremos nossas homenagens póstumas.
      O soldado se retira e Akash olha mais uma vez para o pátio de cerimônia, um vento seguido de um pequeno redemoinho de poeira chama a sua atenção. No local ele ver um pequeno brilho no solo. Curioso, ele caminha até o local, procura com cuidado, se abaixa e encontra o colar que havia dado de presente para Aurora. Akash se emociona ao lembrar-se do momento em que a entregou. Ele aperta o objeto na mão e fecha os olhos na esperança de sentir a sua presença.
     Desde a ativação do Ponto Lumo, as faculdades psíquicas de Akash foram intensificadas e começam a se manifestar progressivamente.
     No momento em que ele toca no pingente do colar, a habilidade de psicometria o faz observar tudo o que aconteceu nos últimos instantes de Aurora. Ele a ver correndo ao tentar salvar uma criança e observa que um ser alienígena alto e de pele úmida toca o seu braço, fazendo-a perder os movimentos e cair poucos metros depois. O esforço de Aurora é inútil e ela vai perdendo a capacidade de se movimentar. Ela segura o colar com as mãos trêmulas, enquanto o alienígena se aproxima e o arranca a força. Aurora desmaia chamando pelo nome de Akash.
    O coração do comandante acelera diante das fortes cenas. Ele agora ver a face do inimigo que segurando a corrente, fala algo impronunciável, mas que mentalmente o comandante consegue entender e ouvir como um sussurro rouco.
“ Akash? Chaz Ato volas infanoj unu dioj!” (Akash? Chaz Ato quer filhos dos deuses!)
“Lian vivon! En sia mano!” (A vida dela em suas mãos!)
     O comandante abre os olhos. Sua testa está suada e sua respiração ofegante.
- Ela está viva! Ela está viva!
     O comandante se abaixa um pouco tonto. Um soldado se aproxima e pergunta se ele está bem. Sem responder, Akash faz um sinal com a mão afirmando que sim. O soldado não se convence e ajuda-o a se levantar, comunicando o ocorrido a ponte do Cruzador Sankta Spirito que o teletransporta imediatamente.
     Enquanto isso, no Planeta Decan, Chaz Ato se materializa no platô da montanha e diante dele, encontra-se o líder Sparis Orie que logo pergunta:
- Fizemos progressos?
- Certamente. As perdas das nossas espécies foram muitas, mas quantidade não é problema, teremos quantas forem necessárias.
- Trouxe a prisioneira?
- Está confortável em sua câmara, vai sobreviver.
- O Comandante Akash desmembrou o cruzador, um está no Planeta Coroni e outro dimensional segue em rota para o planeta que chamam de Gir. O que será de tão importante que ele procura?
     Chaz Ato acessa um painel e surge a imagem do planeta:
- Ainda temos trois na órbita, estão impossibilitados de descer. Os cruzadores foram destruídos e o que possa existir de humarantes no planeta é insignificante para a nossa causa. Não existe transporte para eles retornarem e o frio é tão letal para eles quanto para nós.
     Hurt Isua se materializa:
- Uma das unidades de comunicações não foi destruída e ainda transmite informações para a federação.
     Sparis Orie se movimenta pelo platô:
- Mas é tudo o que queremos que faça! Estamos completando cada etapa do nosso plano.
- Provavelmente o Cruzador Sankta Spirito esteja atrás de confirmação de sobreviventes? – disse Hurt Isua.
     Chaz Ato olha para Sparis Orie e esse insiste desconfiado:
- Ou deixaram alguém importante e desprotegido para trás.
     Próximo a um paredão de rochas escuras e lodosas, outra criatura misteriosa  se aproxima:
- Ledorn Cinka! Estou impressionado com o trabalho do seu povo! – elogia Sparis Orie.
- Captamos sinais mentais dos nossos. Eles estão confinados em um cruzador que partiu do Planeta Rugo com rota indicativa para o Planeta Oceano.
- Os aturianos infiltrados em Tryari não responderam! Certamente foram descobertos e mortos! Vamos iniciar as invasões em Rhivis e Áxis! Quero que entreguem os filhos dos deuses, em troca, seus povos serão poupados! – ordena Sparis Orie.
     Ledorn Cinka se aproxima:
- E quanto ao Planeta Gir e os nossos que estão aprisionados no cruzador? Não podemos deixar que conheçam nossas fraquezas!
     Sparis Orie cria uma nova missão:
- Retire seu povo da órbita do Planeta Gir e ataque o cruzador de Rugo! Quero uma distração para que Rima Ad siga agora para o Planeta Gir com uma legião de aturianos! Precisamos saber o que o Sankta Spirito está interessado!
     Um grande lagarto desce sorrateiro pela parede chegando ao chão. O animal se transforma numa mulher humarante, completamente desnuda. Juix tu, ainda na forma de Aturo Levigo, vem logo atrás, com uma manta cobre gentilmente o seu corpo da mulher.
- Já estou pronta! Não tenho problemas com o frio ou calor – disse Rima Ad.
     Sparis Orie a observa:
- As forças de defesa da federação estão protegendo seus planetas habitados e não tem interesse de enviar cruzadores para o Planeta Gir. Seja discreta e tente descobrir o que está acontecendo! Mantenha os aturianos guerreiros escondidos enquanto isto!
     Sem responder, Rima Ad se retira para cumprir a sua missão.
     Juix tu também a observa com admiração e se aproxima de Sparis Orie:
- Conseguiremos convencer o Comandante Akash a entregar os filhos dos deuses?
- Ele não terá escolha. Dessa vez os humarantes e Tryarianos estão em desvantagens, mesmo com ajuda dos deuses.
     Juix tu demonstra satisfação:
- Um confronto final! O fim dos humarantes! E poderemos então desfrutar desta galáxia.
- Sim! Os deuses não deveriam ter penetrado nesta dimensão! Foi um erro! E como todo erro, gerou conseqüências
- Se pelo menos soubéssemos onde os filhos dos deuses estão!
- Tenho fontes seguras que afirmavam que um deles estava sob a proteção da Arca-lua e o outro reinando no Planeta Tryari.
- E os demais?
- Ainda não sei, mas descobriremos!
- Os humarantes é uma espécie difícil exterminar, são muito poderosos, mesmo sem ajuda dos deuses! Não podemos correr o risco de subestimá-los! –alerta Juix tu.
     Sparie Orie responde com tranqüilidade:
- E não vamos! Para mim será uma diversão observar como os humarantes se desgastarão em tentativas ousadas e inteligentes em nos vencer, no entanto, inúteis. Eles não estão preparados para o que os espera.
     Sparie Orie caminha, como de costume, para perto do precipício. Ele olha para o céu escuro, frio e nebuloso do Planeta Decan e ver milhares de grandes naves deslocando-se na hipervelocidade, provocando repetidos estrondos na atmosfera.
     No interior da montanha, um grupo de aturianos acompanha uma câmara metálica em forma de caixão fúnebre que levita, transportando o corpo de Aurora. Eles entram numa cela úmida e quente e faz a câmara descer até o chão. Um aturiano se aproxima, observa a leitura dos sinais vitais, aperta um dispositivo e todos se retiram.
     A câmara destrava deixando escapar uma fina névoa de gás brilhante. Dutos de ventilação começam a funcionar tornando o ambiente respirável para um humarante. Confusa, Aurora abre os olhos e se levanta devagar, sua mente ainda está entorpecida pelo veneno contraído no momento em que o suor de Chaz Ato tocou em seu braço. O antídoto que foi aplicado em Aurora a salvou, mais ainda produz alguns efeitos colaterais. Com esforço, ela desliza para fora da câmara e rasteja, sem saber ao certo onde quer ir. Seu corpo expele suores em demasia, está pálida e desidratada. Aurora começa a ter convulsões e tosses. Ela levanta a cabeça e tenta respirar como a sua vida dependesse disto. Ao olhar para cima, ela ver uma fenda no alto da cela, lembra alguns instantes do Comandante Akash e tentar se levantar. O som dos motores das naves se decolando lhe dar forças para observar qualquer situação que lhe possa explicar onde se encontra. Aurora alcança a fenda e observa grandes quantidades de naves subindo ao céu. Esforça-se para olhar as estrelas e tentar identificar sua provável localização, mas não é possível, o céu é tingido por uma forte luminosidade crepuscular.
     Ao descer, Aurora começa a lembrar de alguns detalhes. Sabia que foi poupada por algum motivo e sente no fundo de sua alma que todos que estavam na cerimônia de casamento estavam mortos. Ela chora e se enverga, sentindo a dor da perda das pessoas queridas e importantes da sua vida. Devido ao seu esforço, ela adormece.
     Passado algumas horas, Aurora abre os olhos e encontra um recipiente com água. Ela bebe com ansiedade, se esforçando para superar o sabor amargo. Próximo de onde está, ela ver outro recipiente contendo pequenas larvas. Apesar de sentir muita fome, tem ânsia de vômito só em pensar em comê-los e se afasta com a mão na boca.
     O Cruzador Marte encontra-se na metade do caminho para chegar ao Planeta Oceano. Os corpos dos anfibinóides estão vivos e conservados nas câmaras de suspensão.  A Comandante Diana Mars argumenta com o Capitão Adani que deseja seguir para o Planeta Gir.
- Capitão! Não temos certeza se estão vivos. Toda frota que se encontrava na órbita de Gir foi destruída, sua exosfera está cercada de anfibinóides prontos para descer.
- É exatamente por isso que tenho razões para acreditar que eles ainda estejam vivos! O planeta tem condições atmosféricas adversas a sua natureza, sabemos que eles não toleram frio, mas algo os faz insistir em lá permanecer!
- Precisamos primeiro entregar essas criaturas em Oceano e aguardar instruções, não sabemos o próximo passo do inimigo! – esclarece a comandante.
     O Tenente Lido se aproxima:
- Com licença comandante. Temos recentes leituras de migrações de partículas inimigas a nossa frente.
- Isso não acaba! – impacienta-se a comandante – De onde surgiu tenente?
- As únicas concentrações de massa destas partículas em Áxis estavam no Planeta Gir, nossos cálculos indicam que são as mesmas.
- Então a atmosfera de Gir está livre? – pergunta o capitão.
- O que não significa que uma parte não tenha descido senhor. Os registros espectrais são conclusivos de que não houve variação de massa. Fizemos alguns estudos baseados na separação das partículas durante o ataque aos cruzadores próximo a Estação Sul e o deslocamento para Gir.
- Então? – pergunta a comandante.
- Não houve variação. Toda massa de partículas simplesmente afastou-se da órbita do planeta e “submergiu” na matéria escura. Há poucas horas “emergiu” e estão em rota de colisão com o cruzador.
- Eles querem os prisioneiros! – diz o capitão.
- Não acredito nisso! – disse a comandante – Eles não têm sentimentos em relação aos seus. Parecem que não se incomodam com resgates. Acho que pretendem seguir para Rugo e nos encontraram no caminho.
- Oceano está distante, não temos como receber reforços! – lamenta o tenente.
- Acho que temos uma solução! Vamos deixá-los lentos! – diz a comandante olhando para o capitão.
     O Capitão Adani concorda:
- Mas é claro! É nossa única oportunidade!
- Vamos baixar drasticamente a temperatura interna do cruzador e bloquear o suprimento de oxigênio! Quero toda tripulação com roupas espaciais e fortemente armada! Não vou perder mais um cruzador da federação para esses animais! – ordena a comandante.
     O Cruzador Marte sai da hipervelocidade e para no espaço. A temperatura interna está abaixo de zero e quase todos os principais compartimentos estão selados e sob vigilância. A Comandante Diana observa o painel espectral.
- Estamos dentro!
     Estrondos e batidas são escutados no casco do cruzador e centenas de anfibinóides se materializam no interior da nave. Como era previsto, os inimigos reagiram mal aos efeitos do frio intenso. Eles corriam tentando escapar dos disparos dos soldados e dos jatos de ar frio que descia dos condutores de ar. Muitos se aglomeravam para tentar se aquecer e eram mortos com facilidade. Alguns mais resistentes conseguiam atacar, mas também eram eliminados pela tripulação. Após ajudar no combate na ponte de comando, a líder do cruzador observa no monitor que alguns estavam confinados em áreas vazias no setor de cargas.
- Isolem aquela área! Vamos aumentar nossa encomenda para os testes em Oceano.
     Foram necessárias 43 horas para que todo o cruzador estivesse livre dos anfibinóides. A comandante informa a tripulação que o inimigo foi derrotado e que não houve baixas, apenas alguns feridos sem gravidades.
     O Capitão Adani estava isolado e pensativo. A Comandante Diana se aproxima:
- O que houve capitão? Está tudo bem?
- Uma ação tão simples teria evitado tantas mortes em outros cruzadores.
- Não conhecíamos as fraquezas do inimigo capitão.
- Também lamento capitão. Fomos pegos de surpresa. Está em nossas mãos fazer justiça.
- Tem razão. Precisamos seguir em frente.
     O Cruzador Marte é desinfetado, estabiliza o suporte de vida, e quando se prepara para acionar os motores subluz algo inesperado acontece.
- Comandante! Temos dezenas de desconhecidas naves inimigas saindo da hipervelocidade – alerta o Tenente Lido.
- Algum contato?
- Não senhora! Estão abrindo hangares e ativando armas! Vão atacar!
     O Capitão Adani aciona um painel:
- São muitos! Estão nos cercando!
- Senhora! – alerta o tenente - Lançaram naves de combate! Tempo de chegada em 4 minutos!
- Não teremos tempo de fazer um salto! Potência máxima no escudo e lancem as naves autônomas! – ordena a comandante.
     As naves inimigas iniciam os disparos em direção ao cruzador e este reage contra elas. As naves autônomas que não são tripuladas combatem no entorno do cruzador evitando enfraquecer o escudo que protege a nave.
     Os primeiros combates são favoráveis ao cruzador, mas o inimigo está em maior número e fortemente armado.
- Senhora! Outras naves inimigas estão saindo de hipervelocidade! – diz o tenente.
- Ainda acha que eram muitos capitão? – disse a comandante.
- Retiro o que disse! O que está acontecendo aqui? Reuniram todos os soldados do universo contra nós?
- Considero isso uma honra para eles! – responde a comandante.
- Naves inimigas se aproximando senhora! Abrindo hangares e ativando armas!
- Relatório!
- Temos muitas baixas de autônomos! Os escudos estão em 90%
- Encurralados e sem muitas opções – diz o capitão.
- Isto aqui é um cruzador de guerra capitão! Tripulado pelo povo de Rugo! Não somos treinados para pensar em opções! O que fazemos de melhor é combater e essa a nossa única opção! Se tivermos de retornar a luz que seja, mas antes vamos fazer alguma limpeza nessa galáxia! – disse a comandante, com determinação.
- Então vamos entrar na festa! – disse o capitão.
     A comandante ordena que um oficial imediato assuma a ponte e siga os caças que utilizam manobras evasivas evitando disparos diretos. Quase toda tripulação do cruzador segue para os hangares e partem em seus caças direto para confronto, entre eles, a Comandante Diana e o Capitão Adani.
- Mantenham os autônomos protegendo os motores! Vamos abrir uma passagem para o cruzador! Acelere no máximo e nos siga! – ordena a comandante.
     Uma seqüência interminável de disparos, explosões e fragmentos se misturam. As grandes naves inimigas iniciam disparos de longo alcance e o cruzador lança contramedidas. A comandante e o capitão lideram com sucesso a destruição dos caças inimigos e ordena para que o cruzador inicie o salto na hipervelocidade.
     O imediato reporta problemas:
- Temos apenas 70% de escudo senhora! O cruzador poderá desintegrar no salto!
- Não terão outra oportunidade! Ative agora e saiam daqui! É uma ordem! Encaminhe os autônomos restantes para nos dar cobertura!
     O cruzador carrega os motores subluz e desaparece na hipervelocidade.
- Já foram! Conseguiram! – diz o capitão, eufórico.
- Eu disse que não perderia outro cruzador! – diz a comandante, que é perseguida por um grupo de caças inimigos que são destruídos por autônomos.
     Os caças e autônomos do cruzador diminuem a velocidade e se reúnem em torno da comandante. Eles percebem que as naves maiores se aproximam e que um novo cerco está se formando. Não há como escapar, mas pelo menos o cruzador foi salvo com a preciosa carga.
- Bem! Foi uma honra lutar com a senhora comandante!
- Só me fale quando acabar capitão!
- Seria uma boa hora de fazer outra promessa e nos tirar dessa! – diz o capitão.
- Diante das circunstâncias capitão, estou disposta a aceitar opções.
- Infelizmente, só nos resta lutar com honra até a morte! – disse o capitão resignado.
     A comandante ordena que os caças fiquem alinhados, aguardando o ataque inimigo. Ao se aproximarem, as naves alienígenas param e as de ataque reduzem a velocidade.

- É impressão minha ou eles desistiram de nos atacar? – diz o Capitão Adani.
- Não aposto nisso!
- Esperam uma rendição? – insiste o capitão.
-Fico impressionada capitão quando você atribui valores humarantes no comportamento dessas criaturas!
- Com todo respeito comandante, penso que uma vez capturado, posso compreender um pouco soube eles.
- Quem sabe eles pensem o mesmo em relação a você e estejam curiosos como deve ser seu corpo por dentro ou que sabor tem! Prefiro uma honrosa batalha! Não se engane capitão! Essa seria a única forma de nos igualarmos! Mas retardar um ataque, concordo que não esperava por isso!
     O monitor do caça da comandante emite um sinal indicando uma grande massa de energia.
- Capitão! A resposta para as suas perguntas encontra-se bem atrás de nós!
- Estou captando em meus sensores! Pelos deuses! É a lendária Lua Negra!
     A astronave se aproxima lentamente e inicia um contato.
- Navan! Povo humarante!
- Navan! Sou a Comandante Diana do Cruzador Marte!
- Sou Truskas Zim da Galáxia de Rhisvi!
- Sejam bem-vindos à Áxis! Poderia nos ajudar? Estamos com sérios problemas aqui!
- Será um prazer comandante! Mas eles é que estão com problemas agora! Aguardem instruções para resgate! Poupe os seus soldados e deixe o inimigo com a gente!
- São todos seus senhor!
     A Lua Negra estaciona e lança um facho de luz de cor lilás sobre os caças humarantes atraindo-os para o seu interior.
     As naves e caças alienígenas não se intimidam com a Lua Negra e a aceleram para atacar. A comandante, o capitão e os demais pilotos ficam impressionados com a grande quantidade de esferas de combate que partem da Lua Negra, passando por eles em alta velocidade.
- Acho que agora vamos equilibrar as coisas! – diz o capitão.
- Disso eu não duvido! – responde a comandante, aliviada.
     As incríveis manobras das esferas e precisões dos disparos destroem todos os caças inimigos mais próximos. Os demais fogem retornando para as naves mães. O resgate dos soldados humarantes foi concluído e a Lua Negra acelera sua rotação gerando um brilhante campo de energia que alcança as naves mães inimigas fazendo-as explodir.
     No interior da Lua Negra, Truskas Zim e Gruner Ar recepcionam a Comandante Diana e seus pilotos.
     A aproximação e altura do Truskas Zim causam um pouco de ansiedade e suspense entre os pilotos humarantes, pois eles nunca haviam se deparado com um lendário deluviano antes.
- Estamos felizes de chegarmos a tempo! – fala Truskas Zim – Este é o nosso líder, Gruner Ar, regente de Tryari.
- Majestade! Quero agradecer a sua intervenção em nome da Federação Áxis       
     O Capitão Adani procurava alguma expressão no rosto do deluviano que confirmasse a sua afirmação de que estava feliz com alguma coisa.
- Somos mais que aliados, comandante – diz Gruner – o povo de Rhisvis  e Áxis são irmãos, e em nome dessa irmandade que aqui estamos.
     A comandante discretamente chama atenção do capitão que parece hipnotizado, olhando para o deluviano a sua frente.
- Este é o Capitão Adani, majestade. Foi um dos primeiros a enfrentar os inimigos na Estação de Fronteira Norte.
- É uma honra conhecê-lo majestade. Tenho ouvido muitas histórias a respeito da Galáxia de Rhisvis, da generosidade do seu líder e coragem do seu povo.
- Seu povo muito nos inspirou capitão. Agora meus irmãos, precisamos saber o que está acontecendo em nossas galáxias.
     O capitão e a comandante relatam os fatos que são dos seus conhecimentos desde o ataque na Estação Norte. Gruner relata que foi atacado em Tryari, e que aturianos disfarçados de gruns chegaram em uma desconhecida nave alienígena.
     Truskas Zim também relata os fatos:
- Fizemos várias tentativas de contatos com a federação e não obtivemos respostas, foi então que percebemos que existia uma anormalidade. Esperávamos que a federação nos ajudasse a identificar a origem dessa nave.
- Essa nave alienígena, onde foi encontrada? – pergunta o Capitão Adani.
- Curiosamente, foi encontrada nos limites de Áxis, próximo ao Planeta Gir.
- É para onde estávamos indo quando detectamos atividade hostil nesse quadrante – diz Gruner – Foi então que observamos que vocês estavam com problemas.
- Então vocês resolveram investigar de perto essa região, apenas motivados por uma nave alienígena desconhecida? – pergunta a comandante.
- Na verdade, havíamos comunicado a federação dessa ocorrência. O nosso mundo está sendo ameaçado e não temos recursos suficientes para combater um inimigo que parece está cada vez mais fortalecido e numeroso.
- Somos gratos por não esperar os contatos da federação majestade. Sabemos que numa situação semelhante faríamos o mesmo.
- Acredito nisso comandante. Mas respondendo a sua pergunta, o motivo da nossa vinda para cá foi ordenado diretamente pela Deusa Lilith. Precisamos ir ao Planeta Gir e encontrar a filha dos deuses, minha irmã.
     A comandante e o capitão se entreolham surpresos.
     Posso entender perfeitamente o que vocês estão pensando e sentindo nesse momento. Eu mesmo não sabia que tinha uma irmã, mas sempre soube que sou parte humarante.
- Gir? – O capitão se entusiasma e olha para a comandante que percebe imediatamente as suas intenções.
- Precisamos comunicar a federação – disse a comandante.
     Truskas Zim responde:
- Seria uma das razões urgentes das nossas comunicações. Se não fosse a Lua Negra não teríamos chegado a tempo para ajudá-los naquela batalha e também na poderíamos ter a proteção suficiente para cumprir uma ordem da deusa. Em todo caso, teríamos depois que nos reportar ao conselho em Urbo, ou tentar descobrir o que houve com as suas comunicações.
     A comandante se aproxima do regente:
- Temos problemas em Gir, majestade. Perdemos contato com uma equipe militar que escoltava civis numa exploração de conhecimento, não sabemos se estão vivos.
- Estamos a sua disposição comandante, podemos ajudar – informa Truskas Zim.
- Somos gratos! Mas a missão de vocês precisa ser concluída. Não temos o direito de interferir.
- Esta guerra também é nossa, comandante – disse Gruner – temos interesses comuns e não podemos deixar que as dificuldades de comunicação entre nossos mundos se transformem em vantagens para o inimigo.
- Concordo majestade. Mas não temos informações gerais de tudo o que acontece, o Cruzador Sankta Spirito é o único que faz as transmissões seguras.
- O que não impede de compartilharmos as nossas informações aqui, tentar entender esse mosaico de acontecimentos e planejar corretamente as nossas ações.
- Tem a nossa inteira colaboração majestade.
- Muito bom. Então podemos começar a ter algumas respostas, como por exemplo, o que fazia corpos alienígenas em câmaras de congelamento em seu cruzador?
     A comandante olha para o capitão e sua expressão fica muito séria:
- Como sabe disso majestade? Não que isso seja um segredo entre nós, é que era a nossa missão conduzir estes corpos para o Planeta Oceano.
     Truskas Zim comenta o fato:
- Nunca tínhamos vistos seres assim até a extensão do universo que conhecemos
- São seres estranhos e desconhecidos para nós também – disse o capitão.
- Então, o cruzador não conseguiu chegar em Oceano – lamenta a comandante.
- Ainda não – disse Gruner – Interceptamos o seu cruzador no espaço subluz com sérios problemas estruturais. Não ficaria na hipervelocidade por muito tempo e seriam presas fáceis.
     Gruner olha para Truskas Zim e este aciona um dispositivo em seu pulso fazendo abrir uma grande escotilha, onde todos observam a certa distância, o Cruzador Marte em suspensão no ar.
     Centenas de pequenas máquinas voadoras lançam raios no casco da nave concluindo reparos.
- Sua nave está pronta comandante e sua tripulação foi avaliada e estão todos bem – disse Gruner.
    A comandante abre um sorriso de alívio e por impulso quebra o protocolo e abraça Gruner.
- Desculpe majestade...é que eu estou...
- Feliz – interrompe Gruner, sorrindo – também estamos comandante, e não precisa se desculpar em demonstra seus sentimentos.
- No Planeta Oceano, os nossos cientistas vão tentar descobrir a origem destes seres, suas fraquezas e o que fazem em nossa galáxia – responde a comandante.
- São criaturas frágeis do ponto de vista orgânico, mas extremamente perigosas para nós, com uma capacidade reprodutiva e de adaptação incríveis – relata o capitão. Conseguimos impedir que nos atacassem dentro da nave. Reduzimos a temperatura em níveis abaixo de zero e comprovamos sua vulnerabilidade a ambientes frios. Acredito que devido a essa intolerância a baixas temperaturas retardou a descida destes seres ao Planeta Gir e possivelmente de outros na galáxia. Conferir que a rotação noturna está prestes a ser concluída em Gir e haverá dois dias de luz, aumentando a temperatura. Se houver uma nova investida as coisas ficarão difíceis para os sobreviventes.
     Gruner põe a mão no queixo:
- Isso não é bom, a julgar pelos motivos em que a nossa galáxia está sendo ameaçada. Eles querem os filhos dos deuses e estão determinados em conseguir. Esses seres devem fazer parte de um plano maior a serviço dos aliados de Viga.
     Truskas Zim faz novos relatos:
- Por enquanto podemos nos tranqüilizar em relação aos seres que não gostam de frio. Confirmamos que o entorno do Planeta Gir está livre deles e uma dispersão radioativa está acontecendo.
- Radioativa? – pergunta a comandante.
- Certamente provocado por uma forte explosão nuclear o algo do gênero – responde o deluviano.
     Enquanto isso, na Galáxia de Rhisvi, dezenas de naves mães se aproximam da órbita do Planeta Tryari com a missão de executar as ordens de Sparis Orie.
     O conselho é avisado e imediatamente segue as orientações de Gruner Ar.
- Eles chegaram conforme havíamos suspeitados – disse Giambo Zoolie ao conselho.
- Já temos um sinal de comunicação! – disse Wustah Drac que liga a tela holográfica.
     Uma imagem de um comandante aturiano se forma, e com ele, uma ameaça de morte.
- Tryarianos! Temos ordens para destruir todas as raças desta galáxia se nossas exigências não forem cumpridas! Entreguem seu líder! O regente Gruner Ar! Imediatamente!
     Giambo Zoolie se aproxima da imagem.
- Saudações! Sou tutor e assessor do regente. O meu senhor está doente e acreditamos que não viverá muito, creio que seria de pouca utilidade para os seus propósitos!
- Isso somos nós que decidimos! Temos recursos para curar várias doenças e faremos isso com seu líder se for necessário!
- Estamos com o nosso conselho reunido comandante, e o nosso monarca não está em condições de decidir os nossos destinos, peço-lhes um pouco mais de tempo para comunicarmos ao nosso povo.
- Eu disse imediatamente! – grita o comandante aturiano.
- Senhor comandante, nosso monarca é muito amado pelo seu povo e em outros mundos em Rhisvi! Mesmo com suas grandes quantidades de naves, um povo enfurecido poderá agravar a situação e preferir lutar e muitas mortes e destruições de ambos os lados poderão ser evitados! Acredite nas palavras desse velho e humilde servo!
- Daremos uma rotação de tempo do seu planeta para que entreguem seu líder! Enviaremos uma de nossas naves para apanhá-lo! Não aceito recusas!
- Cumpriremos o prazo senhor! – disse Giambo Zoolie.
     A imagem se desfaz. O conselho se entreolha.
- Perfeito! Ganhamos tempo – diz Wustah Drac – Agora só precisamos ensinar aquela coisa a dizer adeus para o povo!
- Não será difícil – completa Giambo Zoolie – Já completei a hipnose na criatura e tudo saíra como planejado.
- Acredito que o verdadeiro Gruner Ar seria mais convincente em fazer o povo aceitar de que está se entregando para protegê-los – disse Wustah Drac – A coragem e inteligência do nosso monarca é conhecida em toda galáxia, uma demonstração de fraqueza no mínimo suspeita.
- Vamos ter que arriscar! – diz Giambo Zoolie.
- O nosso planeta está cercado por dezenas de naves fortemente armadas e com um poder de destruição avassalador, mas nós também possuímos nossas defesas eficientes – insiste Wustah Drac.
- No momento certo poderemos usar toda força que possuímos. Mas o monarca preferiu usar outras armas, e ele confiou em nós para executar seus planos! Não podemos falhar!
     Giambo e Wustah seguem para o laboratório e providenciam todos os preparativos para que o aturiano fale ao povo com as palavras que foi condicionado.
     Um comunicado foi feito, e toda a população de Tryari começa a se reunir no largo do palácio, ansiosos e curiosos aguardando a aparição do seu líder. A notícia que o planeta está cercado pelo ameaçador inimigo causa os mais variados sentimentos, mas o de lutar é a maior motivação.
     Gritos de ordem são escutados em vários lugares “Morte ao inimigo...Morte ao inimigo!”. Visitantes de outros mundos de Rhisvi são impedidos de embarcarem para retornarem aos seus lares, os espaço portos estão bloqueados pela guarda. Nenhuma nave entra ou sai do planeta.
     O falso monarca se aproxima da sacada, o povo ovaciona seu líder. Giambo Zoolie levanta os braços pedindo silêncio e a população corresponde.
- Povo de Tryari! Irmãos de Rhivis! Um inimigo poderoso nos ameaça e tudo aquilo que amamos está prestes a acabar – diz o falso monarca – Mas eles não querem vocês! Querem a mim!
     O povo se exalta irritado, Giambo Zoolie intervém pedido ordem.
- Eles terão a mim, mas não terão a liberdade do nosso povo. Aceitem pacificamente a minha decisão e retornem em segurança para as suas casas! Continuem construindo a paz e todos os valores que a nossa sociedade protege!
     O povo continua em silêncio. Uma nave inimiga atravessa as nuvens e pousa próxima a sacada do castelo. O falso monarca caminha em direção a ela, e sem olhar para trás é recolhido pelos aturianos.
     Um sentimento de profunda tristeza é compartilhado, até o próprio conselho que sabe da farsa se emociona com a cena.
- Fez um bom trabalho Giambo – elogia Wustah Drac.
- Os aturianos não só copiam bem as formas que se apossam, copiam bem as frases. A hipnose foi apenas para por sentimento nas palavras, habilidade que eles não tem.
     Um soldado se aproxima do conselho e informa que as naves inimigas partiram de Rhivis. Giambo Zoolie olha pensativo para o povo que se dispersa.
- O que faremos agora? – pergunta Wustah Drac.
- Esperar o retorno do regente, até o momento, estamos seguros. Vamos reforçar todas as nossas defesas e pedir ajuda aos mundos aliados de Rhivis. Algo me diz que não termina por aqui.
     O Cruzador Sankta Spirito 2 chega à orbita do Planeta Gir. A sua presença não pode ser identificada aos olhos físicos ou por equipamentos convencionais, pois se encontra numa frequência dimensional. Não obstante, pode ser detectada por outros que possuam condição similar.
     Do Ponto Lumo, a consciência do Comandante Akash é transferida para a nave desmembrada. Ele observa que a radiação na exosfera do planeta havia dissipado e que também não existia ameaça de anfibinóides.
     O comandante se concentra nas possíveis regiões do planeta, na intenção de localizar sinais mentais dos sobreviventes humarantes. Ele pensa em Mei e vislumbra o local exato onde ela se encontra. Mas se detém um pouco, ao descobrir que não estão sozinhos no planeta.
     No acampamento, um espectro do comandante flutua próximo ao solo, passando pelos soldados que matem atenta vigilância, mas não conseguem sentir nem ver a sua presença na noite fria e pouco iluminada.  Atravessando a barraca onde Mei e Aveline se encontram em sono profundo, o comandante se aproxima de Mei.
- Encontrei você, minha menina. Mei sou eu, Akash! Acorde!
     Os sussurros na mente de Mei a faz despertar, ainda adormecida e confusa. Ela abre os olhos e reconhece o comandante que está envolvido numa aura brilhante, num corpo transparente.
- Comandante! É o senhor mesmo?
- Sim, Mei. Não é um sonho, é um dos incríveis recursos do Sankta Spirito que eu mesmo desconhecia. Preciso que me escute com atenção, seu pais estão muito preocupados com a sua ausência e não podem vir aqui para resgatá-la, a nossa galáxia está sendo atacada por seres desconhecidos. Já houve muitas mortes e não sabemos ao certo com que estamos lidando.

- Não vamos sair daqui? – disse Mei, falando em voz baixa para não acordar Aveline.
- Claro que sim, minha menina. Mas a sua vida e dos seus amigos correm perigo fora daqui. Vocês precisam se esconder nas montanhas e não chamar atenção.
- Por que não somos transportados agora para o Sankta Spirito? Lá estaremos seguros.
- O cruzador físico encontra-se anos luz daqui, no quadrante próximo a Coroni, sou neste momento apenas uma projeção astral. Estamos seguindo para resgatá-los, mas vocês precisam se proteger e lutar para se manterem vivos. Quero que sigam para as montanhas.
- Mas comandante, em que lugar das montanhas poderemos nos esconder? Esse planeta é desconhecido para nós.
- Ao rastrear a geografia do planeta, encontrei uma câmara em uma das cavernas. Também identifiquei vestígios de um sinal ou transmissão dimensional, um antigo código de pedido de socorro direcionado para a Estrela Navan. Na minha condição, posso captar pensamentos e foi isso que aconteceu, existe vida consciente naquela região e não são hostis. Precisam encontrá-los! Eles podem ajudar em protegê-los enquanto não chegamos.
- Uma transmissão para a Esfera Navan? Pensei que fosse uma lenda humarante.
- Algumas lendas são baseadas em verdades minha menina, é uma longa história.
- Estes seres conscientes, como eles são?
- Não me detive a conhecer a sua natureza física e sim, mental – disse o comandante, que aproximando a mão da testa de Mei, lança uma projeção em seu cérebro de um mapa a ser seguido. Mei se assusta com a experiência, fazendo Aveline se movimentar em sua cama que fica próximo.
- É estranho, mas agora sei como chegar lá.
- Evitem utilizar as naves e comunicadores portáteis, elas são alvos fáceis de localização. Vai ser uma jornada longa, sejam corajosos.
     O sistema de segurança do Sankta Spirito 2 alerta que a projeção astral do cruzador está perto de ser identificado e uma tentativa de rastreamento de localização está em curso.
- Alguém descobriu que estamos aqui! Preciso ir e confundir minha localização. Logo vai amanhecer, preparem-se! Estamos chegando!
     O comandante se despede de Mei e antes de retornar ao cruzador, lança  um pensamento para Aveline.
- Acorde tenente! Estão em perigo!
     Aveline de um sobressalto se levanta segurando uma arma e olha para Mei.
- O que foi isso? Ouvi a voz do Comandante Akash!
     Mei se aproxima de Aveline.
- Não sei explicar ao certo, mas ele esteve aqui e falou comigo. Precisamos acordar os outros, temos que sair daqui urgente!
- Para onde? Mei tem certeza que não foi um sonho?
- Você ouviu a voz não foi?
- Sim mas...
- É possível termos o mesmo sonho? Aveline acredite em mim, precisamos ir para as montanhas, o Sankta Spirito está vindo nos resgatar.
     Mei e Aveline acordam os amigos e explicam o ocorrido ao Comandante Sarte.
     Na Lua Negra, a tripulação de condução identifica a presença do Cruzador Sankta Spirito. Mentalmente, Truskas Zim recebe o comunicado e repassa para Gruner.
- Majestade! Confirmamos a presença de uma projeção astral no quadrante próximo ao Planeta Gir.
- Parece que não somos os únicos interessados nesse pequeno planeta. Alguma comunicação?
- Não temos sinais diretos, está numa freqüência de dispersão. Provavelmente tentando confundir sua localização.
- Por que faria isso? Não somos inimigos! – surpreende-se o Capitão Adani.
- Não é para nós que ele tenta despistar a sua presença. Acredito que ele nem saiba da nossa presença e que nada pode se esconder da Lua Negra, não importa a freqüência dimensional que se encontra.
- Então nossos inimigos possuem essas habilidades? – pergunta a Comandante Diana Mars.
- Não haveria outra razão para o Sankta Spirito fazer essas manobras. Ele induz o erro do predador levando-o para longe do ninho, protegendo-o. Os nossos inimigos estão sendo orientados por poderosos aliados de Viga, o que faz destas habilidades uma rotina simples para eles.
- Eles podem nos ver? Digo, os nossos inimigos podem localizar a Lua Negra? – pergunta o capitão.
    Truskas Zim responde pacientemente:
- Não capitão. Apenas outra esfera, cuja origem seja a mesma. Nem mesmo o Sankta Spirito ou Viga com todo o seu poder consegue nos ver.
- Nesse caso ele precisa de ajuda. Se eu entendi sua explicação, o cruzador está desviando a atenção do inimigo para longe do Planeta Gir!
- É o que parece.
     O Capitão Adani olha fixamente para o deluviano na intenção de que ele entenda as suas razões. Truskas Zim toca suavemente nos ombros do capitão e diz:
- Falarei com o monarca. Seu coração não terá paz se não chegar aquele planeta certo?
- Você entendeu o que eu pensava?
- Claramente.
- É incrível, preciso aprender a fazer isso um dia.
     Truskas Zim gosta do entusiasmo do capitão:
- É muito fácil. Basta você...
     Gruner estava conversando próximo com ao lado da comandante e se aproxima do deluviano.
- Truskas! Quero que atraia o cruzador para cá! Precisamos ajudá-lo em sua tentativa de despistar a sua presença.
     O capitão não pisca os olhos aguardando a revelação do deluviano.
- Basta?....basta?....
- Numa outra oportunidade explicarei com todo o prazer capitão – disse Truskas Zim, que é teletransportado para a ponte da astronave.
     O capitão fica sem saber o que fazer diante daquela rara oportunidade.
- Tudo bem! Numa próxima oportunidade! Quem sabe nas minhas férias!
- Algum problema capitão? Falando sozinho? – pergunta a comandante.
- Está tudo bem comandante! Espero – pensa o capitão.
     As luzes internas da Lua Negra se apagam, e no alto surge a projeção flutuante do Cruzador Sankta Spirito. Belíssimas ondas de nebulosas se expandem em variadas cores.
     Um foco de luz desce ao piso e a imagem do Comandante Akash é projetada. Truskas Zim e Gruner se aproximam:
- Seja bem-vindo à Lua Negra comandante – disse Gruner – Esse é o meu comandante Truskas Zim.
- Navan! Comandante Akash, é um prazer conhecê-lo – Saúda Truskas Zim
     A projeção do comandante abre um sorriso de contentamento e surpresa.
- Obrigado majestade, Navan! Truskas Zim. Faz um bom tempo que não escuto essa saudação. É um raro momento está a bordo desta maravilhosa astronave. A ajuda chegou em boa hora.
- Pelo visto, está se tornando uma agradável rotina, temos humarantes a bordo que concordam comigo.
- É uma honra também, ter a presença do enigmático Cruzador Sankta Spirito entre nós em sua sublime forma astral – comenta Gruner.
- Estávamos tentando interferir nossa localização no Planeta Gir. Acho que conseguimos.
- Sim comandante, suas manobras astrais foram precisas, o inimigo não o localizou ou pelo menos saberá que não está no planeta, mas podem ter intuído sobre o seu destino, antes mesmo de chegar à Gir – comenta Truskas Zim.
- Não duvido disso. Temos cidadãos de Áxis aqui?
     O Capitão Adani e a Comandante Diana se aproximam.
- Um dos melhores, senhor.
- Sem dúvida – responde o Comandante Akash, inclinando a cabeça respeitosamente.
- Comandante Akash! O senhor esteve no Planeta Gir? Nossos irmãos estão vivos?
- É bom revê-lo também capitão! Sim estão vivos, no entanto correm sérios perigos. Eu tinha a localização do Cruzador Marte e havia perdido o sinal, iria pedir reforços para proteção dos nossos amigos até a chegada do Sankta Spirito.
- Qual a sua localização senhor? – pergunta a Comandante Diana.
- Estamos seguindo para interceptar em poucas horas um cruzador da federação. Saíram de Urbo trazendo um grupo de médicos que foram de alguma forma infectados pelos aliados de Viga. Eles foram responsáveis por afastar observadores das estações e assim facilitar a não identificação do fenômeno de miragens. Tentaremos descobrir com os recursos do Sankta Spirito alguma informação que nos possa ser útil.
- Fomos interceptados pelos anfibinóides senhor. Vencemos a primeira batalha, mas logo em seguida uma grande quantidade de naves inimigas nos atacaram. Estaríamos na luz se não fosse a intervenção da Lua Negra. O Cruzador Marte foi resgatado e revitalizado, estamos prontos para seguir com a nossa missão de levar corpos inimigos capturados em Ruĝo para Oceano.
     O capitão olha para a comandante.
- Senhora. Não podemos abandoná-los a própria sorte. O planeta oferece poucas condições de sobrevivência!
- Sei disso capitão. Agora tenho fortes razões para acreditar que a filha dos deuses que sua majestade procura esteja realmente em Gir. A determinação dos alienígenas em descer ao planeta seria injustificável se fosse motivado apenas para atacar uma pequena equipe humarante de exploradores. Se eles conseguiram resistir até agora, acredito que possam esperar o resgate do Sankta Spirito.
     O Comandante Akash tenta tranquilizar o capitão:
- Usaremos toda velocidade possível, mas sozinhos, sem uma força militar de apoio, cada segundo é imprevisível para eles. Tenho ordens imediatas do General Meadhas no que se refere à proteção de Mei e os que acompanham.
     Gruner adianta os passos.
- Mei? O que ela tem de tão especial?
- Além de ser a filha do General Meadhas, é uma jovem muito querida em toda a federação – explica o capitão.
     O comandante Akash continua:
- Existe algo maior que envolve a vida de Mei e que está relacionado os recentes eventos em Áxis.
- Não entendo comandante – disse o capitão.
     Gruner que estava apenas escutando a conversa pede para o Comandante Akash gerar uma imagem holográfica de Mei.
- É ela! Minha irmã! – diz Gruner.
- O senhor a conhece majestade? – pergunta a Comandante Diana.
- Não pessoalmente. É uma longa história, mas agora tenho a confirmação de que estou no caminho certo para encontrá-la.
     Nesse momento, Truskas Zim se materializa entre eles.
- Majestade! Detectamos grande movimentação de naves mães inimigas.
- Em que lugar?
- Várias janelas de saídas de hipervelocidade nos Planetas Oceano e Coroni, com agravantes de grande poder bélico em maior número em Urbo. Estão fechando um cerco de invasões sincronizadas! Um grupo de naves aturianas estão em rota para Gir.
- Tinha razão Comandante Truskas! O inimigo usou de intuição – disse o Comandante Akash com tristeza.
- Comandante Akash! O que houve? – pergunta o Capitão Adani.
- O Cruzador Haerentia que transportava os médicos para o Sankta Spirito foi destruído! Estão seguindo em direção a nós! Preciso retornar!
     O Capitão Adani se volta para Gruner:
- Majestade! Libere o Cruzador Marte! Seguiremos para Gir e protegeremos nossos irmãos.
     Truskas Zim não concorda:
- Majestade, está sob a nossa proteção, não podemos arriscar a sua vida!
     Gruner já se decidiu:
- Preciso encontrar Mei!  A Lua Negra seguirá para ajudar a federação e proteger Urbo. Seguirei com cruzador para Gir.
- Como queira, meu senhor – responde o deluviano.
     A Comandante Diana se concentra em sua missão:
- E os corpos do anfibinóides? É importante entregá-los em Oceano.
- Truskas, qual a capacidade de velocidade de Lua Negra? – pergunta Gruner.
- Viajamos na velocidade do pensamento em corredores dimensionais, mas sempre encontramos alguma resistência no ambiente de matéria escura. Mesmo assim, podemos atravessar toda a galáxia em reduzido tempo. O que está pensando? Senhor.
- Projete uma simulação de tempo. Haveria possibilidade de entregarmos os corpos no Planeta Oceano e seguir para Urbo a tempo de intimidar o ataque?
     Truskas Zim recebe mentalmente de outros deluvianos, os cálculos para atender a pergunta do regente:
- Chegaríamos a tempo no Planeta Oceano, entregaríamos os corpos. Mas, chegaríamos um pouco atrasados em Urbo.
- Comandante Akash! O Sankta Spirito poderá seguir direto para Gir?
- Sim, majestade. É exatamente isso que pretendo fazer. Precisamos de mais tempo para chegar a Gir e o Cruzador Marte é a nossa única esperança de proteção aos nossos irmãos.
- O cruzador chegará um pouco antes dos inimigos – conclui Truskas Zim.
- Está feito! Manteremos contato – disse Gruner.
     A imagem do Comandante Akash se desfaz e a projeção do Sankta Spirito 2 segue para encontrar a Arca-lua. Mentalmente, sem os que demais percebessem, Gruner enviou uma mensagem com instruções ao Comandante Akash para contatar Suna Levigo. Ela deveria revelar a Solaris Meadhas sobre a sua natureza divina e a relação com os demais semideuses, fruto dos interesses dos inimigos.
     Os corpos dos anfibinóides são teletransportados do Cruzador Marte, reaparecendo em instalações de quarentena na Lua Negra. Truskas Zim se aproxima da Comandante Diana, do Capitão Adani e de Gruner.
- Esse é Rakrat, seguirá com vocês.
- Bem, será um prazer tê-lo conosco.
     O Capitão Adani faz um comentário:
- Sem querer ofender, mas ele é um pouco grande para os nossos compartimentos, sentirá desconfortável.
- Não se preocupe, vão gostar das melhorias que fizemos no cruzador – disse Truskas Zim, numa expressão facial que poderia se acreditar o início de um pequeno sorriso.
     A comandante fica curiosa:
- Melhorias? Que tipo de melhorias....poderia...
     E antes dela concluir a frase, os quatros são teletransportados para o cruzador que já se encontra em órbita da Lua Negra.
     No interior da nave, na ponte de comando, a oficial Diana e o capitão são aplaudidos pela tripulação. Gruner é cumprimentado pelos demais.
- Estamos de volta! – disse o capitão
- Onde está...o deluviano Rakrat? – pergunta a comandante.
     A voz grave do deluviano é ouvida no ambiente. A tripulação da ponte de comando, sem entender, olha para cima e para os lados procurando a origem do som.
- Estou pronto comandante – responde Rakrat.
- Onde está?
- Estou na cobertura da nave.
     A comandante ordena projetar imagens do exterior da nave e todos ficam surpresos ao verem um novo compartimento, acoplado sobre ela.
- O que eles fizeram em minha nave?
- Cortesia da Lua Negra – responde Gruner, com satisfação.
- Senhora. Para onde vamos? Comandante – pergunta o oficial de navegação.
- Coordenadas para o Planeta Gir! Velocidade máxima!  Missão de resgate e preparar para combate!
     O Cruzador Marte inicia a aceleração para entrar na hipervelocidade e os motores subluz se iluminam cem vezes mais que o normal. Uma inércia de deslocamento em sentida pela tripulação. O oficial de navegação olha atônito para o mapa estelar no painel.
- Oficial! O que houve?
- Não sei explicar comandante! Não manipulamos os controles! Dobramos em potência de aceleração, estamos há milhares de distâncias do ponto de partida e com contagem regressiva de poucos segundos para uma hipervelocidade extrema! Não sei se a estrutura da nave vai suportar!
     Um escudo de luz envolve o cruzador.
- Rakrat! O que você fez?
- Seguindo suas ordens senhora – responde calmamente o deluviano.
     A comandante olha animada para o capitão e esse sacode os ombros arriscando uma teoria e sorrindo:
- Parece que eles fizeram melhorias, é melhor se segurar!
     O Cruzador Marte desaparece num estrondo de luz em forma de halo.
     Na Arca-lua, o General Anor Meadhas recebe o aviso de que o Cruzador Haerentia foi destruído e interceptado num cerco de numerosas naves mãe inimigas que acabavam de sair da hipervelocidade.
- Quero identificação das naves! – ordena o general.

- Não é possível, senhor! São completamente desconhecidas da federação! Estão seguindo para Urbo e Oceano.
- Contate o Conselheiro Nuada!
- Sim senhor.
     Em seus aposentos, a Embaixadora Suna Levigo desperta horas depois de ser retirada da câmara de revitalização. Ao seu lado, encontra-se Solaris Meadhas.
     A embaixadora abre um sorriso ao ver a amiga:
- Como vai?
- Solaris, que bom que esteja aqui. Estou melhor agora.
- Sinto pelo ocorrido, estou aqui para ajudá-la.
- É tudo que desejo que faça minha amiga, mas não é por mim e pela minha perda.
- Não entendo o quer dizer – Solaris segura a mão da amiga.
- Não temos muito tempo, a galáxia está sendo atacada por seres poderosos que se aliaram aos antigos. Enquanto estava na câmara, tive um encontro astral com o Comandante Akash. Mei está viva.
     Solaris põem as duas mãos no coração.
- Pelos deuses! Onde ela está?
- No Planeta Gir, fica nos limites de Áxis, está acompanhada de seus amigos. Solaris, o que vou lhe dizer é muito importante. Eles estão correndo perigo e o Sankta Spirito está seguindo para ajudá-los. Um cruzador de Rugo está a caminho para protegê-los com o regente de Tryari a bordo.
- Gruner Ar? O que ele faz em Áxis?
- A Galáxia de Rhivis também foi ameaçada e ele foi conduzido pela Lua Negra para encontrar Mei. Eles são irmãos, semideuses filhos de Navan, Luna e Lilith.
     Solaris escuta com atenção. Não teria como duvidar de uma das conselheiras humarantes mais respeitadas da federação. A sua voz tranqüila e o seu olhar sincero e acolhedor, demonstra naturalmente toda a verdade que possa ser transmitida.
- Por alguma razão, Viga deseja chamar a atenção dos deuses raptando seus filhos.
- Até então achava que tudo não passava de lendas – disse Solaris.
     A embaixadora se aproxima:
- De fato, nossa cultura não poderia deixar que tão importantes eventos da nossa história fossem resumidos a simples e bonitas lendas, mas tudo isso tem um propósito.
- Que propósito seria tão relevante?
- Proteger os filhos dos deuses, para garantir harmonia, prosperidade e felicidade aos povos de Áxis.
- Por que me revela isso agora? Você disse que o regente de Tryari é irmão de Mei? Que são semideuses?
- Solaris, quantos filhos de Áxis desconhecem a sua origem? Todos nós sabemos quem são nossos pais, mas houve algumas exceções. Você e Mei são uma delas.
- Conheço meus pais e em relação a Mei, foi adotada.
- Assim como você, minha amiga. As condições que Mei foi entregue ao Sankta Spirito foram iguais as suas. Mei é sua filha e você é mãe dela, não há dúvidas nesse poderoso sentimento que as uni. O quero dizer é que vocês foram concebidas em situações especiais e raras.
- Conte-me tudo, por favor! Preciso entender o que se passa.
- Não há tempo para tanto, mas seu amor por Mei fará abrir a sua mente para o que tenho a revelar. No seu tempo e nas condições ideais, você saberá de tudo o que precisa.
     A Embaixadora Suna Levigo se levanta e segurando nas mãos de Solaris se teletransportam para um local escuro da Arca-lua.
- Onde estamos? – pergunta Solaris, um pouco assustada.
- Num local sagrado e secreto. Fique tranqüila, não há o que temer.
- Só a verdade – responde Solaris.
     Uma voz masculina e não reconhecida por Solaris é ouvida:
- A mesma verdade que liberta e que nos dá força para continuar a nossa jornada
     Um foco de luz cai sobre elas e outro aparece alguns metros. Solaris observa o piso brilhante, sente um reconfortante perfume no ar, apesar da atmosfera um pouco fria.
- Nunca ouvi falar deste lugar – diz Solaris.
- Nem poderia – responde a voz masculina – como bem falou a embaixadora, é sagrado e secreto.
- Quem é você? – pergunta Solaris.
- Meu nome é Khufu, filho de Snefru e de uma antiga mulher de Tero Unua chamada Hetepheres. Sou um semideus como você Solaris, filho de Dracon e Nana.
     A embaixadora sorrir e levemente balança a cabeça afirmando o que aquele estranho homem dizia.
- Por favor, aproximem-se. Não tenha medo Solaris, estamos aqui pelas mesmas razões, encontrar Mei.
     O rosto de Solaris se ilumina de alegria.
- Como posso encontrar minha filha?
- O Comandante Akash está seguindo para o Planeta Gir, minha antiga morada de incontáveis luas, mas até chegar lá, Mei e seus companheiros estão correndo riscos. Uma legião de inimigos se aproxima na tentativa de capturar a filha de Navan e Luna. Temos condições de evitar isso e poupar a Galáxia de Áxis e Rhisvi de serem destruídas. A Lua Negra está vindo nos ajudar, pois a Arca-lua não conseguirá sustentar sozinha a poderosa força bélica dos aliados de Viga. Os filhos dos deuses precisam estar juntos no Planeta Gir.
- Mas como poderemos fazer isso? Você mesmo disse que a Arca-lua e a Lua Negra estão indisponíveis! O Comandante Akash não chegará a tempo com o cruzador mais rápido da federação! O que faremos? – pergunta aflita, Solaris.
- Minha amiga. É comovente a aflição do Comandante Akash, que com toda a sua tristeza de ter possivelmente perdido o seu grande amor, literalmente se desdobra para proteger todos nós, principalmente Mei, mas sempre existe uma alternativa.
- Sim, nós temos essa alternativa – revela Khufu – Precisamos pensar que todos nós, semideuses devemos ficar juntos e desviar a atenção dos inimigos, principalmente de Viga. O Planeta Tryari foi poupado quando entregou seu regente e todas as naves se retiraram pacificamente. Na verdade, o verdadeiro Gruner foi substituído por um aturiano modificado, não há garantias de quanto tempo essa farsa irá se sustentar até eles voltarem para a galáxia vizinha. Gruner está no Cruzador Marte a caminho do Planeta Gir, em breve estará com Mei e os demais.
- Precisamos ir para o Urbo. Existe uma câmara secreta nas montanhas de Sudaj Ventoj (Ventos Súbitos) que está conectada a outra câmara existente no Planeta Gir.
- Uma herança do meu pai – completa Khufu – Nestas câmaras existem pirâmides que permitem viajar entre os mundos habitáveis de Áxis. Mas apenas os deuses e semideuses podem fazê-lo. Poderemos nos deslocar para locais seguros.
- Se Viga quer os filhos dos deuses, não importa o quanto nos transportemos para os mundos – comenta Solaris – a galáxia não estará segura e em algum momento teremos que nos entregar.
- Mas podermos ganhar tempo – insiste Khufu – Preservar a nossa segurança e juntos tentar contatar nossos pais. Eles serão os únicos que podem finalizar essa guerra.
- Anor jamais permitiria que eu ficasse em Urbo.
     A embaixadora tranqüiliza Solaris:
- Já estamos seguindo para resgatar os embaixadores. Deixe que eu me entendo com o general. Explicarei a você todos os detalhes do nosso plano. Descerei com vocês em Urbo, mas retornarei só.
- Como chegaremos à câmara? São muitas montanhas? – pergunta Solaris.
- Khufu conhece bem as passagens nos subterrâneos da embaixada, ninguém notará a presença de vocês. Existe um módulo que servirá de transporte em túneis nas montanhas, a parada final é na câmara.
- Estranho, eu não ouvi falar de você – disse Solaris para Khufu.
- Meus hábitos de vida sempre foram reservados. Utilizando as pirâmides, visitei muitos mundos em Áxis tentando achar o meu pai, mas ainda não o encontrei.
- Possivelmente seja tão bom em se esconder quanto você – disse Solaris com um sorriso amigável.
     Khufu também sorrir, aceitando o bom humor da nova amiga. A embaixadora entrega uma lâmina de cristal a Solaris e Khufu.
- Suas descidas na embaixada não serão autorizadas pelo general. Esses cristais estarão conectados comigo. Assim que eu for transportada, vocês simultaneamente também serão. Haverá alguns segundos de transparência no processo de desmaterialização de vocês, não se preocupem, é normal.
- Nunca reclamo de boas caronas – disse Khufu, ensaiando um bom humor.
- Nos veremos em breve.
     A embaixadora mais uma vez se teletransporta com Solaris para a ponte de comando da Arca-lua.
     No Planeta Oceano, o Embaixador Nuada Nin é avisado da aproximação da Lua Negra. Uma imagem holográfica surgiu na sala de comando da cidade flutuante de Sireno (Sereia).
- Navan! Planeta Oceano – saúda Truskas Zim – Temos uma entrega de corpos anfibinóides. Pedimos permissão para teletransporte.
- Seja bem-vinda, Lua Negra – responde o comando de Sireno – Transporte os corpos precisamente para as coordenadas indicadas.
     O Embaixador Nuada Nin se aproxima da imagem holográfica:
- Navan! Truskas Zim, saudações ao povo deluviano. É bom revê-lo.
     O deluviano responde animado:
- Embaixador Nuada! A honra é toda minha! Achei que estaria em Urbo?
- Precisei retornar para Oceano, haveria de indicar um substituto para as minhas funções, mas devido às atuais circunstâncias terei que adiar meus planos.
- Sendo assim conselheiro, estou feliz com a sua decisão, uma vez que terá mais tempo para visitar os amigos.
- Tinha isso em mente, mas agora estamos impossibilitados. Detectamos problemas com Cruzador Marte, houve preocupação entre nós. Saberia que só uma intervenção da Lua Negra poderia salvá-los, tem meus sinceros agradecimentos.
- Aceitamos seu agradecimento de bom grado embaixador.
     Os corpos dos anfibinóides são tele transportados para uma biosfera de reclusão e quarentena. Ao longe, no espaço, já se observa as primeiras luzes de saída de hipervelocidade de naves mães alienígenas seguindo para atacar o Planeta Oceano.
- Conselheiro, poderíamos ficar aqui e ajudar com esses intrusos!
- Agradecemos velho amigo. Podemos enfrentá-los daqui. Nesse momento, Urbo e a embaixada precisam da sua ajuda.
- Seguiremos imediatamente Conselheiro. Navan!
- Navan!
     A Lua Negra segue para o Planeta Urbo.

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